20/04/2018 18:59
Desde o início da implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que as comunidades tradicionais, povos indígenas e comunidades quilombolas tem encarado dificuldades de acesso ao sistema de cadastramento¹, seja pela ausência de apoio técnico para georreferenciamento dos territórios coletivos, ou em razão de não haver plataforma de inscrição adequada para grupos étnicos, o chamado módulo Povos e Comunidades Tradicionais – PCTs, do Sistema Nacional de CAR. As comunidades são pressionadas ainda pelo exíguo prazo de cadastramento fixado para 31 de maio de 2018.
As poucas comunidades que conseguiram se inscrever no SICAR agora enfrentam obstáculos da chamada fase de analise e validação dos cadastros. Nesta fase, os órgãos ambientais de cada Estado devem verificar, dentre outros quesitos, as sobreposições detectadas no sistema.
Em março deste ano, a Naturantins, órgão ambiental do Tocantins, notificou comunidades quilombolas para apresentação de documentos comprobatórios de propriedade sob pena de, não o fazendo, terem seu CAR cancelado. A Naturantins efetuou tal notificação mesmo sendo incompetente para verificação de validade de documento fundiário. Além disso, o órgão acatou documento de fazendeiro com 1.000 hectares sobrepostos ao Território Quilombola, tornando o fazendeiro habilitado para acesso a crédito, plano de manejo, supressão da vegetação e licenciamento ambiental rural.
Em tal caso no Tocantins, é evidente a expressão de racismo ambiental na implementação do CAR, privilegiando os fazendeiros e marginalizando as comunidades negras, violando assim o território, que é direito constitucional Quilombola (art. 68 do Ato de disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal) e o direito à autodeterminação das comunidades quilombolas, previsto na Convenção 169 da OIT.
Denunciamos publicamente esse caso para que medidas sejam tomadas a fim de garantir o devido cadastramento dos territórios quilombolas. Ressaltamos que, atuando desta forma, contrariando direitos territoriais, o Estado brasileiro não cumpre com os compromissos firmados frente `a comunidade internacional para proteção do meio ambiente e da sociobiodiversidade.
Publicamos para ampla divulgação a Denuncia Cadastramento Quilombola Naturantins sobre o presente caso e a cartilha “CAR: Pra quem? Pra quê?”, que apresenta perguntas e respostas pertinentes sobre a implementação do CAR.
CAR para quem? Pra quê?
A publicação foi elaborada a partir das dúvidas que surgiram em atividades realizadas pelo Grupo Carta de Belém junto a comunidades pelo Brasil. Esse material é produzido com base em uma pesquisa técnica realizada pela advogada popular Larissa Packer e pelos pesquisadores Carlos Frederico Marés, Katya Isaguirre, Marcela Vecchione, Juliana Santilli e Eliane Moreira. Além de representantes de comunidades quilombolas, a cartilha representa o acúmulo de discussões feitas em atividades de formação sobre o CAR realizadas com agricultores familiares, camponeses, povos indígenas, dentre outros povos e comunidades tradicionais.
[1] Nota e publicação do Grupo Carta de Belém, do qual a FASE é parte.