Paula Schitine
04/04/2024 16:01
A FASE promoveu nos dias 18 a 20 de março, no Rio de Janeiro, o primeiro módulo do Programa Nacional de Formação de Multiplicadores e Multiplicadoras em Agricultura, Floresta e Justiça Climática. Quarenta e quatro lideranças de organizações de povos indígenas, povos e comunidades tradicionais (APIB, COIAB, , CONAQ, CONFREN, MIQCB e Rede PCT), de movimentos sociais e sindicais do campo (CUT CONTAG, CONTAR, MST, , MPA, MAB e MAM), e mais representantes de redes nacionais e regionais (GTA, ANA, Grupo Carta de Belém), de 17 estados de todas as regiões do País.
O curso está sendo desenvolvido em três módulos presenciais, com momentos à distância. O primeiro módulo focou a governança global climática, os mercados de carbono, o financiamento climático e os direitos territoriais. O segundo módulo acontecerá em junho, e vai abordar a governança climática nacional, os marcos legais e as políticas de uso da terra e as alternativas dos povos para Justiça Climática. E o terceiro módulo, que acontecerá em agosto, vai focar em Instrumentos para a garantia e proteção de direitos e transição justa.
O objetivo do Programa é contribuir para o fortalecimento da atuação das lideranças do campo, das florestas e das águas nos espaços de incidência climática nacional e internacional na defesa dos seus direitos, territórios e acesso a políticas públicas emancipatórias.. “No Brasil, o padrão desigual de proteção ambiental tem origens históricas, determinadas pela concentração fundiária, pelo racismo estrutural e pela distribuição desigual de renda. As diferenças de classe, cor e gênero, têm sido historicamente utilizadas para regular a distribuição de poder e o acesso à riqueza social e aos recursos naturais. Face à crise climática em que vivemos, por um lado, faltam políticas públicas para apoiar povos tradicionais, comunidades locais e agricultores familiares e camponeses que enfrentam as mudanças climáticas em seus territórios. Por outro, os crescentes esquemas de mercado de carbono trazem novas possibilidades de recursos financeiros, mas o nível de informação disponível e de governança traz profundos desafios e dificuldades”, diz uma das educadoras do curso, e coordenadora do Núcleo de Políticas e Alternativas da FASE (NuPA), Maureen Santos.
Um dos objetivos do curso é mostrar como os mercados de carbono, especialmente, o mercado voluntário baseado em compensações florestais e de biodiversidade, são impulsionados pelo setor privado e pelo sistema financeiro. Além disso, o mercado voluntário de carbono florestal na Amazônia tem funcionado por meio da ausência de uma arquitetura de governança pública, de quadros legais definidos e de controle social, aumentando as assimetrias entre empresas e organizações comunitárias locais. Este cenário gera incertezas,insegurança territorial, tensões, impactos socioambientais e violações de direitos humanos, além de desinformação.
“Assim, o Programa Nacional de Formação de Multiplicadores/as sobre Agricultura, Floresta e Justiça Climática buscará suprir parte dessa demanda de conhecimento e debate sobre o tema por parte de lideranças de movimentos sociais. Para isso, elaboramos um plano de formação para apoiar a construção de habilidades e conhecimento crítico para atuação na governança climática nacional e internacional, para um diálogo político mais equilibrado”, explica Maureen. O curso também traz, em seu conteúdo, a trajetória das COPs (Conferência Internacional das Partes) e os principais acordos, como o Acordo de Paris e os pontos de negociação, os órgãos subsidiários, as reuniões e grupos de trabalho.
“Como pressupostos metodológicos básicos, a FASE adota como princípio o fato de que todas as pessoas acumulam conhecimento, que deverá se articular com as vivências e os saberes das outras pessoas, a prática do trabalho coletivo, o estímulo à participação e ao diálogo, o confronto das ideias e o desenvolvimento da criatividade individual e coletiva”, justifica a diretora executiva da FASE e também facilitadora do curso, Letícia Tura.
Os participantes do primeiro módulo elogiaram o conteúdo do curso e principalmente a metodologia que promove espaços de interação com outras lideranças e a escuta de outras experiências.
“Eu acho que essa interação é importantíssima, que nós vamos aprendendo juntos”, diz Jonny Martins de Jesus, da Rede de Povos e Comunidades Tradicionais. Ele explica que no território quilombola de onde vem, “Furnas de Benedito”, há uma grande quantidade de água, com nascentes, cachoeiras e muita biodiversidade. , por isso, já foi alvo de contaminação de sementes e animais pelo próprio governo porque seriam prejudiciais à saúde “Eles contaminaram nossos porcos por exemplo dizendo que poderiam causar infarto e hoje esses animais são vistos com fontes de proteína saudáveis. Então, o estado sempre tenta expropriar o nosso saber e hoje quem faz isso são as grandes corporações ”, alerta.
Miquelis Schiavon conta que ainda não tinha participado de nenhuma atividade promovida pela FASE, mas o que o chamou a atenção foi a diversidade. “Essa questão de contemplar os diversos territórios do país faz com que quem está num outro território consiga entender a dimensão que o país é e as dificuldades que, às vezes, temos no território são pequenas frente às dimensões e aos desafios que os territórios têm”, analisa. “Eu acho que esses temas do curso são primordiais, tendo em vista que a desinformação hoje reina e é a principal forma que o capital ou que essas empresas utilizam para cooptar as pessoas. E essa informação correta, do ponto de vista de entender o que está em jogo, é muito importante. Porque aí os territórios e as comunidades podem decidir sobre a sua vida, entre querer ou não se submeter a uma determinada ação de uma empresa ou de algo, então esse empoderamento é importante e só é possível a partir da informação, ter a informação é central”, completa a liderança do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA) do Rio Grande do Sul.
*Comunicadora da FASE