01/07/2021 19:50

Redação¹

Estamos em dias de muita agitação política na conjuntura brasileira. De um lado a CPI da Covid, que tem se encarregado de colocar os “pingos nos is” sobre a condução das autoridades do governo federal no enfrentamento à pandemia, que já deixou mais de 500 mil mortos. De outro, o presidente Bolsonaro e seus seguidores, que procuram se equilibrar diante das muitas indefinições quanto aos rumos de seu governo e do país, vendo crescer a rejeição nas redes digitais e nas pesquisas de opinião que “medem” a temperatura eleitoral contra o presidente.

Manifestação em 29 de maio, RJ. Foto: Rosilene Miliotti

Entretanto, a novidade parece mesmo ser o retorno da agitação política às ruas. Sim, os atos de rua voltaram — primeiro em 29 de maio, depois em 19 de junho — e passaram a catalisar a presença das esquerdas sociais e de um amplo espectro societário que, apesar de estar ativo no debate político e na militância digital, não estava no contato direto com as ruas e todo seu simbolismo democrático. Aqui, apesar da pandemia, destaca-se a emergência da praça pública e dos atos permanentes, que representam o caráter unitário das agendas que ensejam pelo “Fora Bolsonaro”.

Organizações como a Abong (Associação Brasileira de ONGs) têm refletido sobre essa volta, razão pela qual é parte ativa da Campanha Fora Bolsonaro. Para Mauri Cruz, membro da direção executiva da Abong, a Associação se coloca em favor da necessidade do afastamento do presidente Jair Bolsonaro, não por uma questão de divergência política ou ideológica, mas, pela incompatibilidade que as práticas do presidente têm tido com a democracia.  “É a forma como o presidente desrespeita a democracia, desrespeita a dinâmica democrática, desrespeita as entidades democráticas, desrespeita a sociedade brasileira”.

Resistência e resiliência 

O momento nos revela uma sociedade civil ampliada, na resistência, e atuante pela manutenção dessa unidade política em torno da agenda crítica ao governo Bolsonaro, em favor dos direitos e da vida. Mas nem sempre foi assim. Essa sociedade civil, de caráter popular, humanista e de esquerda tem sofrido muitos reveses nos últimos anos. Primeiro, resistiu ao golpe contra a ex-presidenta Dilma. Golpe que interrompeu um ciclo de acesso a direitos básicos (que apenas dava seus primeiros passos) e instaurou o desmonte em curso sobre esses direitos e nas políticas públicas essenciais à vida. Depois, com a eleição de Bolsonaro, vê-se a instalação de um ciclo autoritário que aprofunda o desmonte. Essa situação convocou as forças políticas e sociais à reação, à manifestação e às ruas.

Nos últimos 20 anos aconteceram mudanças na configuração da sociedade civil no Brasil, tais como a quebra da hegemonia da Igreja Católica no campo religioso, o desmonte da classe operária e o declínio de muitas de suas organizações sindicais, o avanço ideológico do neoliberalismo e a penetração do espírito do capitalismo até mesmo em setores do campo popular e democrático, apesar das resistências em curso nos territórios (muitas lutas não tem sido necessariamente anticapitalistas). Por isso, os atos podem e devem ser traduzidos como uma novidade da conjuntura que parece plantar uma semente importante para os próximos meses.

No Congresso e nas ruas

De acordo com Cruz, o governo federal tem negligenciado o processo da pandemia, afrontado a Ciência, governos estaduais e municipais e o Conselho Nacional de Saúde e, com isso, provocado mortes. Mais de 150 pedidos de impeachment estão na Câmara dos Deputados e Arthur Lira, presidente da Casa, não os encaminha, assim como Rodrigo Maia, seu antecessor.

“O super pedido de impeachment protocolado nesta quarta-feira, reúne todo este conjunto de justificativas legais, medidas de improbidade administrativa e desrespeito às normas constitucionais que afrontam a Constituição”, assinala. “Não é possível seguirmos declarando o Brasil como um país democrático tendo um presidente que desrespeita a democracia. Por isso, ‘Fora Bolsonaro’ é a medida democrática e a medida sanitária que se impõe”.

Segundo estudos do professor Breno Bringel, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e do Núcleo de Estudos de Teoria Social e América Latina (NETSAL), “as jornadas de junho de 2013 representaram, em curto prazo, a emergência de um novo ciclo de protestos, o qual coincidiu, em médio prazo, com o fim de um ciclo político mais amplo: da redemocratização e seus respectivos atores, práticas e imaginários”. A análise nos leva a uma outra reflexão: qual ou que novo ciclo político pode estar emergindo na sociedade brasileira a partir dessa agitação das ruas e da sua agenda de expressivo caráter unitário? O próximo dia 3 de julho pode trazer a resposta.

[1] Setor de comunicação institucional da FASE.