21/05/2012 10:49

Por Paulo Henrique de Oliveira, da FASE-ES

Uma pedalada contra o pré-sal. Em janeiro, uma manifestação incomum se espalhou por solo capixaba: contra os impactos sócio-ambientais gerados pela indústria do petróleo, ciclistas percorreram cerca de 400 quilômetros por vilarejos, comunidades quilombolas e pesqueiras.O objetivo também incluía a elaboração de um mapeamento de impactos e afetados pela cadeia produtiva do petróleo e gás.

Desde o ponto de partida, em Vitória, foi possível observar a forte presença da Petrobras na principal avenida da capital, obscurecendo inclusive a paisagem do Convento da Penha, um símbolo tradicional para a maioria dos capixabas. Na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), dois outros grandes complexos administrativos da petroleira indicam a presença até mesmo em espaços estudantis de pesquisa. Pelas estradas, placas sinalizadoras dos dutos de gás e óleo também escancaram a expansão de outras petroleiras pelo Espírito Santo.

Impactos que geram inúmeros problemas

Em Barra do Riacho, no município de Aracruz, a construção do estaleiro Jurong (EJA), feito com inúmeras irregularidades ambientais, é um dos projetos que mais chama atenção. Essa é mais uma obra dentro dos planos da ONG empresarial Espírito Santo em Ação, através do plano estratégico estadual Espírito Santo 2025. O estaleiro alterará de forma intensa o ecossistema local, marinho e terrestre, aprofundando problemas sociais nas comunidades de Barra do Sahy e Barra do Riacho, já impactadas pelo complexo celulósico ali instalado desde o final da década de 1970. Segundo pescadores locais, a restinga será destruída, a área de desova das tartarugas desaparecerá e o acesso público à praia será banido. A região de Barra do Riacho está cercada de indústrias de porte pesado como a Fibria (antiga Aracruz Celulose), Evonick Degussa, Bragussa e Canexus. Mais recentemente, indústrias ligadas ao setor de gás e petróleo, como a Nutripetro e a Tabr (Terminal Aquaviario de Barra do Riacho), se impuseram no mesmo território. As conseqüências sócio-ambientais tendem a se agravar não apenas para os pescadores e comunidades indígenas, mas também para a população urbana rodeada pelo zoneamento industrial. As problemáticas são intensas: desesperança e aumento de diversas doenças como depressão, câncer por contaminação da água, e problemas respiratórios.

Áreas antes ricas em vida marinha se extinguem rápida e aceleradamente. Mais de 40 espécies de peixes estão desaparecidas ou tornando-se mais raras. Isso porque outras regiões que já estavam degradadas por plataformas de petróleo contribuem também para a redução da biodiversidade marinha. Pescadores identificam longas manchas de óleo e peróxido de hidrogênio, que vão desaguar no mar, através dos rios que servem para descarregar efluentes.

A presença que não se faz presente

Em Regência, no município de Linhares, nos deparamos com uma grande área de extração de petróleo em solo terrestre, feita através de cavalos mecânicos, numa região conhecida como Areal. Também nota-se a presença de uma usina e uma refinaria – em frente à praia de Regência – da Petrobras. Na comunidade campesina de Palhal, a ameaça reside no projeto de implantação do gás químico UNF. Segundo carta pública dos habitantes da comunidade, a fábrica de fertilizantes químicos tenta se instalar a qualquer custo, desconsiderando as 25 famílias que ali habitam. Apenas na fase de construção da planta industrial, quatro mil homens trabalharão no canteiro de obras. Uma obra prevista e financiada no PAC2, da gestão Dilma, orçada em três bilhões e 700 milhões de dólares, que será implantada até 2017.

Atravessamos o Rio Doce com o apoio do barco dos pescadores locais. Chegamos então em Povoação, município sem o aspecto turístico de Regência. Próximo à cidade, usinas e extração de gás e petróleo se impõem à vista, mas – segundo os locais – praticamente não empregam moradores da região. Em Degredo, a mesma realidade: poucos postos de trabalho ocupados por moradores da região; a maioria é funcionário de firmas terceirizadas. Neste lugar, segundo testemunhas locais, “o chão treme; parece até terremoto, mas é o gás, em momentos de pico de pressão”. A atmosfera fica irrespirável para os habitantes mais próximos.

Levantando e “compensando” a poeira

À serviço das petroleiras, a grande circulação de veículos intensifica a poeira nas casas à margem das estradas de terra. Para minimizar o impacto, um caminhão de uma empresa terceirizada joga águas nas ruas. O objetivo: umedecer a terra, e baixar a poeira. Moradores não sabem, no entanto, se as empresas têm o direito de outorga e uso dos recursos hídricos.

Pedalando adiante, em direção a Pontal do Ipiranga, um morador fala sobre um vazamento – ocorrido há alguns meses atrás, em 2011 – de um dos dutos da Petrobras que cortam a região. A mesma situação ocorreu no início de janeiro, porém com um vazamento de óleo em alto mar, próximo à vila de pescadores de Barra Nova – onde também existe uma usina próxima à foz do rio. Identificado por alguns pescadores artesanais que realizavam atividades no mar, o vazamento não foi considerado grave pela empresa poluidora. Estranho, porém, saber que – segundo relatos – trabalhadores e trabalhadoras foram chantageados quando tentaram denunciar o crime ambiental. Na região, a política de compensação social e ambiental se faz presente através de várias formas, como na construção de um centro social comunitário. Em geral, segundo os interlocutores contatados durante o “Pedal contra o Pré-Sal”, as “compensações” nunca compensam – de fato.

No caminho entre os municípios de São Mateus e Linhares, pudemos observar vários pontos de perfuração e exploração de gás e petróleo, escoados – através dos dutos – para várias partes do estado. Conversas com moradores próximos às usinas puderam constatar que a maioria dos habitantes realiza serviços na área de limpeza, segurança e transporte – todos terceirizados, com baixos salários e condições precárias de trabalho.

Nos próximos anos, os impactos decorrentes do setor do petróleo tenderão a se intensificar no Espírito Santo, principalmente na costa litorânea. É preciso outro olhar sobre essa política mundial e regional. Para que e para quem se destina toda essa energia? Por que não se investem em alternativas energéticas pós-petroleiras? Para quem se flexibiliza a legislação ambiental? Quem fica com os custos sociais e ambientais de tudo isso?

“Pedal contra o pré-sal”, pela saúde das pessoas e pela sóciobiodiversidade do planeta!