24/04/2006 12:49

A segunda edição do Fórum Social Brasileiro aconteceu de 20 a 23 deste mês em Recife. Durante estes quatro dias, uma versão compacta da mesma vibração e entusiasmo verificados em qualquer dos Fóruns Sociais Mundiais podia ser sentida nas salas, auditórios e áreas abertas da Universidade Federal de Pernambuco. Praticamente todos os movimentos sociais brasileiros e muitas ONGs, fóruns e redes estavam presentes. Além disso, como era esperado num ano eleitoral, quase todos os partidos políticos que vão disputar os votos da camada progressista da sociedade marcaram presença, embora não tenham conseguido transformar o FSB em uma arenga eleitoral. Em corações e mentes de todos e todas que participaram do também chamado Fórum de Abril, ficou registrada a disposição para a luta por avanços cada vez mais profundos em uma longa lista de questões em que o Brasil ainda está distante de se apresentar como país justo e democrático.

O FSB começou, como é já tradicional nos fóruns sociais em todo o mundo, com uma marcha pelas ruas de Recife. Isso aconteceu no dia 20, quinta-feira da semana passada. Pelo menos cinco mil pessoas se reuniram na Praça do Derby. O espetáculo de participação social do povo pernambucano era evidente. Escolas, bandas de música, grupos de estudantes uniformizados para desfile, grupos de maracatu e outras agremiações davam um colorido regional interessante à marcha. Que, de resto, trazia estampadas as bandeiras e faixas já conhecidas dos movimentos sociais. Tudo ia bem até que um desentendimento entre a Polícia Militar e os militantes do MST por pouco não termina em tragédia. Num ato de completa imprudência, um soldado disparou contra a multidão e acertou a mão do coordenador regional do MST Jaime Amorim. Com o pânico gerado pelo tiro, um grupo de militantes reagiu e espancou um policial, que foi socorrido por seus colegas. A lamentável violência acabou por dar clima de medo a uma festa de cidadania que até então transcorria com tranqüilidade e animação.

Os dois dias seguintes testemunharam novamente a sede de debate da parcela organizada da sociedade brasileira. Em salas e auditórios da universidade, em teatros no centro da cidade ou em áreas abertas, as atividades do FSB estavam sempre cheias. Dentro da programação política, mas fora do formato tradicional debate, a Jornada Cultural deu ao fórum a verve da juventude que faz arte sem se preocupar com a indústria cultural: foram várias apresentações de todos os gêneros e linguagens artísticas, sempre gratuitas e com ótima resposta do público. (Sobre a Jornada Cultural, leia matéria nesta edição). Além disso, uma rádio foi montada na universidade para cobrir o Fórum Brasileiro. Produzida por uma ONG de Pernambuco, a Rádio Mulher fez transmissões ao vivo por várias horas ao dia, alcançando toda a Zona da Mata, em torno de Recife. Pela Internet, a rádio disponibilizou parte de sem material gravado e escrito, e fazia circular também o áudio ao vivo, para quem quisesse ouvir pela rede de computadores.

Ao final, como também já é tradição, o Fórum teve a Assembléia dos Movimentos Sociais. É um ponto de encontro de movimentos de todo tipo. Estavam todos lá: rurais, urbanos, de gênero, de ação afirmativa, por categorias profissionais, de direitos de minorias etc. A tarefa que a assembléia de impôs neste segundo FSB foi ambiciosa, aprovar um documento que propusesse um programa para o Brasil. E conseguiram. Chamado provisoriamente de Projeto Brasil, o documento pretende ser um paradigma da vontade popular para as eleições, mas, segundo as lideranças que conduziam a assembléia, apesar de útil no período eleitoral, o Projeto Brasil deve ser adotado como uma plataforma permanente.

“Esse documento não é para as eleições de outubro, é uma plataforma que vai orientar os movimentos pelos próximos períodos”, disse ao Fase Notícias João Paulo Rodrigues, coordenador do MST. “Não queremos entregar este projeto a nenhum candidato, ele é uma exigência da sociedade brasileira a quem quer que seja”, afirmou Antonio Carlos Spis, da CUT e da Coordenação dos Movimentos Sociais. Julia Di Giovanni, da Marcha Mundial das Mulheres, concorda. “Ao longo dos próximos meses, vamos ter que conviver com o debate eleitoral, mas é importante que a unidade dos movimentos seja construída com uma perspectiva maior”, disse.