Maria Emilia Pacheco
07/07/2023 15:06

O Programa Aquisição de Alimentos (PAA), relançado pelo Presidente Lula no dia 22 de março, em Pernambuco, tem importante significado social, econômico, político e cultural sobretudo no cenário da indignidade da fome que cresceu no país nos últimos anos e da redução da oferta de alimentos diversos de nossas culturas alimentares.

Entre seus objetivos estão a contribuição com o acesso à alimentação – em quantidade, qualidade e regularidade necessárias – pelas pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional; o incentivo ao consumo e valorização dos alimentos produzidos pela agricultura familiar; o apoio à formação de estoque pelas cooperativas e demais organizações da agricultura familiar; o fortalecimento de circuitos locais e regionais e redes de comercialização da produção da agricultura familiar; a promoção e valorização de nossa biodiversidade e a produção orgânica e agroecológica de alimentos.

Aberto o período de apresentação de projetos, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) recebeu mais de 3.700 propostas, totalizando um montante de R$ 1,1 bilhão. Os projetos inscritos, para os quais a FASE apoiou em áreas de sua atuação, envolvem 77 mil famílias agricultoras, incluindo indígenas, assentados da reforma agrária e comunidades tradicionais e abrangem mais de 350 tipos de alimentos. A previsão é que sejam doadas 248 mil toneladas de alimentos provenientes da agricultura familiar para pessoas em situação de insegurança alimentar.

Esta importante notícia que revela a capacidade de organização dos vários segmentos da agricultura familiar e camponesa foi anunciada nesta semana pelo Diretor-Presidente da Conab, Edegar Pretto, e pelo Diretor de Política Agrícola e Informações da Conab, Silvio Porto. Com a previsão estimada de recurso da ordem de R$ 500 milhões de reais, segue agora a mobilização dos movimentos sociais e organizações de apoio para alcançar a suplementação de R$ 600 milhões.

Mas neste momento, está em curso no Congresso Nacional a votação do projeto de lei nº 2.920, de 2023 que institucionaliza o PAA. Várias propostas de emendas colocam em risco a integridade da proposta do relator e representam graves retrocessos.

Entre as ameaças mais graves destacamos:

  1. A proposta de acabar com a dispensa de licitação: a medida já é permitida para a agricultura familiar pela Lei nº 11.947/2009, que determina que no mínimo 30% dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) devem ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações. Como o PNAE é um programa de compras públicas tal qual o PAA, é importante manter a coerência de ambos com relação à assegurar a dispensa de licitação.
  2. A proposta de alterar radicalmente as atribuições do Grupo Gestor: precisamos garantir este órgão colegiado de caráter deliberativo, e que deverá formar grupos consultivos, importante mecanismo de participação social e controle social.
  3. A proposta de não incluir incentivo a produtos agroecológicos e orgânicos: representa a negação da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, e a recusa em entender que a erradicação da fome requer assegurar o direito da população se ver livre da fome e garantir o acesso a uma alimentação adequada e saudável;
  4. A proposta de retirar os agricultores urbanos e periurbanos de fornecerem para o PAA: ignora a realidade da produção nos cinturões verdes dos centros urbanos e regiões metropolitanas, e as inúmeras experiências de coletivos de agricultura urbana agroecológica no país. Precisamos de uma Política Nacional de Agricultura Urbana que já vem sendo dialogada pelo movimento agroecológico e de soberania alimentar há vários anos.

Por isso dizemos sim ao texto do relator Deputado Guilherme Boulos e não às emendas dos retrocessos!

*Assessora da FASE, integrante do Conselho de Participação Social e ex-presidente do Consea