Júlia Motta
26/06/2023 17:48

A Assembléia Legislativa do Rio (Alerj) realizou a Audiência Pública dos Atingidos por Desastres Socioambientais, no dia 23 de junho, para discutir políticas públicas de prevenção e enfrentamento às mudanças climáticas. O coordenador da FASE Rio, Aercio Barbosa de Oliveira, foi um dos convidados para compor a mesa de debates.

O evento foi promovido e mediado pela deputada Dani Monteiro (PSOL), também presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania (CDDHC) da Alerj. Também foram chamados Alexandre Pessoa, sanitarista pela Fiocruz; Ana Luísa Coelho, pesquisadora da UFRJ; Mônica Cunha, vereadora pelo PSOL; Rita Passos, pesquisadora pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ, o deputado federal Tarcísio Motta (PSOL-RJ) e a professora Ana Kezia da Silva, também da UFRJ.

De acordo com Dani, quem mais procura pela Comissão são as vítimas de desastres ambientais. Essas pessoas têm determinada cor, renda e lugar. “São pretos, pobres e favelados”, atesta Rita Passos, ressaltando a importância de racializar o debate. Ela também chama a atenção para a importância de apontar os responsáveis pelo racismo ambiental. “Porque senão a gente fica falando só da ponta, né? E aí não tem nenhuma efetividade na mudança das condições. É importante que a gente veja a dimensão política, porque o racismo está no âmbito dos direitos coletivos, ele afeta sempre uma coletividade e sempre alguém comete esse crime”, diz. 

Alexandre Pessoa, da Fiocruz, discute o preparo do estado do Rio de Janeiro para enfrentar as fortes chuvas com as mudanças climáticas. Ele relembra as manifestações da Greve Geral pelo Clima que aconteceram nas favelas do Jacaré e Manguinhos, em março de 2023, e reforça que elas aconteceram porque as populações já sabem das previsões. “Os moradores do Rio de Janeiro não precisam da informação do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) porque elas já sofrem na pele”. O pesquisador também cobra o Plano Estadual de Segurança Hídrica do Governo do Estado, “engavetado e formalizado”, e alerta que “ou o Rio de Janeiro está preparado para as inundações ou ele não está preparado para sobreviver”.

Aercio, representando a FASE, levou para o debate a apresentação de propostas, com base em projetos já realizados pela instituição. Ele usa como exemplo o Projeto de Macrodrenagem na Baixada Fluminense, implementado entre 2007 e 2012. A iniciativa consistia em desassorear os rios da região, que há décadas sofre com as enchentes. O projeto foi bem sucedido ao reduzir consideravelmente o número de desastres. “Eu destaco, então, o quanto a reedição de um projeto como esse seria importante para preservar e garantir uma vida digna àquela população.”

Em 2012, o projeto precisou ser interrompido devido a falta de recursos dos governos federal e estadual. Por isso, o coordenador também reforça que, para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas, é preciso enfrentar a distribuição de recursos públicos. 

O debate da mesa de pesquisadores finalizou com a fala da pesquisadora Ana Kezia, com foco no município de Caxias, que sofre com diversos problemas hídricos. Ela também apontou propostas de enfrentamento às enchentes, apresentando o projeto desenvolvido na pós-graduação em Urbanismo na UFRJ. Intitulado “Parque do Campo do Bomba”, foi pensado através do conceito de “cidade esponja”, ou seja, uma cidade que absorve água. Ele se encontra engavetado na Alerj, e a pesquisadora cobra que ele volte à votação. “Então vamos fazer Caxias se tornar o primeiro Parque Ecológico da Baixada Fluminense, o primeiro Parque Esponja da nossa cidade. Por que não?”, propõe a professora.

A audiência pública seguiu com a participação dos atingidos pelos desastres ambientais. Jonathas Marinho, do Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis, sofreu com a perda da irmã em uma das enchentes no município. Ele diz que quando escuta de estudiosos que Petrópolis foi a primeira cidade planejada, ele questiona: “planejada para quem?”. Enquanto o centro foi organizado para receber a elite, a população pobre, preta e trabalhadora precisa sobreviver em “territórios e ambientes possíveis”, define ele. “Territórios frágeis ambientalmente”, que são vítimas de “desastres criminosos, ‘desnaturais’”. Ele também relata sobre o sentimento de pânico e ansiedade que cresceu entre a população depois das chuvas de 2022. “Não existe acolhimento ou tentativa de conversar e tentar realocar as pessoas em ambiente possíveis”, diz.

Fábio Monteiro, da Comissão de Meio Ambiente de Manguinhos, leva o foco do debate para a “outra ponta”, de quem causa e ganha com os desastres ambientais. “Não podemos só falar de quem tá perdendo com os desastres, mas também de quem tá ganhando com eles”, protesta. Segundo Fábio, as políticas públicas favorecem esse cenário, “porque a partir do momento que a Cedae é privatizada, tem empresa ganhando com isso”, complementa.

A audiência pública completa pode ser assistida neste link.

*Estagiária de Comunicação da FASE