22/09/2014 17:11
Vilmon Alves Ferreira*
O Mato Grosso é o estado agrícola do Brasil. Porém, isso não quer dizer que suas terras estejam ocupadas somente para a produção de alimentos voltada à mesa da população. Estão também sendo exploradas para a produção de agroenergias. Os agrocombustíveis biodiesel e o etanol são produzidos por meio das monoculturas de soja e cana-de-açúcar. E o que isso coloca em risco?
O estado inclui importantes biomas brasileiros: o Cerrado, o Pantanal e a Amazônia. É também considerado a caixa d’água do Brasil, já que abriga três bacias hidrográficas. Além disso, é riquíssimo em bens naturais: água, minério, flora e fauna. Considerando estes aspectos, o Mato Grosso cumpre uma importante função para o equilíbrio na transição de ecossistemas estratégicos para a preservação da sociobiodiversidade de todo o país. Mas este cenário está gravemente ameaçado pela ação desordenada do agronegócio.
O modelo de produção com base no monocultivo e no uso intensivo de agrotóxicos está causando desastres socioambientais, acabando com as florestas e afetando diretamente a vida da população. As fronteiras agrícolas para o agronegócio parecem não ter limites no Mato Grosso. Nestes últimos anos estão adentrando e invadindo os territórios e inviabilizando a produção e o abastecimento de alimentos para a população de diversas regiões mato-grossenses. A cada ano esta disputa se torna mais desigual entre a agricultura familiar e o agronegócio.
Acreditamos que uma das prioridades no estado e em todo o país deveria ser a Reforma Agrária. No Mato Grosso, a agricultura familiar ocupa apenas 10% da área agrícola, mesmo assim é responsável por 60% do emprego no campo e contribui expressivamente com a produção agropecuária do estado. Só não tem uma expressão maior por conta da imensa desigualdade na distribuição da terra.
Povos indígenas e comunidades tradicionais também vêm sofrendo ameaças aos seus territórios e a produção de monocultivos tem tudo a ver com essa situação. O mais grave é que para impulsionar os empreendimentos agrícolas e fortalecer ainda mais o agronegócio no estado, o governo federal tem previsto investimentos em infraestruturas para a construção de hidrovias, ferrovias, e mais estradas para viabilizar o transporte da produção destas monoculturas, além da instalação de dezenas de hidrelétricas. Este futuro significa a continuidade deste processo de dizimação socioambiental no Mato Grosso. Estamos falando do empobrecimento e da contaminação de solos e águas, de mudanças climáticas, de riscos de desertificação, da perda das paisagens e outros impactos negativos.
Mas como essas perversidades estão sendo enfrentadas? A sociedade civil do Mato Grosso tem se unido, debatido e contestado este modelo de produção impactante em espaços como o Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad), do qual fazem parte 33 entidades, inclusive a FASE. Trata-se de um espaço de construção de articulações para denunciar injustiças e também disputar políticas públicas ao lado de povos indígenas, comunidades tradicionais e da agricultura familiar, mesmo que a correlação de forças sendo muito desigual a estes segmentos da sociedade.
Inclusive, o Formad e o Fórum de Direitos Humanos e da Terra (FDHT) lançaram recentemente a “Agenda Mato Grosso democrático e sustentável: eleições 2014”. Entre outros pontos, o documento defende: a implementação de uma Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER) de forma adequada, garantindo a ênfase em práticas da agroecologia, que respeita a natureza e os conhecimentos das populações tradicionais; a proibição de pulverizações aéreas de agrotóxicos nas lavouras agrícolas do Mato Grosso; a implantação de um Sistema de Monitoramento de Resíduos de agrotóxicos em água potável, no ar, na chuva, nos bancos de leite materno e nos alimentos; e a implantação de um Centro de Atendimento e Laboratório Estadual de Toxicologia para a saúde dos trabalhadores, poluições ambientais e populações expostas aos agrotóxicos.
É urgente a revisão do modelo de produção de monocultivos, especialmente para produção de agroenergias. Da forma como são produzidas, não podem ser chamadas de energias limpas, renováveis, verdes ou alternativas. Está claro que elas também destroem o meio ambiente e a produção de alimentos, com enormes prejuízos sociais. Nessa questão, acreditamos ser central o debate sobre como são produzidos, com quais objetivos e a que modelo de desenvolvimento os agrocombustíveis têm atendido.
*Técnico em Educação Ambiental da FASE Mato Grosso.