Maria Emília L. Pacheco
16/09/2024 15:35
O país está em chamas. É uma situação de extrema gravidade. Já se anuncia Estado de Emergência Climática. O azul do céu deu lugar ao cinza, as fuligens no lugar das chuvas, e há correria para os hospitais e unidades de saúde com o aumento das doenças respiratórias.
São tempos de eventos climáticos extremos: enchentes, incêndios, secas severas e tempestade. Os biomas e seus povos estão sob fortes ameaças com o aprofundamento das crises ambiental, climática e alimentar. Sobre a alimentação embora no atual governo vemos índices menores de insegurança alimentar grave – fome – com a queda percentual significativa de 11,4% [1], ela persiste sobretudo nas regiões norte e nordeste. Mas também a má alimentação segue grande risco com o aumento do consumo dos produtos alimentícios ultraprocessados provocando adoecimentos como a obesidade, diabetes, hipertensão, câncer. E tudo indica que o cenário atual anuncia novas manifestações da fome.
Neste contexto há que afirmar que o agro não é pop e nem tech. É somente negócio. Desmatamento, contaminação ambiental com agrotóxicos no solo, alimentos e águas; apropriação privada de terras públicas, provocação de conflitos socioambientais no total de 2.203, envolvendo 950. 847 pessoas[2] são suas marcas.
A flexibilização de normas fundiárias, ambientais, assim como os subsídios do estado favoreceram sua expansão com a exportação de mercadorias, sobretudo soja e milho para ração de animais. Reduziram-se áreas de produção de alimentos dos hábitos alimentares como arroz, feijão, mandioca. Há também diminuição de nossa biodiversidade nas áreas de manejo e coleta de alimentos nativos das matas, florestas e águas.
Diante desse contexto no período das eleições municipais perguntamos: o que cabe fazer? Esse é um momento de alerta aos cidadãos e cidadãs, pois a orientação das ações do poder local pode dirigir-se a mudanças ou retrocessos. A FASE faz um chamamento para que as candidaturas ao executivo e legislativo pautem sua agenda na defesa dos direitos dos povos indígenas, comunidades quilombolas, povos e comunidades tradicionais, agricultores (as) familiares. A FASE reafirma sua convicção de que esses sujeitos que cultivam valores e práticas da agroecologia estão construindo os caminhos da soberania alimentar, fundamental para enfrentar as crises ambiental, climática, alimentar e garantir a saúde.
Por isso destacamos exemplos de uma agenda propositiva com participação social:[3]
– Direito à terra e ao território – atuação do poder local junto aos órgãos estaduais e federais para a promoção da regularização fundiária com respeito aos direitos coletivos nos assentamentos e apoio ao desenvolvimento de práticas agroecológicas;
–Compras públicas dos alimentos dos povos indígenas, comunidades tradicionais e da agricultura familiar com a efetivação da compra direta para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) com chamadas especiais para povos e comunidades tradicionais e adesão ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Inclusão produtiva com segurança sanitária com o Serviço de Inspeção Sanitária (SIM). Apoio às feiras e equipamentos como restaurante popular e cozinhas comunitárias.
– Programa Municipal da biodiversidade com propostas de viveiros municipais; editais para organizações da sociedade civil assessorarem resgate, conservação, multiplicação e melhoramento participativo de sementes nativas e mudas.
– Apoio à produção e auto-organização das mulheres com ações de fomento para a implantação de quintais produtivos e também com ações de enfretamento da violência contra as mulheres com os canais de denúncia e delegacias especiais para seu atendimento;
– Instrumentos de gestão da cidade com áreas especiais de Segurança Alimentar e Nutricional no Plano Diretor Estratégico e nas Leis de Zoneamento e Uso do solo, assim como Política Municipal de Desenvolvimento da Agricultura Urbana.
[1] Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE. 24,4 milhões de pessoas saem da situação de fome no Brasil em 2023 — Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (www.gov.br)
[2] Conflitos no campo Brasil, 2023, Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno, – Goiânia: CPT Nacional, 2024.
[3] A FASE contribuiu, através de sua participação nos espaços da dinâmica organizativa da Articulação Nacional de Agroecologia )ANA) para a elaboração do conjunto de propostas da Carta Política – Democracia e Agroecologia como princípios para a construção de Políticas de futuro para a garantia de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional nos Municípios Brasileiros. Desafios para as candidaturas nas eleições de 2024. https://agroecologia.org.br/wp-content/uploads/2024/05/Carta-Politica-AnE-2024.pdf
*Assessora do Núcleo de Políticas de Alternativas da FASE