15/08/2012 13:01

Matéria publicada no portal Globo Ação mostra maneiras de transformar o circo em ferramenta para a inclusão social. A Rede Circo no Mundo Brasil, apoiada pela FASE em seu nascedouro, articula hoje 20 organizações do país que transformam – cada qual a seu modo – a arte circense em mecanismo de diálogo pedagógico para a construção de cidadania. Como bem resumiu Cleia Silveira, coordenadora do Serviço de Análise e Assessoria a Projetos (SAAP) da FASE, “o objetivo não é a formação de profissionais de circo. Nossa função é de formar cidadãos”.

Por Globo Ação

O picadeiro, as palhaçadas e todo o universo que está do lado de dentro das lonas dos circos são capazes de fascinar crianças, adolescentes e jovens, mesmo aqueles em situação de vulnerabilidade social. Pensando nesse poder de atração, um grupo de organizações não governamentais e escolas de circo se uniu para formar a Rede Circo do Mundo Brasil, cujo objetivo é trocar experiências, informações, estruturar festivais entre outros projetos.

Essas organizações fazem parte da Rede Circo do Mundo, nascida no Canadá e fomentada pelo Cirque du Soleil. No Brasil, as instituições foram articuladas durante muitos anos pela Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional, a Fase. Mas, ultimamente, a Fase está cada vez mais dando espaço para que a própria rede brasileira ganhe autonomia.

A relação entre o Cirque du Soleil com a Rede Circo do Mundo Brasil foi desenvolvida para estimular a arte-educação, a formação de profissionais e também para ajudar financeiramente. Isso é feito através da produção e distribuição de material didático voltado aos educadores; do incentivo ao intercâmbio com os jovens dessas organizações; e, toda a vez que o Cirque du Soleil faz temporada no Brasil, reserva 250 ingressos em cada cidade por onde passa para serem vendidos pelas organizações de cada região. Do total arrecadado, 60% vai para as instituições da cidade e 40% para a rede, com o objetivo de promover atividades coletivas entre alunos e profissionais dessas escolas.

Hoje em dia, a Rede Circo Mundo Brasil é formada por 22 instituições que ficam no Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Todas usam o circo como forma de inserção social de crianças e jovens, e cada organização atende cerca de 10.000 pessoas por ano. “A ideia da rede é proporcionar educação de qualidade e ser um lugar com capacidade para ampliar a visão dessas pessoas. A arte circense é um instrumento de diálogo entre o jovem e a família, e entre o jovem e a sociedade. Ele é um instrumento de motivação”, explica Cleia Silveira da Fase.

Além de ensinar técnicas de malabares, perna de pau, palhaçadas e trapézio, as escolas de circo oferecem atividades extraescolares e acabam, indiretamente, ajudando na relação entre esses jovens e suas famílias e também com a comunidade. “As pessoas se sentem valorizadas. A criança é, para nós, uma ferramenta para a gente poder criar um pacto com a sociedade na qual ela está inserida”, diz o fundador da TrupeTralha, de Belo Horizonte, Jailton Persan. A trupe é uma escola de circo com atividades sociais há mais de 15 anos e tem como objetivo central a melhoria de qualidade de vida de crianças e adolescentes.

Muitas instituições que fazem parte da Rede Circo Mundo do Brasil são também escolas particulares. Vem do pagamento de alunos de classe média e alta boa parte da verba necessária para manter o braço social. As escolas também costumam participar de editais. Festivais, aluguel do espaço para eventos externos e a verba arrecadada com os ingressos do Cirque du Soleil complementam sua verba.

Cofundadora do Circo Laheto, Seluta Rodrigues acredita na força do circo como arma pedagógica e geradora de autoestima. “O circo ajuda as crianças a romperem com as dificuldades todos os dias. Há o desafio dos equipamentos desconhecidos, que eles aprendem a usar; há também o trabalho coletivo, essencial para o circo; e há a superação dos limites: hoje já aprendi a jogar uma bolinha, mas amanhã serão duas. O circo é um espaço de proteção para essas crianças, mas também um espaço lúdico, alegre”.

No Circo Laheto, com sede em Goiânia, ao lado do estádio Serra Dourada, as crianças têm transporte das escolas com as quais o espaço tem convênio, acompanhamento escolar, café da manhã, almoço e lanche. Elas participam das aulas de circo e oficinas de criação de equipamentos para o circo, além de fazerem apresentações para a comunidade.

Anselmo Serrat, da Escola Picolino, de Salvador, também acredita no potencial transformador da arte circense, sem esquecer dos estudos das crianças e adolescentes. Além de equilíbrio, coragem e superação do medo, a escola oferece aulas de dança, sexualidade e reforço escolar. Para quem pretende trabalhar com o circo, o grupo oferece também ajuda para que o aluno se profissionalize. “Quem demonstrar aptidão e querer partir para essa carreira, encaminhamos para cursos preparatórios”, explica Anselmo.

Apesar do forte impacto social que o circo gera, essas organizações e escolas não têm como foco principal a profissionalização dessas pessoas. “Não queremos interferir no futuro delas. A arte tem como proposta fazer a vida delas mais prazerosa. A ideia é que, mais felizes, eles vão acreditar mais neles mesmos”, explica Jailton.

“Nosso objetivo não é a formação de profissionais do circo. Nossa função é de formar cidadãos”, resume Cleia.