16/11/2016 13:01

Rosilene Miliotti¹

Qual a importância de debater o direito à cidade na atual conjuntura do país? Esse era o questionamento que o professor do Instituo de Ciência Política da Universidade de Brasília Luiz Felipe Miguel e a jornalista Laura Capriglione, integrante do coletivo Jornalistas Livres, tiveram que responder durante evento realizado no Recife na terça-feira (8), abrindo a semana de atividades promovidas pelo programa da FASE em Pernambuco em parceria com a Fundação Rosa Luxemburgo².

(Foto: Rosilene Miliotti / FASE)

(Foto: Rosilene Miliotti / FASE)

O professor fez uma análise do cenário atual, que para ele não começa no movimento pró-impendimento, mas sim no início do segundo mandato da ex-presidenta Dilma Rousseff, quando os movimentos sociais não se viram mais representados pelo governo. Ele chamou atenção também para o fato das eleições de 2014 terem dado ao país a Câmara mais retrograda e conservadora dos últimos anos. “Não tivemos uma única voz que tenha se levantado em defesa da democracia no Judiciário. O modus operandi do atual governo, que não dialoga e apenas impõe, está focado na entrega do petróleo e do Pré-sal ao capital estrangeiro e à pressa em aprovar a PEC 241”, critica.

Professor Luiz durante a fala. (Foto: Rosilene Miliotti / FASE)

Luiz Felipe Miguel. (Foto: Rosilene Miliotti / FASE)

Laura lembrou que no regime militar a palavra de ordem era unicamente “abaixo a ditadura”. Ressaltou que os movimentos sociais saíram às ruas e foram construindo o programa que está sendo defendido hoje, mas que é preciso atualizá-lo. “Esses meninos que estão ocupando as escolas hoje é que estão atualizando. Sabem porque nós não temos um programa e nem avançamos nesse campo? Porque nós não sabemos o que de fato queremos. Isso não é uma questão de ‘eu quero, eu faço’. Quem vai fazer são os movimentos sociais. A garantia do direito à cidade só será possível a partir da prática dos movimentos sociais”, avaliou.

Ela destacou ainda a crescente banalização da maldade. “Estamos diante de um governo que veio para piorar tudo, o golpe não tinha objetivo de melhorar a situação do povo. Além disso, tem o incentivo ao ódio.  ‘Eu quero que bandido morra’, as pessoas, de todas as idades, estão repetindo isso o tempo todo. Na época dos panelaços, minha vizinha bateu panela na minha porta e falou ‘morre petista’. Nós frequentamos o mesmo mercado, muitas vezes vamos juntas. Estamos em um momento de ofensiva neoliberal, de retomada de um governo que vivemos durante o período do FHC [ex-presidente Fernando Henrique Cardoso], quando tivemos um Estado de negação de direitos”, afirmou.

As Jornadas de Lutas de Junho de 2013 foram lembradas por Luiz como um marco da ruptura de conciliação de classes. “É preciso dizer que o governo do Partido dos Trabalhadores deu errado, mas é mais fácil apontar o que deu errado do que sugerir alternativas. O que faz um programa político é a conjunção de lutas reais. Na Revolução Russa, a questão foi a luta pelo pão, a paz e a terra. Quais serão os eixos que vamos usar para fazer a nossa revolução? Acredito que os movimentos sociais é que vão dizer”, defendeu.

Outra critica levantada por Luiz é que o campo da direita tem mais capacidade de se unir e de se articular do que o da esquerda. “A recente eleição para prefeito, principalmente a do Rio de Janeiro, mostra o quanto a direita está articulada. Além disso, vemos cada vez mais juízes e procuradores promovendo e autorizando a repressão. A mídia é a maior promotora da criminalização dos movimentos sociais no país”, explica. Ele sugere que é preciso organizar uma resistência cotidiana e enfrentar coletivamente o programa de instalação de um governo conservador. “Não existe transformação possível sem luta”, conclui Luiz.

Laura Capriglione. (Foto: Rosilene Miliotti / FASE)

Laura Capriglione. (Foto: Rosilene Miliotti / FASE)

Luta pela democratização da comunicação

Durante o debate, a mídia foi criticada, mas Laura chamou atenção para a culpa dos movimentos sociais, inclusive dos Jornalistas Livres, em não tencionar pela democratização da comunicação. Ela afirma que um governo não se faz sozinho e os movimentos sociais poderiam ter “empurrado esse governo mais para a esquerda”. “O que esses grupos fizeram durante o governo do PT? Temos que assumir as nossas responsabilidades. Não quero tirar a responsabilidade de ninguém, mas eu, como militante da imprensa independente, poderia cobrar junto ao Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação [FNDC] e lutar mais, poderíamos ter ocupado o Ministério das Comunicações”, critica.

Ela chamou atenção para a questão das rádios livres e independentes no Brasil e na América Latina, que nos últimos anos diminuíram em número drasticamente. “Se você sair dos grandes centros urbanos, como se comunica? Por rádio. Só que no Brasil isso não será tão fácil porque houve uma repressão brutal, promovida no governo petista, contra as rádios livres. Tenho motivo de sobra para reclamar desse governo, mas não posso perder tempo reclamando”, expôs.

Para ela, existe o consenso de que é preciso avançar, mas as pessoas não sabem como. “É muita presunção falar que vamos inventar um programa nacional. A conjunção de lutas reais é que vai fazer a revolução”, destaca. Na opinião da jornalista, a função da mídia independente não é só visibilizar os movimentos sociais, mas se comprometer com suas causas. “Conquistar o direito à cidade e defender na prática, na luta cotidiana”, concluiu.

[1] Jornalista da FASE.

[2] Veja as fotos da semana de atividades produzidas por Verena Glass, da Fundação Rosa Luxemburgo.