22/04/2020 11:14

Oilwarch Latinoamérica¹

No dia da Terra, 22 de abril, a Covid-19 se alastra como pandemia. Por todo o planeta, ameaça seus povos, adoece cidades, infecta milhões de comunidades e famílias, leva a óbito centenas de milhares de pessoas.

Antes mais concentrado na China, Europa e nos EUA, o vírus se expandiu na velocidade e nos caminhos dos negócios, atingindo em dois meses boa parte do Sul global: África, Ásia e América Latina.

Como pandemia, o vírus cruzou os oceanos, aterrissou em aeroportos, desembarcou em terminais portuários, viajou por rodovias e ferrovias. Agora se expande em direção às periferias urbanas mais empobrecidas e já atinge comunidades de povos tradicionais: camponesas, afroquilombolas, pescadores e pescadoras artesanais, povos indígenas em situação de isolamento. Uma tragédia.

A origem e a expansão pandêmica do novo coronavírus está diretamente associada à destruição da Terra: à devastação de suas florestas e substituição por monoculturas de árvores, à destruição de seus ecossistemas, solos e fontes de água, pela mineração e pela expansão petroleira, à extinção de suas espécies e introdução de organismos geneticamente modificados, à contaminação de seus rios e mares por agroquímicos e plásticos, e ao colapso do clima pela extração e queima de combustíveis fósseis. 

O capitalismo e sua civilização petroleira, por caminhos suicidas, explora os recursos, destrói os vínculos e esgota os sentidos da Terra. Não permite alternativas. Por um lado, desdenha das tecnologias e apaga a memória dos povos ancestrais, que sempre souberam cuidar e zelar a Terra. Por outro lado, inviabilizam o debate significativo do futuro, as alternativas de transição e os modos de vida em paz com o planeta.   

A pandemia da Covid19 reflete o dia Terra em 2020, que grita pelo fim da civilização petroleira, socialmente injusta e genocida, ambientalmente irresponsável e economicamente inviável. O desenvolvimento capitalista e seus modos de vida e produção petrodependentes, não garantem nenhuma proteção frente às pandemias, que serão cada vez mais frequentes, com novas viroses como o coronavírus, a gripe aviária e suína, e ainda novas bactérias e vírus que estão congeladas no subsolo da Terra há centenas de milhões de anos e que poderiam se libertar com o desgelo devido ao aquecimento global.

Para enfrentar essa pandemia, está claro que são necessários Estados democráticos, que garantam e aprofundem direitos, investimentos maciços em políticas públicas de saúde e soberania e segurança alimentar, renda mínima para os mais vulnerabillizados, alternativas de transição energética desde os povos, proteção dos territórios coletivos e valorização dos saberes tradicionais e respeito aos Direitos da Natureza. É necessário uma trégua com a Terra. Enquanto a saúde da Terra estiver ameaçada, também a saúde das pessoas estará sob risco.  É insano aprofundar a civilização petroleira e sua guerra contra a ela. A cura, ao contrário, vem do cuidado com a Terra e com as pessoas.

Com a Covid19 e as necessárias políticas de isolamento físico, a civilização petroleira agoniza. Com a queda brusca do consumo de petróleo e derivados, pela primeira vez na história, o preço do barril fechou o dia 20 de Abril negativo em U$37,63, em uma queda livre de 289,4%, no mercado futuro dos EUA. Os tanques, terminais e navios estão no limite de suas capacidades de armazenamento.  A indústria petroleira internacional planeja redução de mais de 20% da produção. A Terra obtém uma curta trégua, mas segue gritando que se detenha a extração e por uma desintoxicação da petrodependência. Não faz mais sentido extrair mais petróleo para fazer girar a velha roda, em seu círculo viciado e decadente.

Diante da mortandade da Covid19, a Terra também silencia. Desde seu abrigo, nos indica os caminhos de saúde. Plena de paz, nos abre os sentidos da transição para sociedades emancipadas dos combustíveis fósseis.

Em 22 de Abril de 2020, no Dia da Terra, nos despedimos dos mortos e deixamos ecoar seu grito entre os vivos: “Lugar de petróleo é no subsolo!”

[1] A FASE é membro da rede Oilwatch Latinoamérica e atua no Brasil pela Campanha Nem Um Poço a Mais.