26/10/2004 13:19

Erick Schunig Fernandes

Um banho de sangue. Esse poderia ter sido o resultado de um confronto entre a polícia militar e índios guarani e tupinikim em 18 de outubro no município de Aracruz, norte do Espírito Santo. Um mandado de reintegração de posse de toras de eucalipto que estão em poder dos índios foi o centro do conflito. A madeira foi cortada de uma área da empresa Aracruz Celulose, acusada pelos índios de não cumprir um acordo feito com eles em 1998. O mandado, expedido pelo juiz estadual Marcelo Pimentel, autorizou a entrada da polícia militar na aldeia tupinikim de Caieiras Velha com o objetivo de reintegrar a madeira à empresa. Um dia após a violência iminente, o mesmo juiz declarou-se incompetente para julgar casos envolvendo comunidades indígenas.

Segundo as comunidades indígenas, o acordo estabelecido em 1998 e corroborado em 2002, previa que Aracruz Celulose garantisse empregos e cursos profissionalizantes para os índios,além de despoluir os rios Sahy e Guaxindiba. Além disso, os índios querem continuar retirando o resíduo de eucalipto – restos de galhos e troncos – sem que haja repressão da empresa. Devido ao descumprimento do acordo, os grupos indígenas realizaram protestos entre os dias 11 e 15 de outubro, derrubando dois hectares de eucalipto da Aracruz Celulose. O objetivo do protesto, segundo as lideranças indígenas, era reter as toras de eucalipto na aldeia de Caieras Velha e fazer com que a empresa cumprisse o acordo.

Para a assessora da comissão de caciques tupinikim e guarani do Espírito Santo, Arlete Schubert, o mandado do juiz estadual foi suficiente para criar um clima de tensão entre os índios, dispostos a impedir a entrada da polícia na sua área. O argumento maior dos indígenas é sobre a competência da administração das áreas onde vivem: por lei, a competência é federal, enquanto a decisão de reintegração de posse tinha partido da justiça estadual. “A decisão desse juiz não procede e estamos preparados para encarar a tropa de choque” afirma o cacique tupinikim da aldeia de Caieras Velha, Vilsom de Oliveira.

O confronto foi evitado na última hora graças a uma liminar obtida pela Procuradoria da Fundação Nacional do Índio (Funai) contrária à decisão do juiz Marcelo Pimentel. O argumentos dos índios foi aceito pela Funai, ou seja, a decisão do juiz não procedia porque a área da aldeia Caieras Velha é de responsabilidade da União. A reintegração de posse, portanto, deveria ser julgada em âmbito federal. De acordo com Edelvira Tureta, que é chefe do posto regional da Funai no ES, a situação ainda é tensa e os índios só vão liberar a madeira quando representantes da Aracruz forem até a aldeia de Caieras Velha explicar porque o acordo não foi cumprido.

Uma comissão da direção regional da Funai está na região tentando resolver o impasse. Segundo o administrador-executivo regional da Funai, Valdemar Adilsom, a comissão vai fazer um levantamento da situação para promover o diálogo entre as comunidades indígenas e a empresa. Ele disse estar surpreso com a liminar expedida pelo juiz Marcelo Pimentel, que autorizou a entrada da polícia militar na aldeia. A comissão vai elaborar um relatório para a sede da Funai em Brasília. Os grupos indígenas afirmam que não vão permitir a retirada da madeira de Caieras Velha até que a empresa Aracruz cumpra o acordo. Caso não sejam atendidos, os índios prometem cortar mais áreas com plantio de eucalipto da empresa.