10/11/2015 16:11
Andrés Pasquis¹
“Apesar da seca e das cercas, o Cerrado ainda floresce” é o lema das festas de trocas de sementes organizadas pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), com o apoio de organizações e comunidades parceiras. É nesse contexto que a comunidade tradicional Buriti do Atalho celebrou, em 24 de outubro, a IV Festa da Troca de Sementes Crioulas do município de Nossa Senhora do Livramento, a 50 quilômetros de Cuiabá (MT).
“As festas da semente sempre foram feitas em mutirão, reunindo as comunidades e famílias para derrubar barreiras, abrir caminhos e encontrar alternativas aos problemas enfrentados”, conta Irmã Vera, coordenadora estadual da CPT. Com o objetivo de preservar a cultura, a tradição e a vida através da difusão de conhecimentos históricos e de sementes crioulas, agricultores familiares e comunidades tradicionais se organizam para fortalecer a agroecologia e lutar contra o sistema imposto pelo agronegócio, com suas monoculturas e agrotóxicos. “As festas da semente são um exemplo disso”, explicou a Irmã.
Nesse sentido, Carlos Roberto da Costa, prefeito de Livramento presente durante a celebração, declarou que eventos como esse são muito importantes, já que as trocas de sementes sempre existiram entre pequenos agricultores como base de organização social. O prefeito explicou que a agricultura familiar, além de ajudar a manter tradição e cultura, permite melhorar a qualidade das sementes, sendo uma alternativa, sem agrotóxicos, elemento importantíssimo dado o avanço da soja no Mato grosso. “Porém, os pequenos agricultores do nosso município ainda enfrentam grandes dificuldades, como a falta de assistência e orientação técnica. A Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural – Empaer só consegue disponibilizar dois técnicos para cerca de 30 comunidades. Desse jeito é difícil se adaptar e lutar contra grandes ameaças como o avanço da sojicultura”, disse Carlos.
Francileia Paula de Castro, educadora do programa da FASE no Mato Grosso e representante estadual da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, explicou que a alternativa é a agroecologia e a valorização dos conhecimentos tradicionais. “Cada semente, cada muda, têm sua história e seus conhecimentos. Elas não passam só por trocas, mas por pessoas, famílias, lares e comunidades, levando com elas toda essa sabedoria”, disse Francileia. Durante a festa, ela incitou os agricultores a cadastrar suas sementes no Banco de Informações de Sementes Tradicionais (BIS), um registro cujo objetivo é facilitar a troca e disseminação de mudas e sementes crioulas, fortalecendo a agroecologia.
Além de vários produtos derivados da agricultura familiar, como doces, sucos, pães, farinhas e castanhas, os participantes também puderam desfrutar de danças e ritmos como Carimbó e Cururú. Somando-se às atividades culturais, foram organizados debates e cinco oficinas educativas: ‘Agroecologia, inseticidas e biofertilizantes naturais’, ‘Brincando e reciclando’, ‘Cuidado da água e da vida’, ‘É ou não é semente crioula?’ e ‘Saúde e plantas medicinais do Cerrado’. O dia finalizou com o momento mais esperado, a ‘Feira de Roças e Quintais’, onde foram trocadas, sorteadas e presenteadas sementes e mudas variadas.
“Estas festas nós dão a resistência e a força que estão na terra. A resistência para continuarmos protegendo nossas tradições e a força para seguir lutando contra o avanço da soja e dos agrotóxicos”, concluiu a Irmã Vera.
A próxima Festa da Troca de Sementes Crioulas do município de Nossa Senhora do Livramento já está prevista para o mês de setembro 2016, na comunidade Campina de Cima.
[1] Matéria do site do Grupo de Intercâmbio em Agroecologia de MT (Gias), do qual a FASE faz parte.