Paula Schitine
29/06/2023 14:35

O presidente Lula e o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, lançaram nesta quarta-feira (28), em Brasília (DF), o Plano Safra da Agricultura Familiar, um dia depois de anunciarem o Plano Safra para a agricultura empresarial. Serão destinados R$ 71,6 bilhões ao crédito rural, o Pronaf, para a safra 2023/2024. O volume é 34% superior ao anunciado na safra passada e o maior da série histórica. Ao todo, quando somadas outras ações anunciadas para a agricultura familiar, como compras públicas, assistência técnica e extensão rural, Política de Garantia de Preços Mínimos para os Produtos da Sociobiodiversidade (PGPM-Bio), Garantia-Safra e Proagro Mais, o volume investido chega a R$ 77,7 bilhões.

Entre as medidas, a redução da taxa de juros, de 5% para 4% ao ano, para quem produzir alimentos, como arroz, feijão, mandioca, tomate, leite, ovos, por exemplo. O objetivo é contribuir com a segurança alimentar do país, ao estimular a produção de alimentos essenciais para as famílias brasileiras. Agricultores familiares que optarem pela produção sustentável de alimentos saudáveis, com foco em orgânicos, produtos da sociobiodiversidade, bioeconomia ou agroecologia, terão incentivos maiores, com juros de apenas 3% ao ano no custeio e 4% no investimento.

Outra novidade são as mudanças no microcrédito produtivo, destinado aos agricultores familiares de baixa renda. O chamado Pronaf B terá o enquadramento da renda familiar anual ampliado de R$ 23 mil para R$ 40 mil e o limite de crédito de R$ 6 mil para R$ 10 mil. O desconto de adimplência para a região Norte saltará de 25% para 40%.

Mulheres rurais também ganham uma linha específica neste Plano Safra da Agricultura Familiar. Uma nova faixa na linha Pronaf Mulher, com limite de financiamento de até R$ 25 mil por ano e taxa de juros de 4% ao ano, orientada às agricultoras com renda anual de até R$ 100 mil, está sendo criada. Além disso, caso haja enquadramento no Pronaf B, o limite do financiamento dobra e chega a R$ 12 mil, com desconto de adimplência de 25% a 40%. As quilombolas e assentadas da reforma agrária terão aumento no abatimento do Fomento Mulher (modalidade do crédito instalação) de 80% para 90%.

A diretora executiva, Letícia Tura avalia o Plano Safra da Agricultura Familiar.

A diretora executiva da FASE, Letícia Tura, analisa o anúncio e avalia como positivo o conjunto de medidas, mas ainda não suficiente para atender as necessidades dos e das agricultores e agricultoras familiares, sendo que a maior parte dos recursos serão destinados via crédito rural. “Esse Plano Safra é uma importante retomada, um primeiro passo depois de anos sem um plano específico para a Agricultura Familiar. Neste sentido, ele em si já é um ganho, mas ainda podemos avançar mais”, afirma. “Para nós da FASE o combate à fome é fundamental. Assim, é importante destacar algumas conquistas; e a principal delas é a centralidade na produção de alimentos e em quem está produzindo alimentos de forma agroecológica”, completa. “Outro destaque é a importância que o presidente Lula deu no seu discurso ao combate às desigualdades. Então, (o plano) tem diferenciais para mulheres, assentados da Reforma Agrária, comunidades quilombolas e para as regiões Norte, Nordeste do País e para Amazônia. E por fim, para a FASE tem elementos que são centrais para o combate à fome, entre eles a produção de alimentos saudáveis, então, para nós é fundamental a retomada da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), com toda a sua estrutura de governança, a Ciapo e a Cnapo.”

Apesar desses avanços, a diretora avalia que, em relação ao Plano Safra empresarial, o volume de recursos ainda é bem menor. “O aumento do Plano Safra empresarial foi de 26% e o aumento do Plano Safra da Agricultura Familiar de 34%, mesmo assim, as diferenças são gritantes”, pontua. “Então, se a gente pensar que a Agricultura Familiar é a grande parte dos estabelecimentos rurais no Brasil e a principal produtora de alimentos, mesmo ocupando o menor número de terras, por conta da desigualdade fundiária, se a gente quiser romper com essa desigualdade, a gente vai ter que equilibrar muito mais este orçamento”, avalia Letícia Tura.

Correções de rumo

A assessora da FASE, ex-presidenta do Consea, Maria Emília Pacheco, faz algumas observações sobre os rumos da Agricultura Familiar no contexto do Plano Safra. Ela ressalta que ofortalecimento das compras públicas é sumamente importante, “mas esperava-se um aumento de recurso para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) operado pela Conab, especialmente pela modalidade de compra com doação simultânea que faz o alimento produzido pela Agricultura Familiar chegar onde estão segmentos da população em situação de insegurança alimentar”, pondera. “Mas a informação até o momento é que o volume de recurso será de R$ 500 milhões. A reivindicação dos movimentos pela soberania alimentar e agroecologia apresentaram a proposta de R$ 1 bilhão, que foi o recurso executado em 2012 no auge da execução do programa. Tudo indica que os valores maiores incluídos no Plano Safra destinam-se ao PAA Institucional que significa a compra de alimentos que serão destinados ao Exército, hospitais, universidades e institutos federais, entre outras instituições. Observa-se, no entanto, que as menores organizações econômicas da agricultura familiar não alcançam produzir para atender essas demandas e por isso as modalidades operadas pela Conab correspondem mais ao seu perfil”, critica.

Maria Emília ainda destaca que o Plano Safra tem propostas que favorecem a autonomia das mulheres, mas se restringe a modalidades de crédito. “Não inclui, por exemplo, uma proposta de Programa Nacional de Sementes e Mudas para a Agricultura Familiar com formas de financiamento adequadas para a criação e ampliação de Casas Comunitárias de Sementes Crioulas ou nativas, feiras de troca, fundamentais para enfrentar as mudanças climáticas e recuperar a perda de espécies e variedades”, observa.

 

*Jornalista da comunicação da FASE