12/07/2022 15:31

 

 

 

 

*Ana Vitória Batista

Na última semana, do dia 04 ao dia 08 de julho, cerca de 40 jovens habitantes no PAE Lago Grande encontraram-se na sede da Feagle para debater e aprender sobre o tema Direitos Territoriais.  A atividade, promovida pela FASE Amazônia, foi uma iniciativa do coletivo, “Guardiões do Bem Viver”, composto por jovens que atuam em defesa do território. O objetivo foi oferecer aos jovens recém-integrados ao originalmente chamado “Grupo dos 15” a mesma formação que os primeiros Guardiões receberam quando o coletivo nasceu, para entenderem, principalmente, o que é território e o que é identidade.

A partir desse encontro, a juventude que nele esteve presente passa, oficialmente, a fazer parte do coletivo “Guardiões do Bem Viver”. Estes, que a princípio, eram um grupo de 15 jovens de linha de frente, 5 de cada região do PAE Lago Grande (Arapiuns, Arapixuna e Lago Grande), surgiu logo após a realização da 1ª Romaria do Bem Viver, em 2019. No entanto, devido à grande extensão geográfica do território, houve a necessidade de ampliar o coletivo e os primeiros Guardiões começaram então a mapear uma nova juventude para fortalecer o movimento.

Sobre isso, a Guardiã Thaís Isabelle, que faz parte do grupo desde o seu surgimento, afirma que é de grande importância expandir o coletivo. “A gente tem que dar valor a esses jovens, nós estamos descobrindo que eles têm uma potencialidade muito massa”, definiu ela.

A Guardiã, Thaís Isabelle

Diego do Rosário Silva, um dos novos integrantes do coletivo Guardiões do Bem Viver, também falou sobre a experiência de participar desse encontro junto ao grupo, afirmando a importância do apoio familiar. Ele acredita que a defesa do território é uma questão de grande importância. “A gente é o território, a gente está no território, e se a gente não defender [o território], a gente não está defendendo a gente mesmo”, avalia.

Construção da atividade

A formação em Direitos Territoriais com jovens do PAE Lago Grande já vinha sendo articulada pela FASE, em parceria com a Feagle e com o Sindicatos dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santarém – STTR. O papel dessas entidades nesse processo foi o de assessorar a juventude do PAE, como explica o educador da FASE Amazônia, Yuri Rodrigues. “Esses jovens vieram nos solicitar essa formação porque entendiam que eles queriam ampliar o alcance da juventude do território e e  contavam conosco para assessorar essa formação”, lembra.

De acordo com Yuri, a educação popular considera os saberes prévios do povo e a sua realidade cultural na construção de novos saberes. Ele ainda complementa: “[a educação popular] se apresenta no sentido democrático de troca e compartilhamento de provocações e reflexões que se fazem pra permitir, no caso do PAE Lago Grande, dessa formação, que a juventude crie um senso crítico”. Trata-se, então, de permitir uma nova relação dessas pessoas como esse conhecimento que já faz parte delas.

Educador popular, Aldo Lima.

Aldo Lima, outro educador popular, que é antropólogo, esteve presente na formação, falando sobre território e identidade. Para ele, essa atividade é importante e interessante, pois os jovens do PAE Lago Grande já têm certa compreensão a respeito desse tema e vivenciam isso na prática, mas a articulação dos conceitos ainda gera dificuldades. “O bonito é perceber eles descobrindo ou redescobrindo um processo daquilo que eles são, já, sem antes ter falado sobre isso”, completa.

A importância da formação, segundo os educadores, deve-se ao fato de que as ameaças ao território são muito bem articuladas, e de que os responsáveis por grandes empreendimentos têm a parte conceitual muito clara, a respeito do processo de ocupação e da riqueza existente no PAE. Assim, é importante que os habitantes do território também conheçam, compreendam e articulem bem os conceitos, para que possam fazer o enfrentamento às ameaças, o que, muitas vezes, não é possível apenas a partir da vivência.

Escolha dos temas

Sobre a escolha dos temas, Marlon Rebello, um dos integrantes do coletivo “Guardiões do Bem Viver” explica: “desde o início a gente sentiu a necessidade de trazer quase a mesma temática do primeiro encontro, de 2019”, lembra. Os temas trabalhados foram os seguintes:

Corpo e território – essa temática foi trabalhada com o intuito de auxiliar os participantes a compreender que, em se tratando da percepção do Bem Viver e da luta feita em defesa do território, há forte relação entre suas existências e a natureza. Nessa perspectiva, o corpo é o território: suas relações com os rios, igarapés, o tempo para plantar e colher, extrair o necessário para se alimentar e distribuir entre os seus, a solidariedade, o respeito aos Encantados, que são os seres da floresta e dos rios, as dinâmicas coletivas, tudo está interligado. “A juventude não está no território, eles são o território”

Histórico de ocupação do território: foi retomada a história de resistência do território a partir da Cabanagem, já que a comunidade de Cuipiranga, no PAE Lago Grande, foi uma das principais frentes de resistência da região do Baixo Tapajós. Essa região foi inserida no trajeto da Romaria do Bem Viver e constitui um símbolo de pertencimento para a juventude, embora não conste nos livros didáticos, sendo essa história invisibilizada. Além disso, falou-se sobre o processo de criação do PAE Lago Grande, o que é a FEAGLE, título coletivo e outros assuntos.

 

Protocolo de Consulta: Em razão de o PAE Lago Grande estar em processo de construção do seu Protocolo de Consulta Coletivo, instrumento de grande importância para a defesa territorial, foi realizada uma apresentação sobre o processo de construção de um protocolo, para que a juventude compreenda que o documento não se restringe a um pedaço de papel. Ao contrário, representa a forma como as comunidades se organizam e devem, então, ser consultadas, de forma livre, prévia e bem informada, a respeito de qualquer ação externa ao território. Isso deve considerar as suas identidades, culturas, modos de vida, ancestralidades, regras e o tempo da comunidade.

Expectativas para o futuro

Ao final e após a formação em Direitos Territoriais, espera-se forjar novas lideranças. Segundo Darlon Neres, que assim como Marlon e Thaís, integra o coletivo desde o seu início, o objetivo central de encontros como esse é que os novos Guardiões sejam os próprios defensores e defensoras da comunidade, do território, lá onde eles vivem”.

O Guardião, Marlon Rebelo.

Além disso, é esperado que haja um despertar, na juventude do PAE Lago Grande, a respeito da sua própria identidade e das suas vivências. Sobre isso, Aldo Lima afirma: “se esses jovens saírem daqui, desse momento, com um olhar um pouco mais atento sobre a própria pessoa e sobre o seu próprio território, pronto, isso já é o suficiente”.

 

 

*Ana Vitória Batista é comunicadora popular colaboradora da FASE Amazônia.