25/03/2022 12:31

 

 

 

Alcindo Batista e Samis Vieira*

No início de março, cerca de 15 agricultores agroextrativistas participaram de um intercâmbio para trocas de saberes em manejo florestal na comunidade Terra Preta dos Vianas, no projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Lago Grande, em Santarém, no Pará. O encontro foi promovido pela FASE com o objetivo conhecer iniciativas de sistemas agroflorestais (SAF) implantadas em áreas de capoeiras sem o uso do fogo. A ideia foi criar um espaço reflexões sobre os modos de vida desses produtores e enriquecer ainda mais os seus conhecimentos sobre o planejamento, implantação e manejo de quintais produtivos, viveiros de mudas e os circuitos de comercialização, ajudando a gerar renda às comunidades para recuperação e conservação da floresta.


Grupo de agroextrativistas no “Intercâmbio de Trocas de Saberes em Manejo Agroflorestal” na comunidade Terra Preta dos Vianas, no PAE Lago Grande, em Santarém, Pará

Também apoiaram esta ação a Federação das Associações de Moradores e Comunidades do Assentamento Agroextrativista da Gleba Lago Grande (FEAGLE), o Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (STTR) e o Grupo Mãe Terra, por meio do Projeto Amazônia Agroecológica, com auxílio do Fundo Amazônia. Os agricultores e agricultoras puderam contar um pouco sobre as metodologias usadas nos seus territórios, passando pela escolha do local, o preparo da área, seleção de sementes e mudas de acordo com o solo, o manejo da matéria orgânica, calendário agrícola e técnicas de plantio.

Fazer agricultura tradicional sem o uso do fogo tem estimulado o debate entre os produtores rurais, pois ele é usado no preparo das áreas e para fertilizar a terra, através das cinzas, o que favorece diretamente o bom desenvolvimento das plantas. Portanto, práticas tradicionais de manejo por meio da valorização do conhecimento e o respeito aos princípios agroecológicos e culturais são ações que tem contribuído para o fortalecimento de grupos locais na disseminação das agroflorestas no território.

Grupo de agroextrativistas no “Intercâmbio de Trocas de Saberes em Manejo Agroflorestal” na comunidade Terra Preta dos Vianas, no PAE Lago Grande, em Santarém, Pará. Foto: Samis VieiraA manutenção da floresta em pé tem um papel importante na regulação do clima e na conservação da biodiversidade de animais, plantas e microrganismos. Estimular a diversificação produtiva como estímulo à segurança alimentar e geração de renda, a melhoria do manejo dos agroecossistemas, visando o uso sustentável do solo, a redução do desmatamento e o aumento da agrobiodiversidade de comunidades e povos tradicionais são alguns dos objetivos dos Sistemas Agroflorestais.

Mateus Farias, 65 anos, morador da comunidade Castanhalzinho, conta que nunca se viu no assentamento plantar mandioca e banana sem ser por meio de queimadas. “O que chama mais atenção dessa prática é que numa simples área de capoeira podemos semear uma diversidade de espécies frutíferas e florestais. Outra coisa é a forma como as plantas crescem bonitas igual nas áreas queimadas”, diz.

Dos puxiruns de saberes

Fortalecer o trabalho coletivo através dos puxiruns é uma prática ancestral realizada por comunidades e povos tradicionais, cujo objetivo é fortalecer o sentido comunitário, trabalho coletivo e ajuda entre as famílias. Esta tem sido de fundamental importância para multiplicação de conhecimentos em sistemas agroflorestais, a fim de viabilizar o preparo e plantio das áreas no lote de outras famílias.

Grupo de agroextrativistas no “Intercâmbio de Trocas de Saberes em Manejo Agroflorestal” na comunidade Terra Preta dos Vianas, no PAE Lago Grande, em Santarém, Pará. Foto: Samis Vieira

A comunidade Terra Preta dos Vianas tem sido referência na partilha de experiências agroflorestais, estimulando a percepção e compreensão das práticas por meio da implantação de áreas em diversos contextos de acordo com as particularidades de cada agricultor e agricultora. Janete Nogueira, primeira a plantar quem queimar a terra na sua região, por exemplo, conta que a implantação dos áreas livres dos fogaréus gerou muita curiosidade entre os seus familiares, tendo em vista que a prática ainda não é comum na região.

Outro ponto que chamou a atenção foi o tratamento das mudas de banana, que vai desde a escolha das mudas, o corte das raízes e a cicatrização da planta com as cinzas para evitar a entrada de bicho e o corte do tronco, deixando somente a batata. “Quando as covas foram abertas para o plantio da banana e depois jogada um monte de troncos, galhos e folhas em cima gerou muita desconfiança, mas depois de um mês quando a primeira brotou, vimos que a técnica dava certo”. “O que nos deixa mais feliz é poder compartilha nossa história e motivar outros agricultores sobre essas técnicas”, conclui.

Grupo de agroextrativistas no “Intercâmbio de Trocas de Saberes em Manejo Agroflorestal” na comunidade Terra Preta dos Vianas, no PAE Lago Grande, em Santarém, Pará. Foto: Samis Vieira

Durante as oficinas de capacitação foi implantado um sistema uma iniciativa, que serve como base para práticas de manejo, lições e aprendizados, bem como realizado a implantação de sete áreas por meio da multiplicação de conhecimentos no lote de outras famílias. Segundo Samis Vieira, educador do programa da FASE na Amazônia, “os puxiruns são um espaço de troca de saberes que propiciam a construção de conhecimentos coletivos a partir da vivência e do trabalho prático participativo para estimular a percepção e compreensão das agrofloresta, onde cada família aprende com os erros e acertos, diz. Samis comenta ainda que a cooperação transcende a mão de obra e contribui para a construção da autonomia das prática de manejo, fortalecimento dos vínculos solidários e a união entre as famílias.

*Alcindo é estagiário, sob supervisão de Claudio Nogueira; Samis é educador da FASE Amazônia