21/09/2007 18:05

Fausto Oliveira

A Rebrip (Rede Brasileira pela Integração dos Povos) acaba de lançar um livro de fundamental importância para a compreensão dos processos de negociação de serviços na Organização Mundial de Comércio. A OMC reúne a maioria dos países do mundo e pretende, há vários anos, chegar a um consenso global sobre o comércio internacional com a marca do liberalismo. Não consegue, apesar de muitas tentativas, porque a tentativa de impor o comércio ultraliberal a todos os países é refutada vez após vez. E assim ela sobrevive mas não realiza seu intento. A OMC negocia praticamente todas as áreas da vida econômica, entre elas o setor de serviços: saúde, educação, comunicações, finanças, eletricidade, transporte e muitos outros. Tudo, segundo a cartilha da OMC, deve ser negociado entre os países como mercadoria, como objeto de negócios, e não de direitos. O livro “Negociações de Serviços na OMC” é uma radiografia de como estas negociações podem afetar profundamente a vida social no Brasil.

O livro é fruto de uma pesquisa realizada pelo Observatório Social em 2006. O tema de serviços na OMC é organizado no chamado GATS (Acordo Geral sobre Serviços, pela sigla em inglês). O objetivo da obra é demonstrar os riscos que a aceitação plena no GATS pode trazer para a sociedade brasileira e para a nossa economia. Os riscos de uma liberalização radical e súbita são tão grandes e difusos que praticamente todas as organizações que defendem direitos sociais acima e à frente do lucro das empresas estão unificadas contra a assinatura deste acordo na OMC.

Para exemplificar o sentido deste tipo de perda econômica e social, os pesquisadores do Observatório Social fizeram um exercício de comparação. Cotejaram todos os dados que compõem a negociação do GATS (no que diz respeito ao Brasil) com os processos de privatização ocorridos aqui nos anos 90 no setor de serviços. A saber, os setores de telecomunicações, finanças e energia elétrica. A análise aponta que, se de um lado os serviços de telefonia, por exemplo, foram ampliados, de outro eles perderam qualidade e subiram de preço. São os efeitos de uma mercantilização ocorrida então. Este é apenas um exemplo, e circunscrito ao processo de privatização.

Entretanto, o que se propõe com o GATS é muito mais do que simplesmente privatizar. São inúmeros detalhes que flexibilizariam as responsabilidades dos prestadores de serviço, instalariam a lógica do mercado e do lucro acima de tudo, restringiriam o acesso a setores de fundamental importância com base no critério de possibilidade de pagamento. O livro editado pela Rebrip nos convida a pensar como seria o Brasil se, com a assinatura do GATS, a saúde pública tivesse focos de influência comercial privada. Ou se a educação pública tivesse que usar critérios somente econômicos que interessam a empresas fornecedoras ao decidir políticas públicas. A desregulação exacerbada nos países em desenvolvimento, como se anuncia pelo acordo GATS, é um dos maiores interesses nas companhias transnacionais em nome de quem tudo isso é feito.

Este, aliás, é um ponto sobre o qual não pairam ilusões. Os acordos da OMC são tão claramente favoráveis aos interesses de grandes corporações transnacionais que a suspeita já seria válida. Mas a suspeita se torna um dado concreto quando, lendo os documentos da OMC reproduzidos, por exemplo, neste novo livro, vê-se que a coisa pública é tratada apenas como uma “oportunidade de negócios”. A distribuição do livro “Negociações de serviços na OMC” é gratuita. É uma publicação chave para entender um dos mais complexos e importantes processos em que o Brasil está inserido no contexto global.