19/12/2007 15:31

Fausto Oliveira

Um dos acontecimentos mais fundamentais para o movimento de reforma urbana este ano foi a realização da 3ª Conferência Nacional das Cidades. Várias foram as conquistas da sociedade civil organizada neste processo. Em termos gerais, pode-se dizer que houve avanços rumo a uma maior autonomia das populações periféricas das cidades em relação à solução do déficit habitacional, assim como foi reforçada a lógica de gestão democrática e participativa das cidades. Mas as vitórias não se restringiram aos termos gerais. Com toda justiça, os movimentos populares que lutam pelo direito à cidade têm o que celebrar neste fim de ano.

Uma luta histórica do movimento de reforma urbana teve seu apogeu durante a conferência. O presidente da República em pessoa esteve no auditório para assinar a Medida Provisória 387. Esta MP estabelece o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, e determina que os recursos públicos já existentes no Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS) poderão ser acessados por associações comunitárias e cooperativas autogestionárias. Foi uma conquista difícil, pois os movimentos já reivindicavam esta medida há mais de dez anos. Anos de pressão sobre vários governos deram resultado agora, e uma revolução silenciosa se inicia.

Com esta MP, os recursos do FNHIS vão ser usados não apenas em projetos de habitação do governo, mas também da própria sociedade. É o que se chama de produção social da moradia. “Temos a expectativa de um diálogo com a Secretaria Nacional de Habitaçãopara a criação de um Programa Nacional de Produção Social da Moradia, e esperamos que já no início do ano que vem seja feita a chamada pública de projetos para que as associações e cooperativas entrem com propostas de projetos para produção social da moradia com recursos do FNHIS”, afirma Regina Ferreira, assessora da FASE e integrante do Fórum Nacional de Reforma Urbana.

“É importante destacar o reconhecimento da importância destas experiências que já acontecem no Brasil, em que movimentos organizados constroem e diminuem o déficit habitacional”. Afinal, não se trata apenas de dar casa a quem não tem. O que se quer é incrementar a organização das populações que sempre foram deixadas à margem e sem direitos, de modo que elas possam criar seus próprios mecanismos de independência e emancipação. A produção social da moradia oferece uma solução multifacetada, pois ao mesmo tempo que gera habitações de interesse social, organiza comunidades e as insere em contextos econômicos e cadeias produtivas em que elas são as protagonistas. Moradia, organização e independência econômica: a produção social da moradia se constitui, assim, como uma política pública integral e efetiva.

Uma segunda vitória sem precedentes também diz respeito à questão da moradia. O governo, também depois de muita pressão da parte dos movimentos urbanos, concordou em ceder imóveis da União que estejam ociosos para habitação de interesse social. Em várias cidades do país, a União tem edifícios inutilizados que não estão cumprindo sua função social. Na 3ª Conferência Nacional das Cidades, o governo deixou claro que agora vai disponibilizar imóveis para uso de interesse social. Mais uma boa notícia para uma sociedade que convive com um déficit habitacional de mais de 7 milhões de moradias.

Estas e outras conquistas deste movimento social organizado, que é grande e ativo em todo o país embora seja ainda pouco conhecido do conjunto da sociedade, são fruto de um processo de participação que culminou com a criação do Conselho Nacional das Cidades. Este é um espaço de participação em que juntam-se em igualdade de condições governo e sociedade para discutir as políticas públicas nacionais para as cidades brasileiras. “O processo de conferência deste ano foi organizado a partir do Conselho Nacional das Cidades.A consciência da importância deste espaço resultou em novos conselhos estaduais, como os de Rio de Janeiro, Pernambuco e Pará. Para 2008, vários conselhos estarão em funcionamento”. Bom para a cidadania e para o país, que assim tem mais uma vez a prova de que com participação cidadã problemas dramáticos, como a falta de moradia, podem ter solução mais rápida e efetiva.