15/09/2006 13:17
Desta vez a Aracruz Celulose foi longe demais. Prestes a perder os 11.009 hectares de terras indígenas que invadiu e agora o Ministério da Justiça vai demarcar como lugar tradicional dos povos Tupinikim e Guarani, a empresa multinacional apelou para argumentos racistas. Iniciou uma campanha na mídia do Espírito Santo para dizer o absurdo dos absurdos: acredite ou não, a Aracruz vem dizendo que os Tupinikim e Guarani não são índios. Evidentemente, isso foi tomado como atitude altamente preconceituosa. Por isso, a Comissão de Caciques e Lideranças dos dois povos deu uma entrevista coletiva na manhã desta sexta-feira para repudiar mais essa atitude escabrosa da Aracruz Celulose.
Para lembrar: a disputa entre os índios e a Aracruz Celulose é sobre 11.009 hectares de terras que sempre foram ocupadas por indígenas, mas que foram invadidas pela Aracruz nos anos 60, desmatadas e cultivadas com a monocultura de eucalipto, para produção de celulose. Depois de iludidos pela empresa por muitos anos, os índios decidiram tomar de volta suas terras, mesmo que fosse preciso entrar em conflito direto com a empresa invasora. Foi o que aconteceu em 2005. De lá para cá, eles invadiram as terras e derrubaram eucaliptos. Expulsos em janeiro pela Polícia Federal, voltaram a invadir no início deste mês.
A ação mais recente tem como base a conclusão do processo de reconhecimento das terras como indígenas pela Funai. O processo está nas mãos do ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, que tem até o dia 11 de outubro para assinar a portaria que demarcará a área como indígena. A Aracruz vai ser obrigada a devolver terras que não são dela. Para os índios é uma questão de justiça. Para o meio ambiente, é uma questão de sobrevivência, já que a monocultura de eucalipto é uma das mais devastadoras das reservas hídricas e da biodiversidade. No caso do Espírito Santo, ajudou a arrasar um pouco da Mata Atlântica, da qual hoje restam apenas 7%.
Como sabe que vai ter de abrir mão das terras que invadiu, a Aracruz está em desespero. Agora saiu-se com essa de que os Tupinikim e Guarani não são índios. O objetivo é jogar a opinião pública contra os índios, afirmando também que eles estariam ameaçando os trabalhadores da empresa. Falso. Os índios apenas querem de volta o lugar que é seu, independente do esforço que tenham que fazer para isso. E vão conseguir.
Leia abaixo a carta que foi divulgada na entrevista coletiva.
ARACRUZ CELULOSE PRATICA CRIME HEDIONDO CONTRA ÍNDIOS!
A sociedade civil através das entidades, movimentos e pessoas abaixo-assinadas vem a público manifestar sua indignação com a campanha difamatória e a prática de racismo da Aracruz Celulose S/A contra os povos Tupinikim e Guarani.
A estratégia de defesa adotada por esta multinacional nos últimos meses, quando se vê diante da decisão eminente sobre a devolução das terras indígenas por ela invadidas, tem sido a de negar a existência desses povos tradicionais em território capixaba e de desqualificar e ridicularizar sua identidade indígena. ISTO É RACISMO! RACISMO É CRIME HEDIONDO E INAFIANÇÁVEL!
A posição da Aracruz Celulose demonstra não só desrespeito com a história, com a memória e a cultura do povo capixaba, mas também que esta empresa não tem escrúpulos quando se trata de garantir seus interesses, as custas da miséria e da destruição dos povos tradicionais e do meio ambiente. Campanhas milionárias financiadas por esta empresa vêm escamoteando os impactos gerados pela monocultura de eucalipto no Brasil e expondo os povos tradicionais desta terra a humilhações inomináveis.
Aqueles que conhecem a história do nosso estado não podem ficar de braços cruzados diante da violação da dignidade e dos direitos dos Tupinikim e Guarani. Se por um lado vemos a empresa Aracruz Celulose cooptando sindicatos, financiando políticos, manipulando governos, prestadoras de serviços, ONG’s utilizadas para isentá-la de impostos, além da grande mídia comprometida com os interesses desta, vemos por outro lado os indígenas lutando incansavelmente – há mais de 40 anos – pela retomada de sua terra e da sua liberdade, reduzidas.
Neste momento, o Estado brasileiro, através do Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, tem a oportunidade histórica de corrigir graves erros cometidos até agora, contra os Tupinikim e Guarani no Espírito Santo, efetivando seu direito constitucional demarcando integralmente seu território, já identificado pela FUNAI e reconhecido como tal pelo ex-Ministro Íris Resende, através do despacho ministerial de 06/ 03/ 98.
Apelamos a todas as cidadãs e os cidadãos que se manifestem publicamente contra as práticas racistas da multinacional Aracruz Celulose e seus aliados. De nossa parte tomaremos todas as medidas legais cabíveis contra esse crime hediondo, exigindo que a Constituição da República do Brasil seja respeitada.
NOSSA SOLIDARIEDADE AOS POVOS TUPINIKIM E GUARANI!
Vitória, 15 de setembro de 2006.