10/11/2006 09:47

Fausto Oliveira

Será inaugurado no próximo dia 26 o Centro de Inteligência Coletiva Lorenzo Zanetti, no Rio de Janeiro. É um projeto do Grupo Cultural AfroReggae que conta com a colaboração da FASE. Vai ficar em Parada de Lucas, um bairro onde acontece um dos casos mais intensos de conflito urbano da cidade do Rio. É lá que uma estrutura nova de ensino e aprendizagem poderá mudar a vida de parte dos 19 mil habitantes. Batizado com o nome do educador popular que por décadas lutou pela emancipação de jovens por meio da educação, da arte e da cultura, o Centro de Inteligência Coletiva será um centro de formação e informação destinado a gerar em Parada de Lucas uma nova possibilidade coletiva cultural, técnica e intelectual.

Já em funcionamento, o Centro aguarda apenas a inauguração do dia 26 para se tornar reconhecido no país. A festa do dia 26, que deverá contar com grande repercussão midiática, terá a participação de celebridades como o ministro da Cultura Gilberto Gil e atores como Regina Casé e os comediantes do programa de TV Casseta e Planeta. No entanto, há um personagem principal: a comunidade de Parada de Lucas. Esta comunidade, castigada pelas mazelas do conflito urbano armado e pela violência policial, vai encontrar ali uma alternativa.

Já são dadas aulas de informática, capoeira, teatro, violino e cartum. Atualmente, mesmo antes da inauguração oficial, 331 moradores de Parada de Lucas recebem cursos gratuitos de segunda a sexta-feira em três turnos, de 8 às 22 horas. A primeira turma de informática já se formou com 78 alunos, num curso que oferece conhecimentos em sistema operacional e programas de uso comum em qualquer espaço profissional contemporâneo.

A habilidade do AfroReggae em construir redes, parcerias e pontes que conectam atores sociais geralmente distantes já se mostra presente no novo projeto. Um exemplo é a parceria entre o Centro de Inteligência Coletiva Lorenzo Zanetti e a editora de livros Ediouro. Além de doar livros para o centro, a editora deverá fazer lançamentos de livros no espaço. Mais uma ponto entre mundos tão distantes apesar de conviverem na mesma cidade.

Contudo, a perspectiva que dá o tom do novo espaço do AfroReggae é a da inteligência coletiva. Quantas possibilidades, potenciais, quantas habilidades e talentos não são diariamente perdidos na guerra civil fratricida entre polícia e narcotráfico no Rio de Janeiro? Por que os moradores de comunidades populares não podem se configurar em grupos artísticos e intelectuais, ou em detentores de técnicas adequadas ao panorama profissional dos dias de hoje? Um espaço que pretende ser de aprendizagem dinâmica e interdisciplinar neste tipo de local pode mostrar que nas massas populares existem pessoas capazes, hábeis, inteligentes e interessantes. Mas isso depende de uma prátioca pedagógica que reconheça os saberes inerentes ao território, as culturas e visões de mundo locais. É uma idéia que rompe com estereótipos de formação educacional, e por isso mesmo tem a virtude de dar valor à voz que vem de baixo, por meio de uma comunicação livre e horizontal.

Lorenzo Zanetti – É neste ponto que se entende porque prestar homenagem ao educador popular Lorenzo Zanetti na criação deste Centro de Inteligência Coletiva. Zanetti trabalho em seus últimos anos de vida na FASE, onde ajudou a consolidar o Serviço de Análise e Apoio a Projetos, o SAAP. Este setor da FASE é responsável por apoiar financeira e politicamente a formação de grupos populares que tenham um projeto emancipatório. Muitos destes grupos ganharam força social e se tornaram referências para seus territórios, agregando principalmente a juventude em projetos que ora enfatizam cultura, ora o trabalho, ou a educação, mas que sempre se definem por instigar no jovem a responsabildiade por seu estar no mundo.

O próprio AfroReggae, hoje conhecido internacionalmente, foi um destes grupos. Lorenzo Zanetti ajudou o grupo a se formar em Vigário Geral ainda no início dos anos 90. Ele via, com seus olhos treinados em décadas de trabalho na educação popular, o potencial deste e de outros grupos de jovens das periferias, que o poder público e as classes médias teimavam em deixar esquecidos e invisíveis. Hoje, por força de sua organização e dos princípios de inteligência coletiva, do respeito ao saber que vem de baixo, a nova cultura popular que emerge das periferias já é uma realidade inegável mesmo nos círculos mais restritos da sociedade. Dar prosseguimento e fortalecer este trabalho, pois ainda há muita discriminação e violação de direitos a corrigir, é uma tarefa heróica deste novíssimo Centro de Inteligência Coletiva Lorenzo Zanetti.