08/03/2010 15:59
Rulian Emmerick e Ana Carolina Ferraz*
É de amplo conhecimento que a desigualdade entre homens e mulheres na sociedade brasileira é histórica e ainda muito significativa. No que diz respeito à juventude, a situação não é diversa, a desigualdade de gênero também está presente.
Se voltarmos nossa atenção para os direitos sexuais e direitos reprodutivos, a desigualdade de gênero entre os jovens é patente. As jovens estão mais vulneráveis do que os jovens no que diz respeito à sexualidade e a reprodução, principalmente se olharmos para a juventude das áreas marginalizadas das grandes cidades.
No projeto “Acesso à Justiça e Cultura de Direitos”, realizado pelo Núcleo de Direitos Humanos da FASE (DESC/FASE) com o apoio da União Européia, que tem como objetivo formar jovens Promotores Populares de Justiça em três comunidades do Rio de Janeiro (Complexo do Alemão, Manguinhos e Vila Aliança), temos percebido que as jovens destes territórios são as que mais sofrem os efeitos da precariedade na garantia dos direitos sexuais e direitos reprodutivos.
Percebe-se, pelo contato com a realidade destas jovens, que mesmo que aspectos relacionados aos direitos sexuais e reprodutivos não ocupem o topo das demandas e preocupações em seu discurso, eles afetam diretamente suas realidades. E, de fato, são as jovens as mais atingidas pela não garantia efetiva de tais direitos pelo poder público.
O trabalho realizado nas três comunidades citadas tem demonstrado ser um importante instrumento de reflexão sobre a fragilidade na garantia dos direitos sexuais e direitos reprodutivos das mulheres jovens e adolescentes. Neste contexto, cremos que algumas questões específicas merecem destaque e devem ser pontuadas, tais como: (i) a precariedade dos serviços públicos de educação e informação sobre sexualidade e reprodução; (ii) a precariedade dos serviços e do fornecimento de insumos voltados à garantia da saúde sexual, como preservativos, métodos contraceptivos etc.; (iii) a precariedade dos serviços de atendimento de saúde e assistência social para jovens e adolescentes grávidas ou que deram à luz.
Nota-se, através do trabalho realizado nas três comunidades (oficinas, grupos focais, encontros, diagnóstico, etc.), que os serviços públicos voltados à garantia dos direitos sexuais e reprodutivos do(a)s jovens é quase inexistente ou bastante precários, seja em matéria de informação ou de serviços de saúde. A precariedade dos serviços públicos naquelas comunidades, aliada a outros determinantes, resulta em conseqüências perversas no que diz respeito aos direitos das jovens. O alto índice de gravidez precoce talvez seja apenas uma conseqüência mais visível.
Como a gravidez ocorre no corpo das jovens, são elas as que mais sofrem as conseqüências, bem como com o fato de se ver responsável por um filho precocemente. São as jovens que muitas vezes abandonam o trabalho e os estudos; são elas que sofrem com a falta dos serviços sociais, como a inexistência de creches ou com a precariedade da saúde pública para seus filhos; são elas que criam seus filhos, pois em grande número de casos não recebem apoio do pai, na grande maioria das vezes também jovens.
Assim, reconhecemos, no contexto da abrangência do projeto realizado pelo Núcleo de Direitos Humanos da FASE, que as jovens e as adolescentes são as que mais sofrem as conseqüências da precariedade da garantia dos direitos sexuais e reprodutivos. Neste sentido, estão previstas atividades coletivas de formação com os grupos sobre a temática dos direitos sexuais e reprodutivos, no intuito de informar o(a)s jovens que tais direitos foram reconhecidos como direitos humanos no âmbito internacional e nacional e que, portanto, devem ser exigidos dos poderes públicos.
Em que pese a desigualdade de gênero no âmbito da juventude, e que são as jovens as que mais sofrem as conseqüências da precariedade na garantia dos direitos sexuais e reprodutivos, entendemos que tanto mulheres quanto homens são sujeitos de direitos e que, a partir do momento em que as jovens e adolescentes são as mais atingidas pela precariedade dos serviços públicos, a construção de uma cultura de direitos fica prejudicada.
Desta forma, o Dia Internacional da Mulher deve ser celebrado como um dia de luta pela implementação dos direitos humanos das mulheres que foram reconhecidos expressamente na Declaração e Programa de Ação de Viena de 1993, que estabelece: “os direitos humanos das mulheres e das meninas são inalienáveis e constituem parte integral e indivisível dos direitos humanos universais. A plena participação das mulheres em condições de igualdade, na vida política, civil, econômica, social e cultural nos níveis nacional, regional e internacional, e a erradicação de todas as formas de discriminação com base no sexo, são objetivos prioritários da comunidade internacional. (…) Os direitos humanos das mulheres devem ser parte integrante das atividades das Nações Unidas na área de direitos humanos relacionados à mulher.”
*Integrantes do Núcleo de Direitos Humanos da Fase.