11/08/2010 13:46
Milhares de pessoas de vários países da América Latina, centenas de organizações e movimentos sociais estão reunidos no Paraguai, para mais uma edição do Fórum Social das Américas. A capital do país, Assunção, será palco deste importante momento de consolidação das novas forças sociais latino-americanas que lutam e trabalham todos os dias por uma outra América possível. O evento acontecerá entre os dias 11 e 15 de agosto, e a Fase estará presente em mais esta construção coletiva de alternativas para um mundo sustentável e democrático.
O processo histórico aberto com a criação dos Fóruns Sociais Mundiais, há dez anos, se desdobrou em várias vertentes. Hoje, esta história contabiliza fóruns sociais nacionais de diversos países, fóruns temáticos, fóruns de regiões que englobam vários países vizinhos, fóruns continentais. Trata-se de um novo modo da política e uma nova transição social. Acabou o tempo do pensamento único hegemônico neoliberal, derrotado por suas próprias contradições em crises sucessivas do capitalismo financeiro. Agora é a época da multidão de perguntas que estão pelo ar, e da certeza de que uma nova construção social planetária é necessária e urgente.
Não é por outra razão que neste 4º Fórum Social das Américas os eixos temáticos são, como é de hábito, muito diversos. Vejamos: o primeiro eixo é sobre “Alcances e desafios dos processos de mudança no hemisfério”; o segundo trata de “Estratégias de militarização e dominação imperial”; o terceiro discutirá a “Defesa e transformações das condições e modos de vida frente ao capitalismo depredador”; o quarto é sobre “As disputas hegemônicas da comunicação, educação e conhecimento”; o quinto vai ter como pauta os “Povos e nacionalidades indígenas originários e afrodescendentes”. Tudo isso permeado por um eixo transversal de discussões que porá em questão a igualdade de gênero e as diversidades socioculturais.
É matéria para uma obra imensa, um novo mundo possível nas Américas ainda tão injustas e pouco democráticas. Para Maureen Santos, representante da Fase no Fórum Social das Américas, o evento será uma oportunidade para discutir a questão das mudanças cliáticas. Integrantes de redes internacionais como a Climate Justice Now (Justiça Climática Agora), ela prevê a discussão dos conceitos de Justiça Climática e de dívida ecológica, e aponta a questão do financiamento de soluções para o aquecimento global como um tema que ganha importância.
“O financiamento do clima é um tema muito importante que apareceu muito nos acordos de Copenhague e foi muito criticado. Em Cochabamba, de todos os grupos de trabalho, o que trabalhou este tema foi o que produziu as propostas mais concretas”, diz ela. Copenhague e Cochabamba se referem, respectivamente, à última conferência da ONU sobre mudanças climáticas, feita em dezembro na Dinamarca, e a uma cúpula alternativa convocada pelo governo boliviano que tratou das mudanças climáticas na cidade de Cochabamba. Enquanto na cidade européia predominaram as visões de mercado, na cidade boliviana a urgência é pelo salvamento das condições climáticas que permitem a manutenção da vida sobre a Terra.
A tendência dos países ricos, seus governos e de suas empresas, é transformar a crise climática numa “oportunidade de mercado”, estabelecendo preços e valores para o desmatamento, a poluição atmosférica, bem como para atividades de preservação. Se por um lado isso parece fazer sentido, na prática o que vemos até o momento é que, dado o preço, há quem esteja disposto a pagá-lo, e assim continuar depredando a natureza ainda que sob o custo de um pedágio. E da parte da preservação, dos mecanismos até agora existentes, alguns permitem considerar o plantio de florestas industriais, como por exemplo o insustentável eucalipto, como prática benéfica na luta contra o aquecimento do planeta.
Em ambos os casos, o problema real fica escamoteado. E é por isso que os movimentos sociais e organizações querem trazer o tema do clima de volta para o campo da ética. E para isso, pretendem estabelecer o que vêm chamando de tribunais éticos. O Tribunal Permanente dos Povos pretende se estabelecer como uma instância de julgamento social global daqueles que comprometem as condições de vida de todos unicamente pelos seus próprios interesses. Neste Fórum Social das Américas as organizações vão discutir uma ata de acusação. “Ainda não se sabe se o réu será uma empresa, um Estado ou pessoas físicas que estejam relacionados a algum desastre que tenha provocado alguma variabilidade ou mudança climática. O caminho mais fácil, por exemplo, é processar países que assinaram o Protocolo de Kyoto e não cumpriram ainda”, conta Maureen.
A questão climática é urgente e tem muitos lados. O que se sabe ao certo até agora é que a temperatura do planeta tem crescido muito nos últimos cem anos, por razões evidentemente relacionadas ao uso dos recursos naturais pela humanidade. Um dos vilões, só para citar um exemplo, é a pecuária extensiva. O gado expele, naturalmente, o gás metano, que tem carbono e é pesado, o que contribui para o adensamento de gases de efeito estufa na atmosfera. Países como o Brasil, que multiplicam o número de bois e vacas a fim de exportar carne a qualquer custo e sem tomar medidas de mitigação do metano lançado, são responsáveis. Sobre isso, o colaborador da Fase Sérgio Schlesinger vai debater no Fórum Social das Américas. Ele lançará no Paraguai seu livro “Onde Pastar?”, que trata da questão da pecuária extensiva no Brasil.