17/06/2006 10:23
Fausto Oliveira
Desconhecidos pela maior parte da população, os quilombolas estão prestes a se tornar uma nova e surpreendente força política no Brasil. No Espírito Santo, eles são um numeroso grupo de brasileiros negros que conhece suas raízes culturais e quer preservá-las a todo custo. Diante da força bruta da Aracruz Celulose, a multinacional do papel que desde os anos 60 os marginaliza tanto quanto aos índios do ES, eles começam a se organizar. Não estão mais dispostos a viver confinados no deserto verde do eucalipto plantado sobre muitos quilômetros quadrados pela Aracruz. Querem cidadania plena, com respeito a seu direito à terra, ao trabalho digno, à cultura tradicional. Com apoio da FASE Espírito Santo e outras entidades, eles acabam de fazer o 1º Grito Quilombola do Sapê do Norte.
A manifestação foi no sábado dia 26. Cerca de 500 pessoas foram às ruas de São Mateus, norte do Espírito Santo e precisamente no Sapê do Norte, território tradicional dos quilombolas. Esta manifestação representou o anseio de cerca de 1.300 famílias muito precarizadas pelos desmandos da Aracruz Celulose no Espírito Santo desdo fim dos anos 60. Suas principais reivindicações são com relação à terra que ocupam desde quando seus antepassados fincaram pés ali para conquistar a liberdade no seio do sistema escravista do Brasil ainda imperial.
“Eles exigem a demarcação e titulação da terra já, o Sapê do Norte é dos negros por direito” diz a educadora da FASE Espírito Santo Alacir De’Nadai. Ela contou ao Fase Notícias que os próprios quilombolas suplantaram dificuldades rlativas ao isolamento, à dispersão e à precaridade educacional e econômica para criar uma comissão. “A Comissão Quilombola do Sapê do Norte foi criada em 2005 para gerar interação entre as comunidades, fazer circular informações. A maioria deles está muito abaixo da linha de pobreza, quase todos são analfabetos e, no caso do Sapê do Norte, eles até três anos atrás não eram reconhecidos pelo Estado”, afirma Alacir.
A criação da Comissão Quilombola foi de fundamental importância para preencher os primeiros vazios de cidadania daquele povo tradicional. O objetivo dessa comissão é capacitá-los para a ação política cidadã em um contexto de violação de direitos e agressão sócio-ambiental por parte de grandes corporações, monoculturas insustentáveis e governos submissos ao poder econômico.
“A Comissão Quilombola é um marco. Por isso queremos fortalecê-los, mantendo-os como protagonistas de sua própria luta”, diz Alacir. O 1º Grito Quilombola do Sapê do Norte é o primeiro fruto desse trabalho de organização que ganha visibilidade pública. Pode ainda ser pouco para o tamanho da reparação histórica a que eles fazem jus. Mas é o início de uma luta constante.