15/01/2021 16:55
Sara Pereira¹
Manaus é novamente o epicentro da pandemia no Brasil. É trágico que na maior metrópole da Amazônia, conhecida como o pulmão do mundo, a população esteja morrendo por falta de oxigênio. Uma tragédia, que está longe de ser uma fatalidade. É na verdade consequência de um governo federal que tem a necropolítica (a política da morte) como estratégia principal.
O discurso negacionista de Bolsonaro, que sempre minimizou o alcance da pandemia — e agora coloca em dúvida a eficácia da vacina — provoca um efeito devastador na população, que acaba acreditando nas perversas mentiras do chefe da nação. Soma-se a isso a falta de uma política regular de distribuição de renda mínima: os mais pobres são empurrados para uma situação de total vulnerabilidade econômica. Assim, quando as autoridades locais e estaduais tentam implementar medidas restritivas, com o objetivo de assegurar o isolamento social, a população protesta exigindo o direito de trabalhar para sustentar suas famílias.
Enquanto os gestores locais entram em guerra com seu povo, o governo federal age como se não tivesse nada a ver com isso, e faz “live” para exigir o tratamento precoce. Mas, o que seria um tratamento mais precoce do que uma ampla e séria campanha de vacinação? Bolsonaro responde que é a prescrição de vermicida e remédio para malária. Seria cômico, não fosse trágico.
A segunda onda da pandemia do coronavírus (se é que a primeira cessou algum dia) tem, novamente, a capital do Amazonas como a primeira a colapsar o sistema de saúde. Repete-se, em espetáculo televisionado, o que já vem sendo negado aos povos amazônidas desde o início da colonização: o direito de viver e morrer dignamente. Graças à solidariedade da população, de artistas e governadores de estados vizinhos, algumas centenas de pacientes ganham uma chance de sobreviver por conta da doação de cilindros de oxigênio, ou por serem removidos para tratamento em outros locais.
Enquanto a Câmara Federal não tiver coragem para julgar o impeachment do presidente genocida, o enfrentamento à pandemia continuará sendo como o beija-flor que tenta apagar o incêndio na floresta com gotinhas de água no seu bico. Mas diferente da fábula, para o povo brasileiro, especialmente para os amazônidas, o fim dessa história não tem nada de beleza, somente desespero, sofrimento e morte.
[1] Educadora do programa da FASE na Amazônia.