Paula Schtine e Helio Uchoa
11/07/2024 17:05
Na cidade de Rurrenabaque, na Bolívia, em junho de 2024, o XI Fórum Social Pan-Amazônico (FOSPA) reuniu líderes e ativistas da Pan-Amazônia para discutir temas cruciais como justiça socioambiental e climática, direitos dos povos indígenas e mudanças climáticas. A FASE e o Fundo DEMA participaram ativamente, destacando seus esforços na valorização dos povos e comunidades tradicionais na região amazônica.
Uma delegação de oito fundos comunitários integrantes da Rede de Fundos Comunitários da Amazônia Brasileira esteve presente com o apoio da Tenure Facility, onde participaram 15 representantes : do Fundo Babaçu; Fundo Dema; Fundo Indígena Timbira; Fundo Indígena da Amazônia Brasileira Podáali; Fundo Indígena do Rio Negro; Fundo Quilombola Mizizi Dudu; Fundo de Mulheres Luzia Dorothy do Espírito Santo e Fundo Puxirum – Fundo Extrativista da Amazônia Brasileira.
Os grupos mobilizaram a participação popular desde a Grande Marcha dos Povos da Amazônia, pela vida e pela Amazônia, quando centenas de pessoas vindas de delegações dos países da Pan-Amazônia, movimentos sociais, indígenas, camponeses, pescadores, ambientalistas, produtores agroecológicos, universitários, centrais indígenas de mulheres, e outros desfilaram pela ponte que liga as cidades de Rurrenabaque e San Buenaventura. Todos denunciando crimes ambientais e exigindo a defesa da Amazônia, com ações de enfrentamento aos impactos das mudanças climáticas, pela vida, defesa dos territórios indígenas, dos direitos da mulher e da natureza.
Atividades autogestionadas: mulheres e sustentabilidade
Integrantes do Fundos Dema e outros participaram do evento autogestionado ‘Mulheres Amazônicas: resistências, cuidado e sustentabilidade da vida’, promovido pelo Instituto de Desenvolvimento Rural da América do Sul (Bolívia), e também Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (CONAQ), Conselho Nacional das Populações Tradicionais (CNS), Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), Plataforma Mulheres, Amazônia e Paz (Colômbia), ONAMIAP (Peru) e Oxfam.
Segundo a educadora Vânia Carvalho, as mulheres amazônicas demonstram constantemente sua potência na abordagem das alternativas à crise climática e civilizatória que vivemos. “Nesse sentido, o evento propõe uma jornada das trajetórias de cuidado que transitam as mulheres, desde o âmbito pessoal, familiar até o âmbito público de suas comunidades e territórios”, avalia.
Na ocasião, foram debatidos problemas comuns nos vários países da América Latina e Pan-Amazônia, como o machismo, a violência contra as mulheres, o racismo e as estratégias na resistência em defesa dos territórios e na produção de alimentos e plantio de árvores. Destaque para a divulgação da Campanha ‘Onde tem mulher, tem floresta em pé’, do MIQCB, CONAQ e CNS, com apoio da Oxfam através do vídeo publicado no Youtube – https://www.youtube.com/watch?v=cOIbre5jdDA
As integrantes do Fundo de Mulheres Luzia Dorothy do Espírito Santo e Fundo Dema participaram também da atividade autogestionada ‘Mapeando para resistir às perigosas distrações/enganações climáticas’ – ‘As falsas soluções aprofundam a crise climática e ambiental’. Promovido pela Plataforma Latino Americana e Caribe pela Justiça Climática, a Campanha ‘Que Paguem! Os poluidores!
Foram debatidas as diversas tentativas de contratos de créditos de carbono por empresas, as lutas das comunidades afetadas e as em resistência pelas falsas soluções para a crise climática na América Latina e Caribe. Destaque para a apresentação do mapa das falsas soluções, disponível na internet que mantém informações para visibilizar, ampliar e ligar as lutas das comunidades afetadas pelas Falsas Soluções para a Crise Climática na América Latina e Caribe. https://www.mapafalsassoluciones.com/
A rede de Fundos Comunitários da Amazônia promoveu a atividade autogestionada: ‘Encontro de Fundos Comunitários da Amazônia – Mecanismos de financiamento de povos e comunidades tradicionais’, A Rede de Fundos foi criada para fortalecer as experiências autônomas de fundos comunitários. Os objetivos foram difundir as experiências dos fundos que compõem a rede; discutir sobre seus desafios, avanços e capacidade de intervir, de forma propositiva, junto aos doadores, referente à metodologia e acesso, liberação e execução dos recursos; analisar as possibilidades de intervir na gestão global do meio ambiente, em especial, nas instâncias deliberativas, como as Conferências das Partes (COPs) relacionadas às políticas ambientais, como a COP30, e trocar experiências e fortalecer a rede.
