30/07/2022 08:43
Por Claudio Nogueira*
Os debates do 10º FOSPA começaram nesta quinta-feira, no campus da UFPA, com uma intensa participação da FASE. A região amazônica foi o centro dos diálogos na parte da manhã. “Que Amazônia queremos?” e “Acordo Mercosul-UE: O que a Amazônia tem a ver com isso?”, foram temas de duas mesas que contaram com representantes e educadores da FASE e organizações parceiras de outros países latino-americanos.
Letícia Tura, diretora-executiva da FASE, mediou o evento que tratou sobre as propostas para região frente às crises climática, econômica e sanitária que vivemos. Segundo ela, é preciso fortalecer a ideia de diversidade amazônica. “Estamos pensando nessa natureza amazônica e nas pessoas que vivem nesses espaços. O contexto do ataque, e por que vivem esse ataque, ou seja, as denúncias, mas também queremos trazer os anúncios. As populações dessas regiões têm muito o que dizer, a gente acredita que essa população tem as suas soluções e apontam para outras possibilidades para a região.”
Henry Cordova, representante da Iniciativa Cambio Climático, do Peru, deu seu testemunho sobre o convívio com os povos tradicionais de seu país, e faz um alerta: “Os povos indígenas do Peru estão denunciando como a atividade de mineração está crescendo de forma descontrolada na região amazônica. Estamos em um processo de resistência indígena, e apoiar esse movimento é uma forma de preservar os imensos aportes que a Amazônia garante à America Latina e ao mundo inteiro”.
Para o também peruano Rómulo Torres, da Iniciativa de Acción de Justicia Fiscal, Economías Transformadoras y Territorio, é preciso entender que os grandes sistemas financeiros avançam de forma planejada e sistemática na região: “Há toda uma pressão para calar vozes, pressão da indústria da carne, da soja, de maneira legal, mas às vezes suspeita”, explica. “Estamos vivendo a volatilidade dos mercados financeiros: nenhuma vaca, nenhuma soja é produzida, mas já está em negociação: é a desmaterialização dos negócio”.
Liliana Buitrago, do Observatório de Ecologia Política/AMA, da Venezuela, reforçou a importância de pensarmos a Amazônia de forma plural, levando em conta as várias necessidades e ambientes políticos de cada país que compõem a região. “[Para] a Amazônia que queremos, que sonhamos… [são necessários] diálogos interculturais. Encontrar pontes”, reflete. Para a venezuelana, a tomada de consciência para resolução das questões comuns deve ser colocada em prática na ordem do dia. “Há uma construção simbólica da Amazônia. Quando pensamos na Amazônia, pensamos nessa construção, mas é preciso deixar de ver apenas o simbólico, e ver também o concreto”
Guilherme Carvalho, coordenador da FASE na Amazônia, defende que é preciso pensar uma alternativa ao modelo de desenvolvimento imposto pelas grandes empresas: “A ideia de desenvolvimento e progresso está vinculada ao crescimento econômico, e isso num capitalismo globalizado significa destruição da floresta. Os recursos naturais são transformados em commodities, negociados na Bolsa de Valores e exportados. Isso justifica a construção de minerodutos, gasodutos, represas, a transformação da nossa região em plataforma mundial de exportação de commodities. Combater essa ideia de desenvolvimento é fundamental se queremos construir uma perspectiva de real para a região”, explica. “Não existe Amazônia. Existem Amazônias, com complexidades e especificidades que exigem políticas públicas que respeitem essas particularidades”.
Acordo UE-Mercosul
Já a atividade da Frente contra o Acordo UE-Mercosul, realizada com apoio do Rebrip e da Rede Jubileu Sul, contou com a participação de organizações e especialistas de vários páises para debater as influências que o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul tem na região amazônica. O objetivo foi aterrissar o debate de comercio internacional na realidade local, levando em conta o impacto do agronegócio e de outros empreendimentos que usam esse modelo de desenvolvimento para usurpar os territórios e como a logica desse acordo de compercio acaba repetindo e fortalecendo esses processos.
Lucia Ortiz, da organização Amigos da Terra, criticou a ação de empresas estrangeiras na Amazônia: “A gente precisa quebrar patentes internacionais, ter vacinas, tecnologias de bem viver e não ficar refém da agenda de multinacionais que devoram toda a natureza”.
Francisco Carvalho, coordenador da Contrab , ressaltou a importância de ouvir os povos originários e as comunidades tradicionais da região amazônica sobre a validade de um acrodo com a UE: “O povo da Amazônia precisa discutir o melhor para a Amazônia. Não podemos aceitar acordos unilaterais, sem sermos consultados”. E acrescentou: “Se nós não lutarmos, nada acontece. Nossa força está na nossa resistência! Temos que demarcar quem nós somos, quem devemos ser, quem nosso filhos serão”. Na mesma linha, Claudiana Souza Lírio, da Associação Quilombola de Santarém, faz um alerta: “Eles dizem que precisam construir para que o progresso venha. E nós? O que vamos beber? O que vamos comer? Não estamos incluídos nesse progresso?
Durante o debate, Maureen Santos, coordenadora do Grupo Nacional de Assessoria da FASE, destacou que “o Acordo Europa Mercosul não gera apenas impacto ambiental, mas também em serviços e políticas públicas”. Ela também ressaltou a importância de envolver quem mora e pensa a Amazônia para pensar e discutir os efeitos do acordo: “Trazer para esse debate representantes e lideranças de organizações da Amazônia é fundamental, pois muitas destas organizações ainda não estavam discutindo esse tema. A Amazônia não pode ser excluída de assunto de seu interesse próprio”.
*Jornalista e coordenador de comunicação da FASE.