02/06/2006 16:58
Fausto Oliveira
Um novo livro lançado pela FASE será apresentado no 2º Encontro Nacional de Agroecologia. Trata-se de “O Grão que Cresceu Demais”, sobre os impactos da monocultura de soja sobre o meio ambiente e a sociedade que vive no meio rural. O autor, Sérgio Schlesinger, é consultor do Projeto Brasil Sustentável e Democrático, do qual a FASE participa. Com este livro, Schlesinger vai além de derrubar mitos já derrubados sobre a “salvação da lavoura”. Ele estuda a soja como centro de um complexo agro-industrial e político que envolve corporações transnacionais e governos, cuja sobrevivência custa a destruiçao progressiva da Amazônia e o Cerrado, além de uma concentração de renda do produto rural em pouquíssimas mãos.
Sérgio Schlesinger joga luz sobre a cadeia produtiva em que o Brasil quer se tornar líder mundial (atualmente, só perde para os Estados Unidos na exportação de soja). Ao contrário do que muitos pensam, é o farelo de soja, e não o óleo, o produto mais procurado. A maior parte da exportação da soja brasileira é em forma de grão (20,5 bilhões de toneladas em 2005, contra 14,2 bilhões de toneladas de farelo e somente 2,4 bilhões de toneladas de óleo). Os maiores importadores são China e a União Européia em conjunto.
Como ele mostra no livro, a destinação final do farelo de soja, tanto fora do Brasil como aqui, é a alimentação de animais criados em confinamento, como porcos, frangos e camarões em cativeiro. Na Europa, até mesmo o gado é criado em confinamento e come soja brasileira. Schlesinger aponta que o consumo mundial de carne também aumentou muito nos últimos anos, notadamente onde houve aumento consistente de renda da população, como na China. O que faz crescer a demanda pela soja de países exportadores. “Quanto vai ter que se destruir do país para alimentar animais de fora?”, pergunta o autor do livro.
A pergunta faz sentido, pois, como mostra um gráfico do livro, dos 27 estados brasileiros, 15 estão cultivando soja. Em cinco deles (Pará, Roraima, Rondônia, Tocantins e Piauí), a produção cresceu mais de 300% entre 1995 e 2003. O que não chega a tirar de Mato Grosso o posto de estado líder na produção do grão. Ora, basta lembrar das imagens das fazendas de soja (devastadas, sem árvore nenhuma) e superpô-las ao mapa do Brasil para percebermos que o avanço desta monocultura está acabando com áreas grandes da Amazônia e do Cerrado.
Os defensores deste modelo de desenvolvimento contra-argumentam com ênfase no aspecto econômico. Costumam dizer que as exportações agrícolas, e principalmente as de soja, equilibram o balanço de pagamentos do Brasil. “Mas balanço de pagamentos não enche barriga”, diz Sérgio Schlesinger. Ele denuncia que a soja, por precisar sempre mais de terras e contaminar o ambiente com os agrotóxicos aspergidos por avião, destrói a agricultura familiar, gerando êxodo rumo às cidades. E não gera empregos em número suficiente que compense o prejuízo social no campo.
Isto porque, com a mecanização intensa, os empregos na produção de soja vêm diminuindo. Estima-se que no total em 2004, o Brasil tinha 335 mil pessoas empregadas no ciclo produtivo do grão. Em 1996, estimava-se o número de 741 mil. Quando se olha por hectares plantados no ano 2000, vemos que o número de empregos na produção de tomate é de 245 por cada 100 hectares. Na produção de uva, são 113 por 100 hectares. E a soja? Nada mais do que 2 empregos por 100 hectares plantados (dados do ano 2000).
“Fora a questão ambiental da Amazôina e o Cerrado, vemos que a renda da soja é concentrada em multinacionais de alimentos, como a Bunge e a Cargill, além dos fazendeiros. O rendimento da soja fica todo aí. Onde está a riqueza do agronegócio?”, conclui o pesquisador. Com “O Grão que Cresceu Demais”, a FASE contribui mais uma vez para o debate sobre o modelo de desenvolimento adotado pelo Brasil nos últimos anos. Um modelo que não poderá se sustentar no longo prazo, pois está gerando um perigoso passivo social e ambiental.