03/11/2021 11:17
Alcindo Batista e Rosilene Miliotti¹
Iniciada no último dia 31, a 26° edição da Conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas, a COP 26, acontece em Glasgow, na Escócia, e vai até o próximo dia 12 de novembro. O objetivo oficial é o fechamento do livro de regras do Acordo de Paris. Em paralelo, a atual presidência britânica da COP tenta materializar o financiamento de US$ 100 bilhões anuais para o alcance das metas e a regulação do Artigo 6 com a estruturação dos mercados de carbono e o conceito de NetZero (que promete “zerar” as emissões líquidas).
Letícia Tura, diretora executiva da FASE, argumenta que a expectativas de respostas efetivas é baixa, pois, entre os ativistas, essa COP26 já é conhecida como a das “falsas soluções”, do NetZero, do mercado de carbono e das soluções baseadas na natureza. “Mais do que uma expectativa, a FASE tem uma preocupação com essa COP porque pode significar o fortalecimento do greenwashing, a consolidação de territórios de sacrifícios, a perda da soberania de populações tradicionais e agricultores sobre seus territórios e falsas soluções baseadas na na bioeconomia”, explica.
Segundo Letícia, as verdadeiras causas da crise climática não são enfrentadas, nem os principais sujeitos. “Com relação ao Brasil, a chance dessas falsas soluções saírem mais ainda fortalecidas diante de um contexto de retrocesso, de ataque à direitos, da flexibilização de legislação ambiental e da fragilidade dos direitos territoriais é preocupante. A desregulação e a falta de transparência tanto do estado quanto das grandes corporações tem crescido muito”, analisa
FASE nas COPs
O evento deste ano conta com a presença de ativistas e personalidades do campo ambiental e climático do mundo todo, entre eles os brasileiros do Grupo Carta de Belém, o Instituto Socioambiental (ISA) e a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ). A FASE está representada por Maureen Santos, coordenadora do Grupo Nacional de Assessoria (GNA). O presidente do Brasil, país com a segunda maior delegação, não irá ao evento.
A presença da FASE nas COPs vem de longe, e ficou mais ativa em 2008, a partir do debate da justiça climática. Desde então, a organização esteve presente em quase todas as COPs. Em 2009, a instituição passou a fortalecer a incidência e participação do Grupo Carta de Belém.
A motivação da organização para entrada no debate do clima foi o reconhecimento da questão ambiental como estruturante do modelo de desenvolvimento, não percebendo como uma questão acessória. “Ela é estruturante assim como o racismo e as desigualdades de gênero. A FASE percebeu a questão ambiental como estruturante do modelo de produção e consumo, gerador de desigualdades ambientais. Então, reconhecendo o problema e percebendo como estruturante, começamos a atuar a partir do enfrentamento das desigualdades ambientais, do racismo ambiental para promoção da justiça ambiental. Assim, trabalhamos a importância de levar a defesa dos direitos e o combate às desigualdades para o debate climático, pois o debate do clima é uma grande arena de discussão sobre o modelo de desenvolvimento, dos modos de produção e de consumo”, destaca Letícia.
A questão ambiental é um tema que a FASE atua desde os anos 1990, principalmente a partir da ECO92, e as COPs tornaram-se um grande fórum internacional onde organizações da sociedade civil têm discutido os impactos socioambientais do modelo de desenvolvimento, dos mecanismos internacionais e reivindicado políticas públicas estruturantes. A FASE entra nesse debate identificando os problemas do mercado de carbono e outros mecanismos financeiros, sobre os territórios de povos tradicionais, camponeses, quilombolas e periferias urbanas e busca visibilizar o papel dessas populações na conservação ambiental e na construção da disputa por alternativas ecológicas que garantam qualidade de vida, soberania alimentar e territorial.
Destaques das COPs
Letícia destaca a participação da FASE em quatro grandes COPs. Para ela, as COP15, 20, 21 e 25 foram marcantes em relação à mobilização e articulação da sociedade civil. “Em Copenhague, a FASE fez um grande investimento e foi a primeira vez que fomos como membro da delegação brasileira. Nesse ano também foi lançado o Grupo Carta de Belém e realizamos várias atividades no fórum paralelo e, ao final, fizemos uma grande manifestação, uma das maiores ou a primeira grande manifestação da sociedade civil nos espaços da COP, que chegou até o local da própria COP. Pela primeira vez conseguimos dar visibilidade a esse ponto de vista contrário sobre o mercado de carbono e todas essas falsas soluções com relação às mudanças climáticas”.
Em seguida, na COP20, em Lima, ela cita as dificuldades em construir a Cúpula dos Povos frente ao câmbio climático. “Foi um momento importante de articulação dos movimentos latino-americanos pós Rio+20”. Na COP21, onde se estabeleceu o Acordo de Paris, Maureen destaca que “foi um momento importante, não só para mostrar que o regime multilateral ainda tinha fôlego, quanto para demonstrar que a sociedade civil global conseguia, apesar das diferenças, fazer grandes demonstrações de força política ocupando as ruas”.
Por fim, em Madrid, a COP25, onde já havia um grande embate em torno do Artigo 6º do Acordo de Paris (do que trata do financiamento), o Grupo Carta de Belém lançou a segunda Carta contra os Offset Florestais. “Tivemos intensa participação nas atividades do fórum paralelo da sociedade civil, realizamos atividades contra o tratado Mercosul-União Europeia e de denúncia sobre os retrocessos socioambientais que estavam acontecendo no Brasil”.
[1] Estagiário, sob a supervisão de Claudio Nogueira, e jornalista da FASE.