12/04/2016 17:13
Andrés Pasquis¹
‘Participar na promoção de processos para a construção e execução de estratégias de desenvolvimento rural sustentável, centrado na expansão e fortalecimento da agricultura familiar por meio de metodologias educativas e participativas, buscando viabilizar as condições para o exercício da cidadania e a melhoria da qualidade de vida da sociedade’. Essa é a missão da Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) estabelecida, em 2003, pela Política Nacional de Ater (Pnater), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).
Trata-se de um modelo de assistência e extensão bem diferente dos anteriores, já que estes focavam exclusivamente a maximização da produção para o lucro sem levar em consideração os impactos socioambientais. Através de noções como a preservação do meio ambiente, a valorização e intercâmbio de conhecimentos e o fortalecimento de populações rurais e/ou tradicionais, como agricultores e agricultoras familiares, assentados e assentadas da Reforma Agrária, extrativistas, quilombolas, indígenas, entre muitas outras, a nova Ater tem como objetivo desenvolver e apoiar outro tipo de agricultura, social e ambientalmente justa, baseada na agroecologia.
Em 2010, buscando garantir a segurança e a soberania alimentar da sociedade e promover melhores condições de vida para as populações rurais e urbanas, os princípios da Pnater viraram política de Estado, contratando assim prestadores de serviços através de chamadas públicas. Nesse sentido, em abril de 2012 foi criada e realizada a primeira Conferência Nacional de Ater (Cnater), cujo objetivo era debater os rumos e propostas da dita Assistência Técnica. Entre os pontos discutidos, estavam o aumento dos recursos destinados à Ater, uma melhor adaptação à diversidade da agricultura familiar com foco nas mulheres, jovens e comunidades tradicionais, a criação de um Plano Nacional de Agroecologia e de um Sistema Nacional de Ater.
Quatro anos depois, é possível notar certos avanços: houve um aumento de recursos do governo federal destinados à Ater e sua integração ao Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo). Além do mais, foram criadas chamadas públicas específicas para grupos de mulheres, juventude e agroecologia, atendendo cerca de dois milhões de famílias por meio de entidades estaduais e Organizações Não Governamentais (ONGs). No entanto, constata-se que apesar dos avanços ainda falta um Sistema Nacional de Ater que articule eficientemente as atividades e parcerias dos governos, ONGS, associações e sociedade civil, para atender eficazmente mais de três milhões de famílias ainda sem acesso à Assistência Técnica.
Conferências de Ater
É nesse contexto que várias Conferências Estaduais de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ceater) estão sendo realizadas em preparação à 2ª Cnater. Em Mato Grosso, a capital Cuiabá sediou a Ceater nos dias 4 e 5 de abril, com o lema da Conferência Nacional, ‘Ater, agroecologia e alimentos saudáveis’. A segunda Cnater é orientada ao redor de três eixos de discussão, que são: a instituição de um Sistema Nacional de Ater que implemente verdadeiramente a Política Nacional, a articulação de políticas públicas mais inclusivas e adaptadas à realidade da agricultura familiar e a formação e construção de conhecimentos em Ater para capacitar técnicos e a sociedade de maneira a compreender melhor a realidade da agricultura familiar e da agroecologia.
Cerca de 100 representantes de órgãos públicos, sociedade civil organizada e associações da agricultura familiar participaram dos dois dias de Conferência. No segundo dia, três grupos foram formados para refletir sobre os pontos citados, sempre orientados pelos eixos transversais da Ater, que focam mulheres, juventude e povos e comunidades tradicionais. Fátima de Moura, coordenadora da FASE em Mato Grosso, explicou que as atividades da organização no estado, além de responder às chamadas de Ater Agroecologia e Crédito Fundiário, já trabalhavam com esses públicos, como no caso da parceria com associações agroecológicas e/ou extrativistas, como a Associação Regional de Produtoras Extrativistas do Pantanal (Arpep), também presente na Ceater. Apresentou também a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, destacando que é imprescindível considerar nessas Conferências a ameaça que a utilização de agrotóxicos e transgênicos representa, ainda mais em Mato Grosso, estado brasileiro que mais consome veneno. Finalmente, ela explicou que, desde 1999, existe no estado uma rede que defende e promove um sistema social, econômico e ambientalmente justo, baseado nos conceitos agroecológicos: o Grupo de Intercâmbio em Agroecologia (Gias), constituído pela FASE, pela Arpep e por cerca de outras 40 organizações.
No entanto, Fátima colocou que, além de discutir os sérios problemas relativos aos recursos para Ater, as políticas públicas “muito burocráticas e pouco adaptadas para a agricultura familiar” e a “urgência de formação de técnicos com uma visão mais humanista e orientada para a agroecologia”, o presente contexto de instabilidade política preocupa ainda mais os movimentos sociais, considerando as conquistas alcançadas até hoje. “No contexto atual, não temos certeza de que o diálogo estabelecido nos últimos anos entre movimentos sociais e governo, assim como as políticas públicas pautadas e alcançadas juntos, estejam garantidos. Por exemplo, o acesso à recursos para Ater é cada vez mais inseguro e o próprio MDA já sofreu vários cortes de orçamento”, explicou.
A Conferência Estadual de Mato Grosso foi realizada no Centro de Treinamento Sindical Rural (Centresir), da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetagri), finalizando com a eleição de delegados e de delegadas para representar o estado na 2ª Cnater, que acontecerá do 31 de maio ao 3 de junho de 2016, em Brasília.
[1] Matéria d site do Grupo de Intercâmbio em Agroecologia (Gias).