23/01/2018 15:17

Élida Galvão¹

Vivendo em uma região ameaçada pelo agronegócio e pela exploração de minério, famílias indígenas da etnia Arapiun representam um dos grupos de resistência na Reserva Extrativista Tapajós Arapiuns, em Santarém, no Pará (PA). De forma a garantir a alimentação da comunidade, 29 famílias da aldeia Nova Vista passaram a desenvolver o ‘Sistema Produtivo Caipira Nova Vista’, voltado à recuperação de áreas degradadas com o plantio diversificado de espécies frutíferas e plantas nativas florestais, e ainda a criação de galinha caipira.

Construção de aviário. (Foto: Fundo Dema)

Atualmente com cerca de 70 residências, o território da Terra Indígena Nova Vista é composto por dezenas de árvores centenárias de diversas espécies, como ypê, andiroba, castanha do Pará, açaí, pequi, cajá, tucum, bacaba e patoá.

Na região, também era comum encontrar animais silvestres como tatu, porco do mato, cotia, caititu, anta e onças, porém, desde a queimada florestal ocorrida em 2015 por causa do superaquecimento atmosférico que afetou intensamente a região do Baixo Amazonas, a caça destes animais para a subsistência alimentar das famílias passou a ser escassa. No entanto, a partir da recuperação de 50 hectares de áreas degradadas, a iniciativa contribui não só para a transformação da cobertura vegetal, favorecendo as condições climáticas, o equilíbrio do meio ambiente, a preservação do bioma Amazônia, como também qualifica e garante a alimentação saudável à população local.

“Estamos vivendo um tempo meio complicado. Antes era muito fácil pegar um peixe, entrar no mato e pegar uma caça. Hoje está muito complicado. Nosso objetivo é trazer o alimento para a nossa comunidade, aumentar a nossa renda porque essa é uma área de difícil de emprego”, relata Kelwis Corrêa, presidente do Conselho Indígena Aldeia Nova Vista (Coinova), organização que representa os indígenas da comunidade.

Indígenas Arapiun na construção de aviário. (Foto: Fundo Dema)

Ameaças

Com limitações de acesso a políticas públicas, os indígenas Arapiun resistem às pressões dos grandes projetos, lutando cotidianamente contra a invasão de seu território, a retirada ilegal de madeira, a pecuária extensiva, o monocultivo e a mineração em sua área, por exemplo. Muitas vezes essas práticas são desenvolvidas com o consentimento do governo, degradando o meio ambiente e desterritorializando os povos e comunidades tradicionais. Essas atividades refletem direta e negativamente sobre o modo de vida das comunidades locais.

Há alguns anos o município de Santarém vem se tornando rota de escoamento de commodities por causa da chegada de multinacionais e consórcios de empresas que disputam espaço com a população para promover o desenvolvimento do capital globalizado, deixando destruição em larga escala aos povos da floresta e a usurpação dos bens comuns. As ameaças se tornam mais intensas devido a falta da demarcação do território. O encaminhamento para este processo encontra limites ainda dentro da própria comunidade, com conflitos internos sobre o reconhecimento indígena entre as famílias. Além disto, a carência do acesso à informação por meios de comunicação como rádio, internet, telefonia, por exemplo, também contribui para a desarticulação das populações da floresta, favorecendo os interesses das grandes corporações e do agronegócio com a negação do direito à terra indígena. “Precisamos principalmente de apoio em relação à formação. Precisamos muito de informação porque trabalhamos com agricultura”, ressalta Kelwis.

Resistência

Contrários às produções que destroem a natureza, os indígenas de Nova Vista vivem basicamente da produção agrícola familiar, com a produção de farinha, a criação de pequenos animais, a pesca e a coleta de frutos. A partir do desenvolvimento da iniciativa – executada por meio do Coinova com o apoio do Fundo Indígena do Xingu (FIX) e do Fundo Dema, em parceria com o Fundo Amazônia –, as famílias tiveram a oportunidade de construir o aviário para a criação de galinha caipira e o viveiro para criação de mudas. Por meio da parceria com o Centro de Apoio a Projetos de Ação Comunitária (Ceapac), eles participaram de oficinas para a aprender o processo de criação de aves e a produzir ração alternativa para a alimentação destes animais. 

Além de garantir a segurança alimentar das famílias, as ações do grupo visam proporcionar qualidade a alimentação das crianças na escola que fica na aldeia, a partir da inserção ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). Dando início ao alcance desta meta, as famílias já construíram o viveiro de mudas e agora estão aguardando o período de chuva para dar início à plantação, o que facilita a irrigação.

[1] Jornalista do Fundo Dema, do qual a FASE é parte. Matéria publicada originalmente aqui