08/03/2013 11:03
Por Ciro Barros, da Agência Pública
Na manhã da segunda-feira (4), a ONU recebeu uma visita inédita: a Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (ANCOP), que reúne os comitês populares de todas as cidades-sede da Copa do Mundo de 2014, foi até Genebra denunciar as remoções forçadas e violações de direitos que estão ocorrendo no Brasil por conta dos megaeventos de 2014 e 2016.
A representante da ANCOP, Giselle Tanaka, falou depois da apresentação do novo relatório da Relatoria Especial da ONU sobre Direito à Moradia Adequada pela urbanista Raquel Rolnik durante a 22ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Giselle destacou que “a realização destes eventos esportivos [Copa e Olimpíadas] no Brasil poderia ter criado a possibilidade de viabilizar significativos investimentos sociais e na infraestrutura”. Na opinião da ANCOP, porém, os altos investimentos dispendidos para sediar os megaeventos vêm a aprofundando a desigualdade social e as violações de direitos no país. “Isto parece ser um tema comum relacionado aos megaeventos e megaprojetos: servir ao lucro de uns e causar prejuízo a milhões”, disse.
A falta de políticas públicas para a prevenção de exploração sexual de mulheres e adolescentes, o aumento de restrição ao trabalho informal e do pequeno comércio, a construção de estádios caros e sem utilidade futura (o que implica em redução de outros investimentos públicos), além da ameaça de remoção de aproximadamente 170 mil pessoas foram algumas das denúncias feitas pela ANCOP.
Leia abaixo, em português, o discurso na íntegra e veja o vídeo, em inglês, da intervenção na Comissão de Direitos Humanos da ONU:
Obrigado Senhor Presidente
Conectas, em parceria com a Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa e Olimpíadas, a Rede Jubileu Sul e a Wittnes gostariam, respeitosamente de chamar vossa apresentação para os graves problemas sociais, abusos aos direitos humanos e remoções forçadas de milhares de famílias que ocorrendo no Brasil em virtude da preparação para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.
A realização destes eventos esportivos no Brasil poderia ter criado a possibilidade de viabilizar significativos investimentos sociais e na infraestrutura do Brasil. Infelizmente, estes investimentos têm sido mal planejados, extrema
mente custosos [1] e, em virtude das pressões da FIFA e do COI, resultado em enormes problemas para as comunidades locais. Na verdade, isto parece ser um tema comum relacionado aos mega eventos e mega projetos: servir ao lucro de uns e causar prejuízo a milhões.
Dentre outros problemas, não existe política pública para prevenir a exploração sexual de mulheres e adolescentes, [2], há aumento da restrição ao direito ao trabalho informal e de pequenos comerciantes [3], a criação de leis especiais que destroem direitos historicamente adquiridos pela população [4], a construção extremamente cara de estádios sem utilidade futura resultando em redução de investimento em áreas cruciais como saúde e educação.
Tem sido noticiado que [6] os dois eventos são responsáveis diretos pelas remoções forçadas ou ameaça de remoções de mais de 170 mil pessoas. Isto corresponde a quase 1 em cada 1.000 brasileiros estão ameaçados de perder suas moradias por conta de jogos que não durarão sequer um mês cada. [7]. Trata-se de um êxodo forçado, de interesse da especulação imobiliária, que alcança proporções alarmantes em uma das cinco maiores populações do mundo.
Delegados,
Isto não é novo para este Conselho. A Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa, já submeteu denúncias para a Relatoria especial e o UPR. Estas denúncias serviram de bases para:
a) Resolução 13/2010 sobre Megaeventos e direito a Moradia;
b) Duas cartas sobre o tema (em 2011 e 2012) da Relatoria Especial para o Governo do Brasileiro, sem que este respondesse satisfatoriamente;
c) Recomendações específicas deste conselho ao governo do Brasil durante seu encontro de maio de 2012.
Dado o silêncio do Governo Brasileiro, com a iminência da Copa das Confederações e a quase um ano da Copa do Mundo, tememos que os abusos aos direitos humanos possam se agravar no Brasil, enquanto aumenta a violência das remoções forçadas.
Excelências,
Nós imploramos a este conselho que diga ao Governo Brasileiro que PARE IMEDIATAMENTE as remoções forçadas e, em parceria com as comunidades afetas, crie um Plano Nacional de Reparações às remoções forçadas e um protocolo que garante os direitos humanos em caso de remoções causadas por projetos ligados a Mega Projetos, e à Copa do Mundo e Olimpíadas.
Obrigado.
Três reportagens da Pública foram usadas como referência na argumentação de Giselle na ONU:
Os ambulantes e as zonas de exclusão da Fifa