06/09/2018 15:41
Na semana do 7 de setembro, data em que se celebra o Dia da Independência do Brasil, organizações de sociedade civil, conselhos nacionais de direitos, instituições acadêmicas, sindicatos e movimentos sociais lançaram um documento político cobrando posicionamento das candidatas e dos candidatos aos Poderes Executivo e Legislativo sobre a revogação da Emenda Constitucional (EC) 95. Além de denunciar a piora acelerada das condições de vida da população, as entidades chamaram atenção para o aumento da fome e para o crescimento da mortalidade infantil, entre outros graves retrocessos. A iniciativa foi promovida pela Coalizão Antiausteridade e pela Revogação da Emenda Constitucional (EC) 95 – articulação impulsionada pela Plataforma Dhesca (Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais), responsável pela Campanha Direitos Valem Mais, Não aos Cortes Sociais.
Nesta quarta-feira (5), um cortejo fúnebre foi realizado próximo à Estátua da Justiça, na Esplanada do Ministério, denunciando o crescimento da mortalidade infantil no Brasil. Além da encenação, os presentes penduraram uma faixa em que se podia ler: “Quem apoia os cortes sociais têm sangue das nossas crianças nas mãos”. “O cenário que querem apresentar para o Brasil é mais bárbaro do que o que existia antes da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Precisamos dizer basta!”, disse Ronaldo Santos, presidente do Conselho Nacional de Saúde. Comprometida com a democratização do debate sobre política econômica, a Campanha visa somar forças políticas pela: revogação da EC 95, retomada dos investimentos públicos em políticas sociais, culturais e ambientais; e por uma ampla reforma tributária progressiva no país.
A Campanha também lançou um conjunto de materiais de comunicação estimulando a população a votar somente em candidatas e candidatos aos Poderes Executivo e Legislativo comprometidos com a revogação da EC 95 e com as demais propostas da Coalizão. Porém, o esforço de mobilização deve ultrapassar o momento eleitoral. “É muita dor. Essa simbologia do cortejo fúnebre é para mostrar que não aceitamos que existam pessoas tidas como ‘matáveis’ ou ‘elimináveis'”, protestou Ronaldo, que defendeu o Sistema Único de Saúde (SUS).
EC 95: a destruição de um país
Aprovada em dezembro de 2016, a EC 95 estabelece a redução do gasto público em educação, saúde, assistência social e em outras políticas sociais por 20 anos, aprofundando a miséria, acentuando as desigualdades sociais do país e, em especial, comprometendo ainda mais as condições de sobrevivência da população, sobretudo da população pobre e negra. A EC 95 é objeto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 5633, 5643, 5655, 5658, 5715 e 5743, que solicitam sua revogação imediata pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Todas essas ADIs foram distribuídas à ministra Rosa Weber.
Estudos como o da Plataforma Dhesca¹, o “Direitos Humanos em tempos de austeridade“, elaborado pelo Inesc, Oxfam e pelo Centro para os Direitos Econômicos e Sociais, e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entre muitos outros, vem demonstrando o profundo impacto da Emenda em várias áreas sociais, acarretando grandes retrocessos na garantia de direitos, dos quais o incêndio do Museu Nacional no Rio de Janeiro representa mais um triste capítulo.
Em agosto deste ano, sete Relatores da Organização das Nações Unidas (ONU)² lançaram pronunciamento internacional conjunto denunciando os efeitos sociais da EC 95 e o fato do Brasil ser o único país do mundo a ter constitucionalizado a austeridade como política econômica de longo prazo. Criticada no país e internacionalmente como extremamente ineficaz e destruidora das condições de vida da população, inclusive por organismos internacionais conservadores como o próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), a política econômica de austeridade tem como base o entendimento equivocado de que há somente um caminho para um país sair da crise econômica: cortar gastos sociais, atacar direitos constitucionais e privatizar bens públicos.
A Campanha denuncia que esse caminho cria um círculo vicioso que aumenta o desemprego, diminui a arrecadação de impostos, concentra a renda ainda mais na mão de poucos, destrói setores produtivos e viola – de forma ampla e extremamente perversa – os direitos humanos da população, com impacto terrível nos setores mais empobrecidos. Ao contrário: os investimentos sociais diminuem as desigualdades. Por isso, em vários países, mesmo em períodos de crise, há aumento desse investimento, que é considerado uma medida anticíclica.
Confira o vídeo da Campanha Direitos Valem Mais:
[1] A FASE integra a Plataforma Dhesca. Matéria atualizada no dia 6 de setembro.
[2] Os relatores que assinaram o Pronunciamento conjunto foram: Juan Pablo Bohoslavsky, especialista em dívida externa e direitos humanos; Léo Heller, relator especial sobre os direitos humanos à água e ao esgoto sanitário; Ivana Radacic, presidente do grupo de trabalho sobre discriminação contra a mulher na lei e na prática; Hilal Elver, relatora especial para o direito humano à alimentação; Leilani Farha, especialista em direito à habitação adequada; Dalnius Puras, relator para o direito humano à saúde; e Boly Barry, relatora para o direito à educação. A integra do Pronunciamento dos Relatores da ONU está disponível aqui.