Samis Vieira e Yuri Rodrigues
07/02/2024 11:38
A Região Metropolitana de Santarém localizada na região Oeste do Pará, que compreende os municípios de Santarém, Belterra e Mojui dos campos é composta por uma diversidade de comunidades e povos tradicionais – agricultores (as) familiares, agroextrativistas, quilombolas e povos indígenas – caracterizados historicamente, entre outros fatores numa forte relação com o território e pela intensa utilização dos recursos naturais (uso da floresta, capoeiras, caça, pesca e a biodiversidade) que combinam o uso comum desses recursos e apresentam uma estreita interface com o ambiente local. Sujeitos que tratam a terra como bem comum e não como objeto de troca em caráter mercantil. Em meados do ano 2000, com a chegada do agronegócio e a expansão da fronteira agrícola da soja, surgiram vários danos socioambientais, tais como aumento do desmatamento, contaminação de recursos hídricos, perda da soberania alimentar, erosão da biodiversidade, grilagem de terra e a violência no campo. E essas ações contribuíram para violações de direitos humanos, mudanças do uso da terra e alteração dos modos de viver e produzir. Ou seja, as comunidades estão perdendo o poder de decidir sobre seus próprios territórios, muitas vezes restritos a produção de alimentos em áreas contaminadas e, ou pouco apropriadas para a agricultura familiar, que se traduz na ruptura do manejo da paisagem, da diversificação produtiva e dos saberes tradicionais transmitidos ao longo de gerações.
A FASE Amazônia tem construído diversas articulações locais estabelecendo relações políticas consistentes com sindicato de trabalhadores rurais, movimentos pela reforma urbana e de jovens, grupos de mulheres e pastorais, ONGs e instituições de ensino e pesquisa, através da atuação conjunta em redes e fórum, bem como campanha e mobilizações em defesa dos direitos territoriais, da agroecologia e na luta contra os agrotóxicos. Em maio de 2017, em parceria com diversas organizações da sociedade civil, foi criado o Fórum Permanente de Combate de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos no Baixo Amazonas, como instrumento de luta para denunciar a exploração da fronteira agrícola da soja baseada no uso de insumos químicos, fertilizantes, agrotóxicos, monoculturas e na exploração dos recursos naturais. Este espaço teve um papel central na organização de debates e na formulação de propostas referentes ao uso dos agrotóxicos na região, para aumentar a compreensão e ajudar no enfrentamento junto aos movimentos sociais do campo, das águas e das florestas, a partir de três eixos estratégicos: danos socioambientais, danos à saúde humana e a agroecologia como alternativa de produção e resistência das comunidades. Os desafios impostos pela crise sanitária resultante da pandemia do COVID-19 e das ações de desestruturação diante da descontinuidade das políticas advindas de quatro anos de desgoverno intensificaram ainda mais as desigualdades e as estruturas de organização dos movimentos sociais paralisando as agendas de todos os espaços de participação social, inclusive deste Fórum. Por outro lado, favoreceu as cadeias de commodities do agronegócio ampliando o aumento do desmatamento e das devastações ambientais produzidas pelas atividades do setor agropecuário contribuindo para redução da diversidade e a cultura alimentar local e impactando diretamente as comunidades e povos tradicionais que mantém relações pautadas no Bem Viver.
Como resultado deste processo de retomada na busca de constituir um espaço de articulação em rede proporcionando a construção de aprendizados e convergências politicas a FASE Amazônia, juntamente com as entidades, movimentos sociais e organizações populares ligadas aos povos do campo, das águas e das florestas engajadas na luta contra os agrotóxicos e que defendem a bandeira da agroecologia, entre eles: o Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém – (STTR), o Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Mojuí dos Campos – (STTR), Instituto de Saúde Coletiva da UFOPA – (ISCO), o Núcleo de Agroecologia e Bem Viver na Amazônia – (NEA MUIRAQUITÃ), o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), as organizações Terra de Direito, Cáritas Brasileira e a Associação de Moradores do Bairro Pérola do Maicá – AMBAPEM, em parceria com a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, realizaram o I módulo do Curso de Formação em Agrotóxicos, Saúde e Agroecologia, no período de 06 a 08 de novembro 2023, na sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Mojuí dos Campos – STTR.
O objetivo foi contribuir na formação de atores locais de diversos segmentos do estado do Pará ligados aos movimentos sociais, sindicatos, povos dos campos, das águas e florestas no tema “Agrotóxicos e Saúde” para atuação como multiplicadores de conhecimentos e articuladores na constituição de visão crítica e emancipatória compreendendo os fundamentos históricos, políticos e econômicos sobre o uso dos agrotóxicos no Brasil e na região amazônica. O encontro também veio para anunciar a agroecologia como estratégia de resistência e reprodução social de comunidades e povos tradicionais. A proposta metodológica do curso foi organizada em três etapas, a primeira, consistiu em visibilizar os danos socioambientais e organização das denúncias. A segunda, que será realizada em 2024, vai realizar os anúncios e resistências, e na terceira parte, organizar linhas de ações e construção de estratégias da região na luta contra os agrotóxicos. Além disso, a proposta inclui o planejamento comunitário entre cada etapa para realização dos trabalhos tempo/comunidade, que permitirá às lideranças desenvolver ações junto às famílias, comunidades e coletivos colocando na prática do seu dia a dia os conhecimentos adquiridos na formação, criando um espaço rico de troca de saberes e construção de estratégias de combate aos danos socioambientais e na saúde humana causado pelos agrotóxicos nos territórios.
Por fim, o avanço dos monocultivos de soja tem contribuído para a degradação da biodiversidade e provocado a insegurança alimentar e nutricional, cenário que indica a importância de construir processos de mobilização e incidência política na construção de estratégias para formação de “Territórios Livres de Agrotóxicos” visando a criação e ao aprimoramento de políticas públicas, programas, projetos, leis e experiências municipais importantes de apoio a soberania, segurança alimentar e nutricional e agroecologia, sobretudo em infraestrutura e assistência técnica para aumentar a produção e fortalecer os circuitos curtos de comercialização com justiça climática e em defesa dos bens comuns e dos direitos territoriais, valorizando os modos de vida das comunidades e povos tradicionais para que as famílias permaneçam no território, pois estes sim são os verdadeiros guardiões e guardiãs da biodiversidade.