21/09/2007 18:03

Fausto Oliveira

Mais uma vez, os movimentos sociais urbanos e o Fórum Nacional de Reforma Urbana vão às ruas em sua mobilização anual. Como em 2005, quando organizaram uma marcha com 5 mil pessoas em Brasília, e 2006, quando fizeram a primeira edição da Jornada de Lutas por Reforma Urbana, está chegando a hora da mobilização de 2007. Nos dias 1º e 2 de outubro, todas as organizações e movimentos sociais que defendem cidades mais justas e democráticas farão manifestações regionais para a segunda edição da Jornada Nacional de Lutas por Reforma Urbana e o Direito à Cidade.

A data de 1º de outubro é o Dia Mundial do Habitat, um dia internacional em que no mundo inteiro as atenções se voltam para a questão do direito à moradia. As organizações e movimentos reivindicam que no Brasil, o Dia Mundial do Habitat (que na realidade é celebrado sempre na primeira segunda-feira de outubro) seja declarado oficialmente como Dia Nacional da Reforma Urbana. Para isso, já existe uma iniciativa no Congresso Nacional.

Um dos grandes eixos da Jornada de 2007 é a reivindicação pelo aprofundamento da participação social na gestão das cidades. Hoje, em diversas cidades brasileiras, a sociedade se mobilizou e exigiu a instalação de conselhos municipais para discussão de políticas públicas e controle sobre a gestão municipal. Nacionalmente, as políticas urbanas são discutidas no Conselho Nacional das Cidades. Entretanto, a efetividade destes conselhos ainda é limitada por vários fatores. O que a Jornada exigirá é a regulamentação destas instâncias, quando e onde já existirem, e a criação de novas instâncias de participação, mas com a garantia de efetividade.

Um ponto muito importante da pauta da Jornada da Reforma Urbana este ano é relativo ao Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, uma iniciativa do governo federal para realizar obras públicas de variados tipos e funções. Grande parte dos vultosos recursos que o governo vai aplicar no PAC será destinada a obras de infra-estrutura em áreas urbanas. É preciso que estas obras sejam discutidas com seus beneficiários diretos, a sociedade civil de cada localidade. Também é fundamental que a própria escolha dos projetos e a destinação dos recursos seja debatida socialmente nos conselhos. Senão, poderá acontecer o que tradicionalmente ocorre no país quando há investimentos públicos de grande porte: as obras representam melhorias relativas para as populações, têm pouco impacto positivo na vida dos mais pobres e geram ganhos econômicos e políticos descomunais para empreiteiras e outros setores empresariais.

Como não poderia deixar de ser, a Jornada de Lutas por Reforma Urbana vai reivindicar a redução do trágico déficit habitacional brasileiro por meio de políticas consistentes de moradia popular. A demanda por moradia no Brasil é calculada em 7 milhões de unidades habitacionais. Sob todos os aspectos, uma política pública que vise reduzir esta situação escandalosa deverá priorizar famílias com até 5 salários mínimos de renda. Já existe, por iniciativa de projeto de lei dos movimentos populares urbanos, o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social, um recurso público destinado a esta tarefa. E de outro lado, percebe-se a existência de muitos prédios públicos (dos governos federal, estaduais e municipais) e privados em situação de ociosidade.

Com relação ao fundo, as organizações exigem que os recursos sejam ampliados. Mas não apenas isso. A própria construção das moradias não deve ficar sob controle total de governo e empreiteiras. Já existem no Brasil muitas experiências de associações comunitárias e cooperativas de construção de casas populares a partir do modelo de auto-gestão. Estas organizações podem e devem acessar os recursos do fundo e do PAC a fim de produzir à sua maneira e sob suas regras a moradia que, ao final, será deles com a legitimidade conferida pelo direito humano que por muitos anos passou desatendido. Com relação aos prédios públicos vazios, eles são o primeiro e mais cabal exemplo de propriedade cuja função social não está respeitada. Sabendo disso, movimentos sociais das cidades estão regularmente ocupando estes edifícios para não mais dormir na rua. É preciso que estes prédios sejam uma das pontas de lança da reforma urbana, com sua conversão imediata em prédios de moradia popular, definidos assim por política pública dos governos em suas diversas instâncias.

Quando acontecem as ocupações destes prédios ociosos, sejam eles públicos ou de propriedade particular, em todas as vezes a Justiça é pressurosa em conferir as liminares de reintegração de posse. A polícia, por sua vez, se mobiliza com prontidão incomum para realizar os despejos. E, quase sempre, estes despejos resultam em trágicos casos de violência. Por isso, na Jornada deste ano, uma das grandes bandeiras será a criação de uma política nacional de prevenção de despejos. Isso inclui uma revisão do comportamento padrão do Poder Judiciário, que analisa a ocupação de prédios vazios apenas pela ótica do direito à propriedade, mas nunca vê pelo olhar do direito à moradia. Implica também um compromisso dos governos estaduais em mudar o comportamento das polícias. Mas acima de tudo implica uma necessidade de produção de moradias populares de qualidade.

Nos dias 1º e 2 de outubro, o Brasil vai ser sacudido por este debate. Ele vai vir à tona em várias cidades, por iniciativa dos fóruns regionais de reforma urbana e movimentos sociais, e em Brasília haverá o grande ato político. À frente desta intensa mobilização, estão os quatro grandes movimentos sociais urbanos brasileiros: Central dos Movimentos Populares, Movimento Nacional de Luta por Moradia, União Nacional de Moradia Popular e Confederação Nacional das Associações de Moradores. Junto com eles, está o Fórum Nacional de Reforma Urbana, uma organização ampla e variada, da qual a FASE é a secretaria, e que congrega milhares de pessoas no esforço de construir cidades democráticas, justas e sustentáveis para todos e todas.