Nesta atividade, a rede de fundos comunitários da Amazônia foi apresentada pela mulher indígena do povo Baré, Josimara Melgueiro de Oliveira, do Fundo Indígena do Rio Negro, que destacou a importância dos fundos para a sustentabilidade da Amazônia.
“Há dois anos, no FOSPA em Belém, houve um primeiro encontro dos Fundos e os seus respectivos movimentos que se identificam como guardiães do planeta, constituiu-se a Rede de Fundos Comunitários da Amazônia. E foram dois anos de discussão e trocas de experiências, na busca de um futuro melhor, enfatizando a importância dos povos tradicionais para a sustentabilidade. Estamos numa corrida contra o tempo”, disse ela.
“A formação de mecanismos financeiros, como os fundos comunitários, são uma alternativa que vem favorecendo os povos tradicionais”, completa a educadora do Fundo Dema, Vânia Carvalho.
Na apresentação também foram tratadas pautas comuns entre os fundos, como: i) o financiamento climático deve priorizar o apoio direto aos povos da floresta por meio de nossas organizações e mecanismos financeiros; ii) governos, cooperação internacional e filantropia devem garantir o apoio aos fundos comunitários respeitando seus princípios e procedimentos; iii) Os procedimentos administrativos e financeiros dos doadores devem se adequar à realidade dos povos e comunidades em seus territórios; iv)O custo financeiro das organizações e seus mecanismos deve ser considerado um investimento, não uma despesa; v) os apoios às comunidades tradicionais devem acontecer independentemente da regularização de seus territórios.
Representantes de cada um dos fundos também se apresentaram focando na origem, os beneficiários, regiões de atuação, princípios e metodologia. “Nas apresentações, o caráter coletivo dos projetos apoiados a partir das demandas e necessidades das comunidades foi reforçado. A importância das comunidades camponesas, de agroextrativistas e dos Povos Indígenas para a manutenção das florestas e da cultura alimentar amazônica também foi debatido, garantindo o sucesso das iniciativas apoiadas pelos fundos”, relata Vânia.
FASE e Fundo Dema: Construindo Pontes para o Futuro
Em sua apresentação, a educadora mostrou que a atuação do Fundo Dema exemplifica o poder da colaboração e do ativismo comunitário na busca por justiça social e ambiental. “Com mais de 20 anos de história, o Fundo DEMA, sob a governança de um comitê gestor formado por lideranças locais (Baixo Amazonas, Transamazônica-Xingu, BR 163, Fundo de mulheres, fundo quilombola e articulação indígena), tem sido um pilar na promoção de projetos que beneficiam povos indígenas, agroextrativistas, camponeses e movimentos de mulheres. Atualmente, a maior participação nos projetos à frente das organizações é de mulheres”, lembrou a educadora durante a palestra.
João Gomes, coordenador adjunto da FASE Amazônia, destacou os desafios enfrentados pelos povos tradicionais devido ao avanço da grilagem de terras. “Na Amazônia, os povos tradicionais estão profundamente afetados pelo modelo de desenvolvimento. Há zonas de sacrifício pela exploração de petróleo, avanço da soja, agronegócio, etc. Muitas políticas de financiamento estão afetando a autonomia dos povos, contraditoriamente”, apontou ele.
Para aprofundar o debate, o Fundo DEMA convidou outros fundos para se conhecerem, tornando-se uma dos principais articuladores da rede. “Em mais de 20 anos de atuação, o Fundo DEMA lançou 25 editais e 8 chamadas públicas; apoiou mais de 700 projetos de povos e comunidades tradicionais e continua a apoiar iniciativas que promovem a sustentabilidade e a justiça social na Amazônia”, detalhou a educadora, Vânia Carvalho.
*Comunicadora e estagiário da FASE