29/11/2011 11:09

Uma dúvida perpassa a chegada do Brasil às negociações sobre Mudanças Climáticas em Durban: poderá o país manter, às vésperas da Rio+20, seu papel de protagonismo nas negociações sobre mudanças climáticas diante de tantas ambiguidades e contradições no cenário doméstico?

Nos últimos anos, o Brasil investiu em algumas políticas sobre a questão climática por meio da criação da Política Nacional de Mudança do Clima, no fim de 2009, na qual estabeleceu metas de controle de emissões provenientes do desmatamento dos biomas Amazônia e Cerrado, bem como de outros setores não diretamente ligados ao desmatamento. Estas metas favoreceram o país nas negociações internacionais de clima, ao serem apresentadas como metas voluntárias de redução de emissões de gases de efeito estufa. Também criou o Fundo Nacional sobre Mudanças do Clima, visando assegurar recursos para atividades que garantam à mitigação e adaptação à mudança climática, além do Fundo Amazônia já em funcionamento desde 2009.

Em relação às metas, sabe-se hoje que estas são muito menos ousadas que parecem. Além de proporem reduções em relação à expectativa de emissões futuras em um cenário business as usual, o ano de referência para o corte das emissões (2005) foi justamente um dos picos históricos da taxa de desmatamento na Amazônia. Assim, de certa forma, o Brasil prometeu o que já estava cumprindo. Além disso, como são metas de emissões futuras, os cálculos são ainda muito incertos, não é a toa que a margem de erro é de 30% para mais ou para menos. As metas voluntárias acabam, pois, significando muito pouco e invisibilizando o fato de que as emissões brasileiras estão crescendo de forma significativa se comparada com as emissões do país em 1990, ano de referência para os compromissos obrigatórios dos países do Anexo 1, previstos no Protocolo de Kyoto.

A este cenário somamos os avanços dos setores ruralistas que conseguiram aprovar na Câmara dos Deputados as mudanças no Código Florestal e a configuração do texto que segue para o Senado. A mera possibilidade de aprovar a flexibilização no Código foi suficiente para ampliar os níveis de desmatamento. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, entre agosto de 2010 e abril de 2011, nos nove estados da Amazônia Legal a devastação aumentou 27% com relação ao ano anterior. Também o crescimento significativo da participação do setor energético nas emissões brasileiras e a exploração do petróleo da camada Pré-Sal no horizonte podem ser problemáticos no cenário de negociações. Estes dados geram para o discurso brasileiro do direito histórico ao crescimento econômico uma capacidade de sustentação muito mais frágil desta vez.

É certo que o Brasil seguirá a postura assumida em Cancun de tentar garantir a aprovação de um segundo período de compromisso pós Kyoto com estabelecimento de metas quantificadas de redução de emissões por parte dos países do Anexo 1. O segundo período é um dos pontos centrais da pauta de negociação da COP 17. Outra preocupação será retomar entrar em acordo sobre as fontes de financiamento para ações de mitigação, o que incluiu como se dará o financiamento no mecanismo de REDD+, e adaptação.

O perigo é que as contradições brasileiras gerem mudanças em relação às tensões internas no bloco de alianças do Brasil. Em um momento anterior, as posições do Brasil assumidas a nível internacional com respaldo de ações nacionais (como a redução nos índices de desmatamento e o estabelecimento de ações e metas voluntárias) contrastavam com as posições conservadoras de China e Índia. O fato apontava uma tensão permanente para a política de alianças do país nas COPs. Ao mesmo tempo, era essa tensão que emprestava ao Brasil um poder de mediação entre as agendas das potencias emergentes e dos países do Anexo 1.

Está claro que muitos fatores poderão influenciar positiva ou negativamente para avanços em relação a um novo período de Kyoto. A reunião entre os membros do BASIC – grupo informal de negociação composto por Brasil, África do Sul, Índia e China -, em agosto, a fim de discutir posições levadas a Durban, mostraram que, até agora, a posição de liderança do Brasil não foi abalada. No entanto, se as contradições entre o discurso ambientalmente correto e a prática que valoriza um modelo de desenvolvimento destruidor a qualquer custo jogarem contra a balança brasileira nos debates internacionais em Durban, teremos parte da medida em que as mesmas e outras ambiguidades internas poderão influenciar nos resultados possíveis na Rio+20.