13/08/2018 12:08
Em julho, uma audiência pública jogou luz ao abandono da reforma agrária e as pressões impostas pela mineradora Alcoa ao Projeto de Assentamento Agroextrativista (PAE) Lago Grande, em Santarém e Juruti, no oeste do Pará. O Lago Grande é um dos maiores assentamentos do Brasil e fica em uma região rica em sociobiodiversidade entre os rios Tapajós e Amazonas.
Audiência expõe abandono da reforma agrária e pressões da mineradora Alcoa em assentamento
Cerca de 500 representantes das 140 comunidades que integram o PAE participaram da audiência pública convocada pelo Ministério Público Federal (MPF). A audiência deu espaço para que os comunitários relatassem as crescentes pressões de grileiros, madeireiros, sojeiros, indústrias pesqueiras e da multinacional Alcoa, que extrai bauxita em áreas vizinhas à região.
O conflito entre as comunidades do Lago Grande e a Alcoa não é novo. Em 2008, a transnacional chegou a realizar pesquisas dentro do Lago Grande. Comunidades se reuniram para impedir a entrada dos pesquisadores ligados à Alcoa e acabaram processados na Justiça Federal. O pedido da empresa era para receber autorização para ingressar e dar continuidade às atividades de prospecção nas comunidades onde ela tinha interesses minerários. A ação tinha como réus o Incra, a Feagle e vários moradores do assentamento.
A Justiça Federal chegou a conceder liminar em favor da Alcoa, mas em sentença publicada em abril, ficou constatado que as licenças que a transnacional dizia ter para a pesquisa na região estavam vencidas. A sentença detectou também violações do Código de Mineração que prevê que, para pesquisa e lavra, a mineradora precisa entrar em acordo com os moradores das áreas em que pretende trabalhar e, a partir das indenizações pagas, apresentar o chamado Laudo de Servidão, em que se reconhece a área como de servidão mineral. A Alcoa não tentou a negociação com os moradores e não apresentou o laudo de servidão. Por esse motivo a sentença extinguiu a ação da transnacional, sem resolução do mérito.
Recomendações do MPF
MPF recomenda que a Alcoa se retire do assentamento Lago Grande, em Santarém (PA)
Após a audiência, representantes do MPF novamente visitaram as comunidades e receberam mais denúncias contra a mineradora por assediar as comunidades distribuindo propagandas de suas ações sociais no município vizinho e oferecendo, por meio de uma Fundação, dinheiro para projetos nas escolas. As ofertas são feitas sem respeito à organização política das comunidades para moradores que não fazem parte das associações representativas locais. Para o MPF, as visitas e ofertas da empresa na região são irregulares e violam normas ambientais, minerárias e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que protege o direito de comunidades tradicionais.
Regulamento das comunidades do PAE
Após anos de elaboração, as comunidades do Lago Grande aprovaram o Plano de Utilização com o principal regulamento do PAE. No documento estão descritas as regras de uso dos recursos naturais, bem como os direitos e deveres de todos os moradores e moradoras que nele trabalham e vivem, fundamentadas em quatro diretrizes. Dentre elas, ser um guia para os moradores e moradoras utilizarem o extrativismo, a agricultura, a caça, a pesca e a agropecuária de forma sustentável e promover melhores condições de vida aos mesmos.
A diretriz que diz respeito às atividades de intervenção no subsolo deixam claro que: Toda e qualquer atividade relacionada à mineração, ao agronegócio, à construção de hidrelétricas, a portos graneleiros e madeireiros, que cause danos à qualidade de vida das famílias e inviabilize a garantia de seus direitos no PAE Lago Grande, é proibida e deve ser submetida ao direito de consulta prévia e informada, de acordo com a Convenção 169. Sendo necessária a realização de audiências públicas para debater sobre os impactos sociais, ambientais e culturais das atividades planejadas sobre o território.
O documento deixa claro ainda que “é proibida a exploração comercial de pedras, seixos e areia dentro do PAE Lago Grande. Eventualmente a exploração será permitida para que estes materiais sejam utilizados em obras que beneficiam a comunidade.