12/05/2015 11:53
As críticas e a construção de alternativas ao atual modelo de desenvolvimento têm perpassado as diversas frentes de trabalho da FASE. Agora, dois novos volumes da série Caderno de Debates dão mais força à temática: “Cidades, Indústrias e os Impactos do Desenvolvimento Brasileiro”, que convida a ver de perto a realidade de diferentes territórios do país, e “BRICS: Tensões do Desenvolvimento e Impactos Socioambientais”, que relaciona o assunto à orientação do bloco econômico e político formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
Evanildo Barbosa, diretor da FASE, destaca que as duas publicações problematizam as consequências do atual desenvolvimento a partir da perspectiva do “urbano alargado”, ou seja, considerando as cidades em seus contextos e em conexão com temas estrategicamente necessários, como é o caso da promoção de justiça ambiental. “Trata-se de uma perspectiva que indique uma ruptura, pelo menos simbólica, com uma visão estreita e historicamente difundida sobre o urbano clássico no Brasil”, pontua.
Segundo ele, políticas setoriais como as de saneamento, moradia, transporte, dentre outras “ensimesmadas nos acúmulos da reforma urbana desde a Constituição de 1988”, seguem sendo importantes diante do precário estado das cidades. Porém, destaca que elas estão ainda hoje ancoradas numa visão de cidade metropolitana das regiões sudeste e sul. Nesse sentido, desconsideram, muitas vezes, as características das cidades da floresta, do cerrado, do semiárido, como exemplos, ou mesmo as pequenas e as médias cidades no geral, que requerem tratamentos distintos.
Além disso, Evanildo ressalta que as políticas urbanas em curso no país são funcionais a um modelo de desenvolvimento “subordinado à lógica de ampliação exponencial do lucro para os grandes conglomerados, o que faz com que certas regiões das cidades sejam tão atrativas para o capital imobiliário, de Norte a Sul do Brasil”. Nos Cadernos de Debates, o urbano não é somente pensado como reflexo, mas como um dos maiores propulsores do atual modelo de desenvolvimento econômico.
Desenvolvimento brasileiro
O texto de apresentação do Caderno de Debates 3 é de Marilene de Paula, da Heinrich Böll Brasil, fundação que apoiou sua elaboração. “É possível perceber que a ideia de desenvolvimento hoje pouco se relaciona com justiça social, bem estar e autonomia individual e coletiva”, destaca ela. Os sete artigos seguintes questionam a “aceleração do crescimento” como solução para as desigualdades, dando atenção a temas como a realização de megaeventos esportivos, a construção de megaempreendimentos e a exploração de bens naturais. Além de Evanildo, Joana Barros, assessora da FASE, e Lívia Duarte são organizadoras da publicação.
Aercio de Oliveira, coordenador da FASE no Rio de Janeiro, contextualiza em seu artigo a ideia de progresso ao longo dos tempos, chegando à atualidade brasileira. Já Heitor Scalambrini Costa, professor da UFPE, Luiza Marillac, do Fundo SAAP, e Rosimere Peixoto, da FASE em Pernambuco, descrevem os impactos do Complexo Industrial Portuário de Suape, que fica a 40 quilômetros de Recife. Enquanto ele fez um panorama das violações, elas aprofundaram os conflitos específicos na vida de mulheres pescadoras.
O machismo também é debatido a partir do texto de Maíra Kubik Mano, que argumenta que a Copa do Mundo e as Olimpíadas tornam mais agudas as situações de desigualdade de gênero. Em outro artigo, Daniel Santini, da Repóter Brasil, demonstra como a construção civil se tornou o setor com mais casos de trabalho escravo no país. Já Cláudio Luiz Zanottelli, professor da UFES, descreve a cadeia de petróleo e impacto na região metropolitana de Vitória, onde se instalam complexos portuários em função das descobertas do pré-sal e da alta do “ouro negro”. E Julianna Malerba e Guilherme Carvalho, ambos da FASE, debatem os direitos territoriais e a expansão da exploração mineral sobre a Amazônia.
BRICS e o desenvolvimento
Ao lado de Anelise Gutterres, Evanildo e Joana organizaram o Caderno de Debates 4, que contou com o apoio das fundações Rosa Luxemburgo e Ford, e terá uma edição digital em inglês. “Se de um lado o protagonismo do Brasil é visto positivamente por setores da sociedade mais entusiastas da entrada do país no bloco como estratégia política de contra–hegemonia, esse mesmo protagonismo é visto por setores, e entidades e ativistas latino- americanos e pan-africanos – como uma possibilidade “neoimperialista”, o que confere grande complexidade ao debate e o enriquece de análises que transcendem ao universo stricto sensu econômico da cooperação”, destacaram na apresentação.
Na sequência, um texto do professor da UFRJ Pedro Cláudio Cunca Bocayuva demonstra que as definições dos BRICS estão ligadas às expectativas em torno de uma massa de consumidores dentro e fora das fronteiras nacionais, o que faria do bloco uma “metáfora da globalização”. Patrícia dos Santos Pinheiro e Sérgio Botton Barcellos também abordam o tema, mas a partir de uma análise da cooperação internacional na África.
Amita Bhide, professora e ativista indiana, participa com um artigo sobre os violentos deslocamentos urbanos em seu país. Já a exploração de minérios recebe atenção em outros dois textos: um de Tádzio Peters Coelho sobre os impactos das atividades da Vale no Pará; e outro sobre a exportação de violações de direitos humanos na América Latina e na África por transnacionais brasileiras, elaborado pela Justiça Global.
Os investimentos chineses no setor energético brasileiro, as ilegalidades em licenciamentos de hidrelétricas na Amazônia e a violações de direitos indígenas também recebem atenção no texto de Verena Glass. O caderno ainda traz dois ensaios fotográficos: um com impressões sobre o acelerado ritmo de urbanização da China, feito por Lívia Duarte; e outro com os contrastes de um grande empreendimento na costa do Espírito Santo, elaborado pela FASE.
* Se tiver interesse nas versões impressas, entre em contato com a FASE pelo correio eletrônico comunicacao@fase.org.br.