10/06/2005 14:44

Glória Regina A.C. Amaral e Fausto Oliveira

A situação da monocultura do eucalipto em cada estado onde ela é praticada foi um tema forte nas apresentações feitas ao encontro da Rede Alerta contra o Deserto Verde. Representantes da Bahia, Minas Gerais, Pará, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e do próprio Espírito Santo trouxeram a público suas denúncias. Em comum, todos os relatos têm a agressividade das empresas de celulose na conquista de terras (por meios lícitos e ilícitos), as perdas ambientais e a desagregação de núcleos populacionais cada vez em maior escala. Leia sobre a realidade em cada um destes estados brasileiros.

Bahia – Em quinze anos, de 1970 a 1985, a Bahia perdeu 70% de suas matas nativas com a chegada das empresas de papel e celulose Bahia Sul e da Veracel. O dado foi trazido por Melquíades Spinola, do CEPEDES, Centro de Estudos e Pesquisas para o Desenvolvimento do Extremo Sul da Bahia. De acordo com estudos recentes do Ministério do Meio Ambiente, o extremo sul da Bahia tem apenas 4% da Mata Atlântica original, em áreas de reserva. Nesta região, estima-se que mais da metade das terras agricultáveis estejam nas mãos das empresas . Lá, há cerca de 12 mil famílias acampadas nas estradas. A expulsão dos quilombolas, pequenos agricultores e índios do campo gerou um crescimento significativo das favelas e a desagregação de grupos e famílias. O CEPEDES denunciou que a intenção da Bahia Sul e da Veracel é triplicar sua produção, o que certamente trará maiores impactos e não se reverterá em benefícios para o Brasil, já que esta produção é quase toda destinada a alimentar o mercado europeu de papel higiênico. Diante de uma postura do governo federal favorável ao eucalipto (o BNDES já emprestou R$ 1 bilhão para estas empresas), os movimentos baianos exigem que, para cada nova autorização de monocultura, se faça pelo menos um zoneamento ecológico da área.

Minas Gerais – Em Minas Gerais, um representante do Sindicato de Trabalhadores Rurais testemunhou que as comunidades que não venderam suas terras para as empresas de celulose ficaram “ilhadas” no eucaliptal. Elas já não têm do que sobreviver e por isso começam a invadir os eucaliptais para pegarem madeira e assim produzir carvão. Há uma mobilização em curso, as comunidades começam a se organizar para reagir à devastação da Mata Atlântica e à desagregação de suas comunidades e famílias e à precarização da qualidade de vida dessas famílias.

Rio de Janeiro – O representante do Rio de Janeiro, Carlos Augusto, do MST, afirmou que a preocupação em seu Estado é prevenir a expansão do eucalipto. No RJ, uma importante vitória foi conquistada: uma lei municipal da cidade de Campos impede a plantação de eucalipto. Entretanto, outros municípios já sofrem o assédio das empresas de papel (uma delas é exatamente a Aracruz). Uma rede de advogados assessora os movimentos sociais do nororeste fluminense para resistir à entrada do modelo de monocultura do eucalipto.

Rio Grande do Sul – Neste estado, a Rede Alerta começa a se estruturar. Edson, do MST do Rio Grande do Sul, afirmou que há hoje 150 mil hectares de eucalipto no Rio Grande do Sul. Só em 2004, foram plantados 11 mil hectares e os planos das empresas Votorantim e Aracruz para o ano que vem são de ocupar mais 100 mil hectares. Para isso, estão construindo um viveiro para 10 milhões de mudas. As empresas estão tentando convencer pequenos e médios produtores a substituir a criação de gado pela plantação de eucalipto, principalmente no sul do Estado. Como forma de influenciá-los, produzem eventos de entretenimento com sorteios de bens para as famílias camponesas. É quando eles também exibem vídeos e proferem palestras nas quais afirmam que o Brasil precisa de 11 milhões de hectares de eucalipto (hoje temos 5 milhões). Entidades do movimento popular (ONGs, Via Campesina e MST) tentam mostrar ao pequeno produtor que o eucalipto não é um bom negócio. Segundo eles, 3 litros de leite rendem o mesmo que um hectare de eucalipto. Até agora eles conseguiram sensibilizar apenas 50 famílias da região. Nas escolas e universidades há também uma ação coordenada das empresas falando das “vantagens” do sistema florestal com distribuição de material didático apresentando a empresa como defensora do meio ambiente.

Pará – Segundo Luiz Bressan, da FASE Pará, a Amazônia está cortada estrategicamente por grandes projetos voltados para a exportação que interligam o Brasil e outros países, como construção de grandes barragens , pólos siderúrgicos, expansão das madereiras e da soja. Lá também há um movimento para envolver os pequenos produtores no desmatamento e plantio de eucalipto para produção de carvão, que servirá à indústria siderúrgica. O preço do carvão aumentou por causa do preço do ferro no mercado internacional. O governo aponta possibilidade de crédito para agronegócio, o que consolida a estratégia das empresas. É claro que, com os olhos do mundo voltados para a Amazônia depois do índice de mais de 25 mil quilômetros quadrados, deverá ficar mais difícil para as empresas continuarem nesse projeto de devastação e exploração da Amazônia pois a Organização Mundial do Comércio poderá retaliar o governo brasileiro se medidas sérias não forem tomadas. Por enquanto, o projeto devastador continua: a Vale do Rio Doce acaba de comprar terras para plantar eucalipto e produzir celulose e carvão vegetal no Maranhão.

Espírito Santo – No Espírito Santo, a luta contra a monocultura começou desde 1998 como uma reação à Assembléia Legislativa que queria aprovar um projeto que permitia a expansão do eucalipto sem nenhum controle. A Aracruz nunca pagou pela água que usa em suas duas fábricas, que consomem juntas o equivalente ao que consumiria uma cidade de 2 milhões de habitantes. As comunidades de Vila do Riacho, cercadas pelo eucalipto, não têm mais carvão para cozinhar e nem água para sua sobrevivência. Hoje, o apoio à luta pela demarcação da terra indígena é fundamental, porque apesar de pouco, os 11.009 hectares de terras que os índios Tupinikim e Guarani demarcaram, ajudam também na luta pela retomada das terras quilombolas. Além disso, a Rede no Espírito Santo precisa se voltar também para o combate aos grandes projetos de siderurgia e extração de minério e exportação de pedras brutas. A propaganda massifica a idéia de que desenvolvimento é a mesma coisa que exportação. Para Marcelo Calazans, da FASE Espírito Santo, “a reforma agrária barra a expansão do fomento florestal e por isso o MST é um parceiro fundamental na luta da Rede Alerta contra o Deserto Verde”. Hoje é muito importante o desenvolvimento de tecnologias de reconversão dos eucaliptos para a Mata Atlântica.