07/04/2011 12:05
Neste Dia Mundial da Saúde, 7 de abril, dezenas de organizações e movimentos sociais lançam a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida.
O Brasil é o país que mais consome agrotóxicos no mundo desde 2009. Segundo dados do Sindicato Nacional de Produtos para Defesa Agrícola, naquele ano foram vendidos legalmente 1 bilhão de quilos destes produtos químicos no Brasil. A quantidade equivaleria ao uso de 5,2 quilos de veneno por brasileiro. Além disso, um relatório divulgado pelo Ibama no início do ano mostrou que entre os produtos consumidos em 2009, 98% eram classificados como altamente perigosos, muito perigosos ou perigosos. Muitos dos defensivos mais vendidos já foram proibidos em outros países pelos comprovados danos que causam à saúde e ao meio ambiente.
Mato Grosso, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Goiás são, respectivamente, os maiores consumidores de agrotóxicos no país. O uso intensivo destes químicos tem íntima relação com o modelo de agricultura adotado no Brasil: as grandes lavouras de monocultivos, geralmente para exportação, exigem seu uso. O fato é agravado pela introdução de culturas transgênicas, a maioria condicionada ao uso do glifosato. Hoje, este herbicida representa 76% do mercado de agrotóxicos no Brasil.
A Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida é nacional começou a ser articulada pela Via Campesina. Participam mais de vinte movimentos sociais, entidades estudantis e sindicatos em defesa do direito à alimentação saudável para todos, da saúde e qualidade de vida do trabalhador e de um meio ambiente. Entre eles Fase, Fiocruz, Central Única dos Trabalhadores, Cáritas.
Um novo modelo
A engenheira agrônoma Franciléia Paula de Castro trabalha na Fase Mato Grosso, estado que mais usa agrotóxicos: sozinho consumiu 105 milhões de litros na safra 2009/10. Ela diz que a campanha nacional surge como resultado de anos de luta de diversos atores da sociedade contra o uso destas substâncias. Agora, ambientalistas, movimentos sociais do campo e da cidade e pesquisadores resolveram se unir para alertar a população sobre os problemas causados pelo uso de venenos nas lavouras. E também para mostrar que há saídas.
“Neste Dia Mundial da Saúde a campanha será lançada em nível nacional por mais de vinte entidades. A idéia é seguir mobilizando nos estados para denunciarmos os problemas causados pelo uso dos agrotóxicos. E mostrar também que há outro modelo, o da agroecologia, que permite a produção de alimentos saudáveis, garantindo a segurança alimentar”, explica Franciléia.
A agroecologia é uma proposta de agricultura que não se limita a produção sem o uso de agrotóxicos. A idéia central é o respeito às diversidades locais e à convivência com os ecossistemas. Relações justas de comercialização, trabalho e gênero também fazem parte do modelo agroecológico. A diversificação da produção, associada à utilização de técnicas de manejo sustentável do solo e dos recursos hídricos e a baixa dependência de insumos externos garantem a produção de alimentos saudáveis e nutritivos.
Relatório divulgado recentemente pelas Nações Unidas apontou que a agroecologia é a saída para alimentar 9 bilhões de pessoas no mundo em 2050. O relatório foi feito a partir da revisão de trabalhos científicos e desmistifica a crença depositada pelo senso comum sobre os químicos. No Brasil, a Fase faz parte de uma grande articulação que reúne movimentos, redes e organizações engajadas em experiências concretas de promoção da agroecologia. A Articulação Nacional de Agroecologia, busca o fortalecimento da produção familiar e de construção de alternativas sustentáveis de desenvolvimento rural.
Franciléia também destaca que no campo os efeitos negativos do uso de agrotóxicos são mais visíveis por razões como as intoxicações que sofrem os trabalhadores. Já na cidade, a luta contra o uso de venenos que contaminam os alimentos é mais difícil. “É como se fosse um agente invisível, mas sabemos que os efeitos negativos sobre a saúde da população vão surgindo ao longo dos anos”, comenta, explicando que este é mais um motivo para trabalhar com a conscientização.
Campeão no uso de agrotóxicos
No Mato Grosso, onde foram consumidos 105 milhões de litros de agrotóxicos na safra 2009/10, a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida vai ser lançada oficialmente apenas em 5 de junho, Dia do Meio Ambiente. O lançamento vai ser marcado por um grande seminário organizado pelo Grupo de Intercâmbio em Agricultura Sustentável (Gias), que é composto por mais de dez entidades, entre elas a Fase. Franciléia lembra, contudo, que apesar da campanha ainda não estar lançada oficialmente no estado são antigas e numerosas as denúncias sobre os problemas causados por agrotóxicos na região. Recentemente, inclusive, uma pesquisa da Universidade Federal do Mato Grosso mostrando a contaminação do leite materno por agrotóxicos em Lucas do Rio Verde chamou a atenção de todo o país.
Segundo Franciléia, a expansão de áreas agricultáveis, o crescimento no uso de sementes transgênicas e a isenção de pagamento do ICMS para agrotóxicos são alguns dos motivos pra o constante aumento no uso destes venenos no estado. Ela explica ainda que o agronegócio exerce constante pressão contra a agroecologia em todo o Brasil. “Outro problema é a falta de políticas públicas para fomentar a agroecologia na região”, comenta.
Atividades em Brasília
Para o lançamento da campanha permanente, uma marcha passará pelo Ministério da Saúde, da Agricultura e pelo Congresso Nacional com o objetivo de fazer dos agrotóxicos um debate público. A marcha em Brasília também é em protesto contra o projeto de novo Código Florestal que deve ser votado em breve no Congresso, com apoio de ruralistas.
Ainda será realizada uma audiência pública na Câmara Federal sobre agrotóxicos e a saúde dos trabalhadores. Participarão do debate integrantes da Via Campesina, Fórum Brasileiro de Combate aos Efeitos dos Agrotóxicos e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Para saber mais
Conheça a série de reportagens sobre agrotóxicos produzida pela Radioagência NP.
Assista também a reportagem sobre o Fórum Pernambucano de Combate aos Efeitos dos Agrotóxicos.