19/06/2019 16:09

 (Foto: Dagmar Talga/Coletivo de Comunicadores do Cerrado)

Violências físicas e psicológicas, falta de políticas públicas contextualizadas, invisibilização do trabalho e perseguição nos territórios foram alguns dos pontos refletidos durante o 1º Encontro Nacional das Mulheres do Cerrado¹, realizado entre os dias 14 e 16 de junho, em Luziânia (GO). Mais de 100 mulheres vindas de diferentes regiões do bioma e de segmentos diversos de povos e comunidades tradicionais se reuniram para refletir sobre estratégias de resistência e estímulo ao protagonismo político. Dentre os caminhos, ficou claro que o cuidado uma com a outra e o fortalecimento coletivo são essenciais.

Nos três dias de Encontro, as mulheres “cerradeiras” denunciaram o grave processo de invasão de territórios que suas comunidades vem sofrendo. O avanço de grandes empreendimentos, a expansão dos latifúndios, a grilagem e a mineração, dentre outras formas de invasão territorial, além de aumentarem os impactos ambientais com o desmatamento e a diminuição das fontes de água, trazem violências antes não conhecidas pelos povos e comunidades tradicionais. “O assédio sexual passa a perseguir nossas mulheres. Fora os agrotóxicos dessas empresas que contaminam nossos rios, envenenam nossos corpos e até nosso leite materno”, denuncia Joana*.

 (Foto: Campanha em Defesa do Cerrado)

Além de lidarem com as problemáticas no âmbito público, as mulheres do Cerrado também precisam unir forças para enfrentar violências estruturais no seu cotidiano. A violência doméstica, a não valorização de seus trabalhos, dentre outros fatores, fazem com que as mulheres adoeçam física e psicologicamente. Elas passam, assim, a perceber a necessidade de se articular e se fortalecer. “É preciso colocar o cuidado coletivo e a aliança entre nós em pauta”, pontua Maria*.

Diante das provocações e dos debates, as mulheres traçaram rumos para se empoderar politicamente, se pautando muito no cuidado com a outra, e nos instrumentos que permitem sua liberdade de fala e atuações políticas. A agroecologia e a educação contextualizada aparecem aqui como estratégias fundamentais de resistência nesse processo que, além do empoderamento feminino, conta com um processo de luta também pautado no cuidado. “A gente precisa cuidar da gente mesma para resistir aos problemas nas comunidades, precisamos construir nossa autonomia econômica, participar da política e tomarmos nossas decisões. Precisamos construir nossos movimentos populares”, declara Maria.

Carta Final do Encontro

Leia a Carta na íntegra.

“Nós somos as guardiãs do Cerrado e dos saberes populares que herdamos de nossos e nossas ancestrais. Por toda nossa história, lutamos para que nossa cultura e modos de vida resistissem. Unidas na nossa diversidade, afirmamos aqui que o Cerrado brasileiro tem cara de mulher! Essa mulher é resistente, resiliente, negra, indígena, quilombola, feminista, camponesa, assentadas e acampadas, sem-terra, atingida por mineração e barragens, quebradeira de coco babaçu, sertaneja, pescadora, vazanteira, LGBTQ+, assalariada rural, fundo e fecho de pasto, raizeira, benzedeira, agricultora familiar, geraizeira, ribeirinha. O Cerrado é um mosaico de vidas e biodiversidades. É berço das águas do país e seus campos e florestas são os lugares que nos alimentam. Por isso, participamos da Campanha Nacional em Defesa do Cerrado por compreender a profunda relação desse bioma com nossos modos de vida”, destaca o documento².

[1] Matéria originalmente publicada pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN). Por segurança, os nomes das mulheres nessa matéria são fictícios.

[2] Leia a Carta do I Encontro Nacional das Mulheres do Cerrado no site da Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, da qual a FASE é parte.