14/06/2016 18:17
Rosilene Miliotti¹
A partir da parceria da FASE com o Cirque Du Soleil, foi criado o projeto Circo do Mundo, uma iniciativa de fomento ao circo social. A Rede Circo do Mundo existe há 16 anos e reúne 20 instituições divididas em quatro regiões do país (Centros de Referência) – exceto na região norte. Cerca de 12 mil crianças, adolescentes e jovens participam das aulas de prática da arte circense, onde é trabalhada a inclusão, a oportunidade de geração de renda e a formação de novos artistas. “Essas instituições tem um impacto muito grande nas suas cidades e principalmente nas comunidades onde atuam”, comenta Fatima Pontes, coordenadora executiva e artística da Escola Pernambucana de Circo.
Cleia Silveira, coordenadora do Serviço de Análise e Assessoria a Projetos (SAAP/FASE), assessora o colegiado nas discussões políticas. “Criamos um programa de formação de educadores junto ao Cirque Du Soleil e a Rede resolveu investir nesse jovens para que se tornem líderes da formação e por isso estamos fazendo uma formação mais política”, ressalta. Entretanto, Cleia lembra que a rede é composta por instituições que têm uma singularidade, mas na Rede essa individualidade diminui para fortalecer os objetivos comuns, se manter como esse sujeito político e com uma visão crítica ao que é hegemônico.
O objetivo da formação promovida pela FASE é a construção do projeto político-pedagógico da Rede. “Queremos fortalecer ainda mais esses Centros porque nossa formação não é somente de técnica circense, mas também política”, explica Fatima. Para ela, é muito importante fazer essa discussão sobre o contexto do país e construir projetos junto com os jovens. “Conversar sobre a conjuntura e construir um projeto sem perder a essência do que somos e o que queremos com a arte e a educação na perspectiva de um mundo mais justo e igualitário para todos nós é o desafio, e esse encontro é para isso”, disse. Participaram da formação educadores da Escola Pernambucana de Circo, do Circo Laheto, da Associação Londrinense de Circo (ALC) e da Instituição de Incentivo a Criança e ao Adolescente de Mogi Mirim (ICA).
Para o educador e artista de circo Luiz Gustavo Alves Moreira, da ALC, o mais importante para sua atuação com as crianças são os assuntos relacionados à política e dialogar sobre como abordar esse tema com eles. “Não só o jovem, mas toda a sociedade tem dificuldade ou não gosta de falar sobre política. As pessoas não têm noção do que essas intervenções políticas irão trazer para a vida delas, o que isso pode ocasionar no cotidiano, na economia. Precisamos falar mais sobre política”, explica. Luiz ressalta que o trabalho para ele é um desafio, já que “a região sul é extremamente conservadora”. “Nos últimos três mandatos, a cidade de Londrina (PR) teve prefeitos que assumiram e foram cassados. Nós, educadores, temos que ter muito jogo de cintura para levantar o debate de forma crítica, sair do senso comum e fortalecer argumentos”, expôs.
Durante o encontro, o atual cenário econômico do país também foi pautado. “Discutimos como cada instituição está realizando suas atividades porque todos nós estamos diminuindo o atendimento e as equipes, porque não tem como mantermos as estruturas culturais e de pessoal nessa situação do atual governo. A crise impacta até nas famílias que atendemos. Não podemos ficar alheios a isso e precisamos nos organizar”, concluiu Fatima.
As próximas formações serão em julho, em Goiânia (GO) e em Mogi Mirim (SP).
Tradicional X Social
Para quem não sabe a diferença de circo tradicional para o circo social, Fatima explica que o circo social trabalha para potencializar a capacidade que as crianças e os adolescentes já têm e não sabem. “O circo social é uma ferramenta pedagógica para o descobrimento das capacidades, do trabalho coletivo, do cuidar do corpo (não como um culto ao corpo, mas cuidar de si mesmo). E depois de muitos anos de trabalho, o circo tradicional reconheceu que o que fazemos é sim circo, é arte circense. Os jovens que estão se formando nas escolas de circo social têm fomentado muito a nova estética no circo. O circo social quer influir nas políticas públicas para a arte, a educação, a cultura e para a juventude”, afirma.
FASE e circo, tudo a ver
Você pode estar se perguntando “o que a FASE tem a ver com o circo?”. Nós explicamos. No início dos anos 1990, a FASE, junto com o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), o Instituto de Estudos da Religião (Iser) e o Instituto de Ação Cultural (Idac), realizou uma pesquisa com crianças, adolescentes e jovens em situação de rua com objetivo de verificar a realidade dessa população no Rio de Janeiro. Mas os pesquisadores tinham dificuldades na abordagem. Depois de experimentar várias metodologias, a equipe descobriu que o circo era a linguagem que possibilitaria a aproximação. Acabado o processo, a equipe criou a instituição “Se Essa Rua Fosse Minha”.
Cleia explica que o coordenador do SAAP à época levou uma proposta ao Cirque du Soleil e lá foi criado o projeto “Circo do Mundo”. A experiência teve início no Brasil. “A FASE articulou os grupos populares que trabalhavam com a arte do circo no país. No ano 2000, fizemos um seminário chamado ‘Circo Educando Com Arte’, em Belo Horizonte (MG), e criamos a Rede de Circo Social. O nosso papel é fomentar essa rede e fazer com que esses grupos se tornassem um sujeito político. Traçamos uma estratégia nacional de participar das Câmaras Setoriais e do Conselho Nacional de Cultura (CNC) e conseguimos que o circo social tivesse um assento nesses espaços políticos. Essa Rede, como sujeito político, foi abrindo caminhos. Em 2004, fizemos um grande encontro de todos esses grupos. E, assim, a FASE deixou o lugar de centralidade e a Rede se constituiu como uma rede de verdade, com vários núcleos e lideranças”, conclui.
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[1] Jornalista da FASE.