25/08/2016 16:31

Paulo Demeter¹

Em 2016, a intervenção educativa do programa da FASE na Bahia², resultou em avanços consideráveis na qualificação da participação popular em políticas públicas e no acesso a direitos previstos na legislação. A Lei 11.947/2009, que reformulou o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), estabelecendo um piso mínimo obrigatório de compras diretas da Agricultura Familiar, tinha pouca aplicação nos municípios do Baixo Sul e do Vale do Jiquiriçá. Para esclarecer sobre as regras e as formas de funcionamento do PNAE, realizamos diversos encontros sobre o fortalecimento da Agricultura Familiar e a promoção da agroecologia para disseminar conhecimentos e sua importância para a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) das famílias agricultoras. Assim, tanto em campo, como nas oficinas, reuniões e visitas de assessoria técnica, o tema é trabalhado por educadoras e educadores. Um componente dos esforços de transição agroecológica.

Uma das reuniões de debate com cooperados e cooperadas. (Foto: Arquivo FASE BA)

Uma das reuniões de debate com cooperados e cooperadas. (Foto: Arquivo FASE BA)

Sabemos que a oferta de produtos sadios para consumo dos estudantes nas escolas, depende da existência de uma agricultura familiar diversificada e que adote princípios agroecológicos para plantios e criações. Quando comunidades conseguem vender parte de sua produção para consumo no próprio município, diminuímos os gastos com transporte e armazenamento e valorizamos a produção e a cultura alimentar local. Os impactos ambientais são menores e crescem as possibilidades de se planejar a produção com antecedência, utilizando recursos naturais de forma mais sustentável e equilibrada.

A vinculação entre acesso de famílias agricultoras ao PNAE e a melhoria de organização comunitária e cooperativista é evidente, e por isso apoiamos a consolidação da Cooperativa dos Trabalhadores na Agricultura Familiar, Economia Solidária e Sustentável dos Municípios de Mutuípe e Vale do Jiquiriçá (Coopeípe).

A existência e funcionamento da Coopeípe é vital para possibilitar a participação de agricultores familiares nas Chamadas Públicas do PNAE. É através da cooperativa que famílias agricultoras conseguem volume e diversidade de produtos ofertados, com preços e variedade em condições de competir com outras empresas. Nunca é demais mencionar a falta de vontade política de prefeituras e setores estaduais da educação pública, na implantação do PNAE. Interpretam a lei como se os 30% adquiridos diretamente da agricultura familiar fossem um teto, e não um piso mínimo a ser imediatamente cumprido e ampliado de forma rápida e consistente, favorecendo uma alternativa de desenvolvimento local baseada no fortalecimento da agricultura familiar.

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Trabalho das mulheres de São Miguel das Matas

A experiência acumulada pelo programa da FASE na Bahia e seus parceiros, permitiu a conquista de vitórias importantes. Nos oito municípios em que atuamos, as pressões e mobilizações resultaram na publicação de editais de Chamada Pública pelas prefeituras de Laje, São Miguel das Matas, Presidente Tancredo Neves e Valença, com prévia e ampla divulgação. Em Teolândia também houve Chamada Pública, mas sua divulgação foi quase clandestina. Em Mutuípe, a prefeitura, contrariando disposições legais, continua insistindo na realização de pregões presenciais. Em Jiquiriçá e Ubaíra, ainda não realizaram Chamadas Públicas este ano.

A assessoria técnica da FASE realizou várias reuniões e Dias de Campo nas comunidades, animando o debate e oferecendo subsídios. Nestes eventos, as famílias agricultoras se informavam sobre preços e condições constantes dos editais, bem como, sobre o tipo e quantidade de produtos que as prefeituras queriam adquirir e a logística de entrega prevista em cada município. O debate incluía também levantamentos sobre a existência e quantidade de produtos em cada comunidade, a qualidade e as possibilidades de transporte e armazenamento adequados para permitir sua entrega nos prazos contratados. Além disso, ressaltamos as alternativas de produção colocando as potencialidades produtivas de cada família em comum, assim como equipamentos de agroindustrialização e beneficiamento que já existem em várias dessas comunidades.

Força feminina

Iniciativas econômicas de Grupos de Mulheres que vêm sendo acompanhados pelo programa da FASE na Bahia também participaram deste processo. Esses grupos são os que mais têm avançado na agregação de valor à mandioca e seus derivados, rompendo com a dependência de só se produzir farinha.

Destas discussões resultaram decisões de participar das Chamadas Públicas do PNAE, por parte de diversas associações, sendo que em São Miguel das Matas foram elaborados projetos de venda das associações de Riacho das Bananeiras, Arco Verde, Cabeça do Boi e Tabuleiro da Santa. Em Presidente Tancredo Neves, os educadores assessoraram a elaboração de projetos de venda das associações de Cachoeira Alta, Roda d’Água, Corte de Pedra, Gendiba, Moenda, Serra do Sal e Baixão, Calumbi, Riachão do Meio, Aviação e Umbaúba. A Coopeípe e a associação de Sete Voltas, de Laje, também participaram do PNAE em Presidente Tancredo Neves.

FASE e associações se reúnem com prefeitura de SMM para debater Chamada Pública PNAE 2016

FASE e associações se reúnem com prefeitura de SMM para debater Chamada Pública PNAE 2016

á em Laje, a intervenção da FASE viabilizou elaboração de projetos de venda para o PNAE envolvendo famílias agricultoras das associações de Pindoba, Sete Voltas, Riachão, Km 17, Rio de Areia e Borges. Em Teolândia, apesar da pouca transparência da Chamada Pública, famílias agricultoras das comunidades de Limoeiro e São Paulinho, conseguiram participar do PNAE. Em Mutuípe, associações e a Coopeípe, apesar de continuarem lutando pela realização da Chamada Pública, participaram do pregão presencial e contabilizam 57 famílias agricultoras participando, sendo que 27 dessas são assessoradas diretamente pela FASE.

Todo este esforço da FASE e de seus parceiros resultou na participação de 212 agricultores familiares diretamente acompanhados pela FASE no PNAE 2016, sendo que 163 são mulheres. Recursos da ordem de R$ 550 mil foram contratados e ainda existem perspectivas de realização de novas Chamadas Públicas para o 2º semestre deste ano. Essas associações e a Coopeípe irão comercializar dezenas de produtos, consolidando sua tendência de diversificar sua produção, priorizando a segurança alimentar das famílias envolvidas.

A venda contratada não será só de produtos in natura, pois vários grupos já estão agregando valor à sua produção, através da fabricação de bolos, doces, pães, polpas de frutas e temperos. Saber que o PNAE existe, quais são os produtos demandados e em quais quantidades e condições, permite a estas famílias planejar sua produção e aproveitar suas áreas e recursos naturais e humanos com muito mais eficiência e sustentabilidade.

[1] coordenador do programa da FASE na Bahia

União Europeia_editada[2] O trabalho do programa da FASE na Bahia junto à cooperativa é possível a partir do apoio da União Europeia (UE). O conteúdo deste artigo é de nossa responsabilidade exclusiva, não podendo, em caso algum, considerar que reflita a posição da UE.