24/04/2006 12:23

Fausto Oliveira

A crítica das monoculturas como elemento que compromete radicalmente a sustentabilidade socioambiental do país esteve presente no Fórum Social Brasileiro. No debate Agronegócio e as Faces da Monocultura, representantes de movimentos sociais rurais, ONGs e da academia compartilharam visões sobre o mal que devasta florestas, agride populações e compromete a saúde dos recursos hídricos.

O professor da Universidade de São Paulo Ariovaldo Umbelino fez parte desta mesa. Ele trouxe para um público de cerca de 200 pessoas dados que comprovam como é falsa a retórica sobre a soja no Brasil. Segundo ele, nos últimos anos, por duas safras consecutivas, os Estados Unidos tiveram grandes perdas na sua produção soja. Eles, que são os maiores produtores de soja do mundo (o Brasil é o segundo), possibilitaram uma alta nos preços internacionais do grão. Foi aí que os grandes sojicultores brasileiros se firmaram como atores importantes no mercado mundial. “Por causa dessa época ruim nos EUA, o sojicultor brasileiro posou de salvador”, disse o professor.

Umbelino também mostrou, usando gráficos e tabelas, que a economia mundial não se sustenta na exportação de produtos agrícolas. Em 1950, 45% do total de exportações no mundo eram agrícolas. Em 2003, esse número é menos de 10% do total. Trigo, arroz e milho são os produtos mais produzidos no mundo, cada um com safra de 600 milhões de toneladas ao ano. A soja tem apenas 200 milhões de toneladas ao ano em todo o mundo. Apesar disso, o Brasil aumenta drasticamente a área plantada de soja do ano 2000 para cá. Isso vem acabando com o cerrado e agora começa a ameaçar a Amazônia. Além disso, o professor mostrou que de 1992 para cá, arroz, feijão e mandioca estão sendo menos produzidos. “Com a redução da produção de alimentos devido ao agronegócio exportador, o país fica sem segurança alimentar e sem soberania alimentar”, disse ele.

Lúcia Barbosa, coordenadora do MST no sul da Bahia, trouxe um relato ameaçador, relacionado ao famigerado Deserto Verde gerado pelas monoculturas de eucalipto. Segundo ela, as empresas Aracruz, Suzano e Veracel (todas produtoras de papel e celulose) estão tomando conta da região sul baiana. De uma área de 2 milhões de hectares, 600 mil já estão sob controle destas empresas. “Enquanto isso, só 40 mil hectares no extremo sul da Bahia têm assentamentos”, disse ela. Os danos ambientais já são perceptíveis, segundo Lúcia Barbosa. “Onde eles plantam eucalipto, os lagos desaparecem, os bichos somem, as florestas acabam. O sul da Bahia está virando um deserto verde”, afirmou.

Para Jean-Pierre Leroy, representante da FASE no debate, é preciso discutir um novo modelo de desenvolvimento, pois o projeto do agronegócio é totalitário. “O agronegócio quer ocupar todos os espaços, por isso é totalitário e lutar contra ele é lutar pela democracia”, disse ele. Analisando a monocultura de eucalipto, ele disse que essa plantação de árvores serve a três fins econômicos: produção de papel, carvão vegetal e madeira de construção. “Mas é papel para uso essencial ou para exportação e usos supérfluos nos países desenvolvidos? Para onde vai a produção? Vamos produzir para o luxo dos outros ou para atender necessidades essenciais?”, perguntou ele com ênfase.

As monoculturas, para Jean-Pierre, desestruturam as possibilidades de vida social nos territórios onde chegam. “No Mato Grosso, vi famílias que já não têm ônibus passando perto de suas casas, porque tudo em volta era soja. Com isso, as crianças não podem mais ir à escola. O que acontece? A família tem que se mudar”. Por isso, ele propõe a criação de pólos de desenvolvimento local no meio rural, com ênfase na pequena produção familiar e diversificada. “Precisamos de vários pólos para fixar as famílias com produção diversificada, sem isolamentos e com integração em mercados solidários”, disse. É, sem dúvida, uma alternativa de desenvolvimento sustentável muito mais interessante do que o agronegócio exportador que enriquece poucos a custa de todo o resto.