11/11/2022 18:04
*Paula Schitine
Começou no último domingo (06) a COP27 Conferência das Partes sobre o Clima, no Egito, com todos os olhares do mundo para as negociações sobre a implementação do Acordo de Paris, que seguem em meio a críticas de atrasos e falta de avanços concretos. Enquanto isso, países caribenhos, insulares e africanos aumentam o tom de denúncia sobre a emergência em que se encontram e a demora em decidir um mecanismo acessível e rápido em termos de financiamento.
A primeira semana teve a presença da diretora executiva da FASE, Letícia Tura e a coordenadora do Grupo Nacional de Assessoria da FASE, Maureen Santos. As duas representantes participaram dos eventos paralelos em pavilhões de debates da sociedade civil.
Um dos temas da COP27 é a agricultura e os meios de produção de alimentos. No dia 09, a diretora executiva da FASE participou do painel “Cooperação Sul-Sul: comunidades negras de produtores agroecológicos nos países do Atlântico” no stand do Food4Climate e levou a experiência da FASE nos territórios e comunidades quilombolas, destacando a importância fundamental desses agricultores e agricultoras na produção de alimentos da agroecologia.
Leticia destacou a importância da agroecologia na sociedade e a diversidade de modos de produção, afirmando que com racismo não há agroecologia. “A gente investe muito na construção de políticas públicas porque nós entendemos a agroecologia como um movimento social para além da técnica e da tecnologia, mas como um projeto de sociedade na construção da soberania e segurança alimentar adequada “.
Falsas Soluções
Um tema recorrente nos pavilhões é a política de NET zero (emissões líquidas zero), que se tornou um grande objetivo na construção de meta de longo prazo dos países e em resultados e planos de sustentabilidade de corporações privadas. Sem debate sobre efetividade, critério, governança ou limite, chegou a receber críticas do Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterrez.
Maureen Santos, durante coletiva de imprensa na COP27 comentou o resultado do relatório produzido pela Global Forest Coalition, o
“Forest Cover 68 report”, que fornece exemplos concretos de falsas soluções à crise climática e de como os projetos e mecanismos resultantes são conectados com as negociações climáticas em curso. Ao mesmo tempo, trouxe proposições de novos caminhos e soluções reais locais.
“Nesse sentido, a gente traz aqui a preocupação de que um possível plano de trabalho de agricultura nas negociações não siga esse mesmo caminho e sim abra espaço para a agroecologia, que permite articular a proteção florestal e da biodiversidade com a garantia do direito a terra e território e a soberania e segurança alimentar”, , afirmou a coordenadora do GNA.
Combate à fome
No painel do Brazil Climate Action Hub, Letícia Tura participou do diálogo sobre Estratégias e Adaptação para a urgente transição dos Sistemas Alimentares. O foco da mesa era dialogar sobre as dimensões da Agricultura no Acordo de Paris: clima, biodiversidade e sistemas alimentares em risco. E ainda os desafios do combate à fome no contexto pós-pandêmico e de crise climática.
Em sua apresentação, a diretora executiva da FASE falou sobre a importância da alimentação como Direito Humano previsto na Constituição brasileira, e como o agronegócio contribui para a fome no país. Ela afirmou também que o tema adaptação é pouco debatido nesses espaços da COP.
“Para a gente falar sobre agricultura talvez seja melhor a gente falar de agriculturas, porque estamos falando de uma diversidade de modos de vida e de práticas agrícolas, e também de adaptações”, lembrou.
“Alimento não é commodity. Nós não estamos aqui falando de comodities, estamos aqui falando de direitos humanos. O Direito Humano à alimentação saudável e adequada está previsto na nossa Constituição Federal, no artigo 6, que fala sobre os direitos básicos de toda população brasileira. Essa foi uma conquista do Instituto CONSEA, em 2012, e que tem uma participação fundamental no Fórum Brasileira de Soberania e Segurança Alimentar”, ressaltou
Agronegócio é destruição
Letícia fez ainda uma dura crítica ao setor do agronegócio e ao seu
modo de produção em cadeia de destruição. “Historicamente no Brasil, mas não só no Brasil, em várias outras partes do mundo, a violência, a fome, a destruição ambiental estão intrinsecamente relacionados à cadeia industrial de commodities agrícolas, de commodities agropecuárias. E por quê? Porque ela está baseada num modelo de concentração fundiária, de concentração de renda, de produtos. É um modelo avesso à diversidade. São cada vez menos produtos, menos pessoas no campo e mais máquinas, e por isso temos tanto desemprego”, analisou ela.
Letícia fez uma consideração importante sobre os dados da fome que atinge 33 milhões de pessoas no Brasil. “Não são quaisquer pessoas. São pessoas negras, periféricas, mulheres. Segundo a Comissão Pastoral da Terra, nós temos um crescimento da violência no campo. Então o desmatamento e a fome caminham juntos com o crescimento da violência no campo”, destaca.
Por fim, a diretora fez uma reflexão sobre o futuro do que queremos para o planeta. “As tecnologias não nos salvarão se a gente não tiver mudanças estruturais, se a gente não mudar o padrão desigual de distribuição de terra, de alimentos, não só no Brasil mas no mundo”, analisa.
*Paula Schitine é jornalista da comunicação da FASE.