08/09/2017 10:18

Rosilene Miliotti¹

No vídeo “Nem Um Poço A Mais”, pescadores e pescadoras, marisqueiros e marisqueiras, comunidades quilombolas, indígenas e urbanas do Espírito Santo (ES) relatam as violações de direitos e a contaminação de seus territórios cometidas pelas indústrias do petróleo e gás da região. Eles e elas ainda alertam para a degradação da terra e da subsistência. O curta foi produzido pelo programa da FASE no estado em parceria com a União Europeia² e com a Fundação Rosa Luxemburgo.

Joana Barros, do Grupo Nacional de Assessoria (GNA) da FASE, explica que a ideia do vídeo surgiu a partir da coleta de depoimentos da população impactada diretamente pela extração do petróleo em terra e no mar. “Essa produção é uma cartografia dessa região”. A assessora ressalta que o objetivo da Campanha é barrar a expansão da exploração petroleira e reverter os impactos. “O vídeo é uma ferramenta para a organização desses grupos e reconhecimento dos impactos”, explica.

Para Flavia Bernardes, educadora do programa da FASE no Espírito Santo, o foco do filme não é apenas as denúncias em relação a violência que o complexo petroleiro impõe ao se estabelecer nessas regiões, mas também as consequências da ‘petrodependência’ da sociedade dentro do seu território. “O filme nos dá a dimensão do quanto estamos usando o petróleo de forma indiscriminada e irresponsável. Além disso, nos mostra um fato incontestável: não há compensação para a destruição! É preciso frear a expansão de petróleo e para isso é fundamental que se respeite o direito de toda e qualquer comunidade de decidir o seu futuro”, alerta.

Encontro da Campanha em São Mateus, norte do ES. (Foto: Rosilene Miliotti / FASE)

De acordo com o diretor do filme, Ricardo Sá, esse é um trabalho importante para alertar as comunidades que ainda estão deslumbradas com a exploração de petróleo sobre o que de fato é este projeto. “Por trás de um discurso de que vai gerar empregos e desenvolvimento, o que de fato o petróleo faz é aniquilar as culturas existentes e deixar rastros de destruição ambiental e social”, denuncia. 

Para Joana, a Campanha é uma forma de estímulo para que essas pessoas se reconheçam e percebam que os problemas não são apenas seus. Além disso, visa fortalecer os grupos que antes lutavam sozinhos, visibilizar os impactos e animar as lutas. “Não é só contra a instalação das refinarias, mas todo o modo de vida petroleiro. A cidade feita para os carros, o uso cada vez maior de agrotóxicos, a estimulação de consumo de ansiolíticos, por exemplo, para sobrevivermos nessa dinâmica acelerada que esse modo de desenvolvimento nos coloca, entre outros”, analisa.

Em nome do desenvolvimento

Desde a descoberta do Pré-sal, estas populações são ameaçadas por profundas violações e pela contaminação dos seus territórios em nome do desenvolvimento. A indústria de petróleo e gás privatiza áreas tradicionais e comuns, violentando a soberania destes povos e desrespeitando direitos fundamentais para a vida da atual e das futuras gerações.

Cavalinho de petróleo. (Foto: Flavia Bernardes / FASE ES)

Ana Paula dos Reis Santos, pescadora do município de Marataízes e uma das entrevistadas do vídeo, conta que a área onde se pega camarão e o goiamum, por exemplo, vai acabar. “Eles falam que o goiamum está em extinção. Mas não está. Eles dizem isso para virem e taparem onde a gente pega”, denuncia. Ana Paula se refere à região onde será construído o Itaoca Offshore, no em Itapemirim, no sul do Espírito Santo, entre as praias de Marobá e das Neves.  São 660 mil metros quadrados de construção, o equivalente a 80 campos de futebol, sobre um local totalmente natural e preservado. Em março de 2017, o governo federal concedeu a licença de construção e de operação do Porto Central. A obra vai criar um canal artificial de quase quatro quilômetros para receber navios de até 25 metros de profundidade.

Outro caso denunciado no vídeo é a construção do estaleiro Jurong. Em 2013, no município de Aracruz, foi autorizada a instalação da empresa, mesmo com diversos estudos socioambientais a negando. “A Jurong fez um monte de promessa. Prometeu que daria emprego para meus filhos, netos e bisnetos, e até agora eu não vi nenhum emprego. Tomaram a nossa área de pesca, que era o mais importante que nós tínhamos. Dava muito peixe, lagosta, marisco. Tomaram tudo com promessas e até hoje não temos retorno de nada”, conta Arlindo Gonçalves, pescador de Barra do Sahy.

[1] Jornalista da FASE.

[2]  O conteúdo deste artigo é de nossa responsabilidade exclusiva, não podendo, em caso algum, considerar que reflita a posição da UE.