17/01/2020 11:56
Yndara Vasques¹
Após devolução pelo Ministério Público Federal do inquérito à Polícia Federal no caso que envolve o assassinato e do atentado contra à vida dos indígenas Guajajara no Maranhão por questões burocráticas, a Defensoria Pública da União (DPU) atuará junto ao MPF e à Justiça Federal para eu o caso permaneça sob competência da Justiça Federal. A DPU defende que há conflito histórico e violento na terra indígena Araribóia, no município de Amarante do Maranhão.
“Há envolvimento sim e envolvimento extremamente intenso de interesses coletivos indígenas Guajajara, pois, a violência que vitimou Paulo Paulino Guajajara e atentou contra a vida do Laércio Guajajara tem relação direta com o conflito histórico e violento na terra indígena Araribóia”, afirmou Yuri Costa, Defensor Público da União e que exerce a função de Defensor Regional de Direitos Humanos no Maranhão.
O inquérito foi devolvido à Polícia Federal na última segunda-feira (13), pois o Ministério Público Federal verificou que nem todas as provas referidas no relatório foram juntadas aos autos. A DPU acredita que ainda esta semana o processo retorne ao MPF com a integralidade das provas, momento em que a DPU e o MPF poderão fazer todas as manifestações. “Atualmente a análise sobre os fatos e as provas produzidas não serão comentadas porque a natureza do inquérito é sigilosa”, explicou Yuri Costa.
A principal contestação da Defensoria Pública da União é em relação à conclusão da Polícia Federal, que entendeu que não há crime étnico na emboscada que resultou no assassinato do Paulino Guajajara e atentou contra a vida do Laércio Guajajara, em novembro de 2019 na terra indígena Araribóia no Maranhão. “Eles ignoram que não há envolvimento de interesses coletivos indígenas”, afirma o defensor público. Caso prospere a tese da não existência de direitos indígenas violados e tal entendimento seja acolhido pelo MPF e pela Justiça Federal, o caso passará para competência da Justiça Estadual sendo a apuração dos fatos realizada pela Polícia Civil.
Tanto o Paulino quanto o Laércio Guajajara eram Guardiões da Floresta, um grupo voltado a autoproteção da terra indígena Araribóia formado pelos próprios indígenas e reconhecidos pelo Estado Brasileiro: FUNAI, Instituto Chico Mendes e pela Polícia Federal. Naquele 01 de novembro de 2019, defende a DPU, houve invasão por não indígenas da terra Araribóia. Os invasores praticaram atividades ilícitas na região como a caça e a extração de madeira assim como acontece em um histórico de mais de 40 anos. É sabido também que, por conta da atuação dos Guardiões, os indígenas têm recebido ameaças. Nos últimos vinte anos, o Conselho Indigenista Missionário do Maranhão (CIMI) registrou o assassinato de pelo menos 47 indígenas do povo Guajajara, sendo 18 da TI Araribóia.
Naquele dia (01/11/2019), “os indígenas adotaram providências quando perceberam a invasão dos não indígenas. Não há outra forma de interpretar o conflito e a violência que vitimou os indígenas que não passando por interesse maiores da etnia no caso dos Guajajara. Essa e a linha de raciocínio que a DPU vai tentar conduzir no processo”, defende Yuri Costa.
Criminalização dos Indígenas
A mesma linha de raciocínio é defendida pela Ordem dos Advogados do Brasil, por meio da Comissão de Direitos Humanos (CDH) e pelo CIMI. Outro exemplo apresentado pelo presidente da CDH da OAB/MA, advogado Rafael Silva, está relacionado com o massacre dos Gamella, ocorrido em maio de 2017 na Baixada Maranhense. Ele alerta que “há casos emblemáticos investigados pela PF em que os indígenas vitimados acabam sendo criminalizados de alguma forma no inquérito policial. Isso vem ocorrendo em relação aos indígenas Gamella e já ocorreu em outros casos. O que pode representar um grave padrão de investigação policial que descontextualiza as violências do histórico de violações reiteradas aos indígenas e os transfigura, equivocadamente, em algozes”. O inquérito dos Gamella nunca foi concluído e hoje contabiliza mais de 400 páginas. O presidente da CDH da OAB/MA faz um alerta: “a construção do documento é direcionada para a criminalização do povo, negando inclusive a identidade indígena dos Gamella”. Naquele caso, o CIMI e a Comissão Pastoral da Terra ingressaram com Habeas Corpus para retirar do inquérito policial, as peças discriminatórias acerca do povo indígena Gamella.
No caso do inquérito policial dos Guajajara, as instituições alegam que foram ouvidas pessoas que não estavam no local do crime. Esses depoimentos foram utilizados contra os indígenas. “Uma análise dos últimos cinco anos dos casos emblemáticos em que indígenas foram vítimas de violências e como foi realizada a investigação pela Polícia Federal faz-se necessária” defende Rafael Silva.
Período eleitoral em 2020 tende a piorar a situação na terra indígena Arariboia
A extração de madeira no território Araribóia também foi denunciada pela comunidade indígena Guajajara. Situação que, segundo o Guardião Auro Carvalho Guajajara, tende a piorar com a chegada do período eleitoral e com o término da operação da Força Nacional, que chegou no dia 11 de dezembro (e ficará até fevereiro) na região com o objetivo de garantir a integridade física e moral dos povos indígenas, dos servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai) e dos não índios.
“Os candidatos vão prometer madeiras para construção de casas, como fazem todo período. A madeira será retirada do nosso território, período em que a reserva sofre maior invasão. É um contexto desfavorável para os povos indígenas, pois, a proteção de fato não acontece pelas autoridades competentes, mas sim pelos Guardiões, aumentando o conflito”, denuncia Auro Carvalho Guajajara.
A liderança indígena e ex-candidata à presidência da República, Sônia Guajajara, faz um alerta sobre a insegurança no território Araribóia após a saída da Força Nacional, em fevereiro. Ela enfatizou em reunião na aldeia que agora o local está sob os olhos de todos, mas e quando esse período de ampla divulgação passar? O cacique da aldeia Juçaral, Zeze Guajajara, enfatizou também que a atual conjuntura política expressou preocupação com o atual contexto político do país que desestrutura ainda mais a luta pelo território. “É importante garantir o nosso território. Sem essa garantia, não podemos expressar nossa cultura, nossos saberes”, finalizou.