24/01/2006 13:50
Fausto Oliveira
Dois funcionários da Funai foram alvo de coação por parte da Polícia Federal na sexta-feira dia 20 de janeiro, durante a operação de reintegração de posse recheada de outras ilegalidades. Maria de Fátima Oliveira e Ronaldo Batista, chefes de posto de aldeias indígenas no Espírito Santo, foram forçados a acompanhar policiais federais em comboio na manhã de sexta-feira. Foram levados à sede da Aracruz Celulose sem saber para onde iam. Não puderam se comunicar com ninguém e lá, na Aracruz, foram apresentados ao documento que precisavam assinar, tomando ciência da operação. Dali, Fátima e Ronaldo foram levados às aldeias, onde assistiram de perto a ação da PF, que ainda tentou usá-los para chamar os indígenas.
Maria de Fátima relatou o caso de coação que viveu nas mãos da Polícia Federal. Tudo começou na quarta-feira da semana passada. Naquele dia, a delegada Graziela, da PF, ligou para a sede da Funai no Espírito Santo dizendo que queria fazer uma visita. A visita não aconteceu, mas no telefonema a delegada sondou os horários e o endereço de Fátima. Na sexta-feira, ao sair para o trabalho, Fátima notou que um comboio de camburões da PF circulava por seu bairro. “Passaram por mim várias vezes, mas não me conheciam pessoalmente”, disse ela. Foi quando ligaram para ela em seu telefone celular e perguntaram onde ela estava. Ela disse. Neste momento se aproximava Ronaldo Batista, dirigindo um carro da Funai. Fátima, no ponto de ônibus, e Ronaldo, no carro da Funai, foram interceptados pela PF antes das 8h da manhã do dia 20.
“Eles disseram alguma coisa assim como ‘queremos que nos acompanhem’”, disse Fátima, “a forma como ele falou me deixou apreensiva, eles apenas disseram que iríamos à sua base”. Fátima entrou no carro da Funai com Ronaldo Batista, no qual foram escoltados pela PF. “Quando Ronaldo tomou caminho diferente do comboio, um policial gritou pelo rádio para não saíssemos da rota que eles definiram”, relatou. Havia pelo menos um policial no carro da Funai.
A escolta ia longe, saindo de Vitória em direção à estrada. Quando chegou à estrada que vai em direção ao município de Aracruz, mais carros da Polícia Federal se juntaram. O celular de Fátima começou a tocar. “O policial me mandou desligar o telefone celular, que tocava insistentemente. Até aí, eu não sabia o que acontecia. Só tomei conhecimento do que se tratava quando chegamos à sede da Aracruz Celulose”, disse ela.
Lá, ela viu “um ônibus da PF, duas vans Sprinter da PF, vários camburões da PF, uma viatura da PM, carro de bombeiro e mais ou menos 120 policiais. Era um aparato de guerra”. Um delegado apareceu com a liminar para que ela e Ronaldo tomassem ciência. Assinaram. “Eles me disseram ‘estamos indo para lá e a senhora vai também’. Não me deram a opção de não ir”, afirmou Maria de Fátima. Depois de permanecer por pouco tempo na base da PF na sede da Aracruz, Maria de Fátima foi levada para a área das aldeias indígenas numa van Sprinter da Polícia Federal.
Em lá chegando, os policiais ainda lhe pediram que fosse chamar os índios, pois eles confiariam mais nela, como funcionária da Funai, do que neles, policiais. Nessa hora, Maria de Fátima conseguiu se esconder entre os índios, religar o seu telefone celular e então avisar à Funai sobre o que acontecia. Mas já era tarde. “Ouvi batidas de cacetete nos escudos, gritos e correria. Os policiais entraram atirando, ouvi também sons de bomba e vi o helicóptero voando bem baixo”, relatou a servidora da Funai.
Para a deputada federal Iriny Lopes, o caso pode ser classificado como seqüestro. “Ela não era acusada de nada, não se negou a responder nada, então para mim isso caracteriza seqüestro”, disse a parlamentar. A avaliação de Maria de Fátima é de que foi desrespeitada como funcionária pública e como cidadã. “Como servidora do mesmo ministério, tinham que ter mais profissionalismo. Vou ao Ministério Público fazer uma denúncia, porque eles extrapolaram”, afirmou.
Para além da possibilidade de crime de seqüestro, levantada pela deputada, pode ter havido mais crimes. De acordo com o Código Penal, neste caso específico os policiais podem ter incorrido em crime de violência arbitrária (art. 322). O ato dos policiais federais também pode ser enquadrado na lei de abuso de autoridade, a lei nº 4898/65.