16/10/2017 14:05

Rosilene Miliotti¹

A partir do aumento da quantidade e da diversidade de produção de associações e cooperativas de agricultores familiares nas regiões em que o programa da FASE na Bahia atua, os educadores perceberam a necessidade de encontrar novas alternativas de comercialização e de superação de dificuldades vivenciadas com as tradicionais vias de escoamento da produção. E para pensar nessas novas formas, agricultores e agricultoras familiares, associações comunitárias, grupos de mulheres, cooperativas, gestores municipais e organizações parceiras estiveram presentes nas duas etapas do Seminário Territorial “Estratégias de Comercialização”, realizados em setembro, nos municípios de Mutuípe e Presidente Tancredo Neves.

Atividade durante o seminário. Foto: FASE / BA

De acordo com Rosélia Melo, educadora do programa da FASE na Bahia, o debate sobre alternativas de comercialização é um dos pilares estratégicos da intervenção educativa da organização e tem foco na evolução das diferentes experiências de ampliação e diversificação da produção das famílias agricultoras, na identificação das características, potencialidades e ameaças inerentes aos diferentes espaços de comercialização que vem sendo historicamente acessados pelos agricultores familiares dos oito municípios em que atua. “Nosso trabalho é estimular as famílias agricultoras a experimentar práticas agroecológicas que favoreceram a diversificação e ampliação de sua produção, buscando recursos que permitem agregar valor aos seus produtos”, conta.

No encontro, que contou com o apoio da União Europeia², o debate aconteceu a partir de quatro experiências que retratam alternativas de comercialização tanto no Baixo Sul, como no Vale do Jiquiriçá. Foram apresentados casos concretos de comercialização na comunidade; de comercialização em eventos, feiras e mercados locais; de comercialização em mercados institucionais; e de cooperativismo na agricultura familiar. Segundo Paulo Demeter, coordenador do programa da FASE no estado, o objetivo é incentivar os que estão utilizando algumas das alternativas de comercialização a sistematizar sua trajetória e relatar o caminho percorrido para os demais participantes dos seminários.

Durante o debate, foi possível registrar como pontos importantes o reconhecimento que nenhuma dessas estratégias sozinha, pode resolver os problemas enfrentados pela agricultura familiar para melhorar as condições de comercialização da produção e de obtenção de preços justos. Diversos depoimentos apontaram para a necessidade de sempre buscar inserção em diferentes canais de comercialização, aproveitando aquele que oferecer melhores condições em cada período específico.

Estação sobre Cooperativismo na Agricultura Familiar. Atividade durante seminário. Foto: FASE / BA

Antonia Queiroz, da comunidade Gervásio, no município de Valença, participou do seminário em Presidente Tancredo Neves. Ela comercializa seus produtos junto a outras mulheres da comunidade na feira da Economia Solidária da região. “A feira acontece todas as sextas e reúne muitos grupos de mulheres. Além disso, colocamos produtos para vender na Loja da Economia Solidária que funciona no centro de Valença, assim aumentamos nossos rendimentos e ajudamos nossas famílias”, explica a agricultora que faz parte da Cooperativa de Mulheres da Agricultura Familiar e Economia Solidária de Valença (Coomafes) e do Grupo Mulheres Criativas³.

A relação entre consumidor e agricultor

A persistência também foi mencionada entre as experiências de comercialização em feiras municipais, porque nem sempre a demanda por produtos se mantém ou os preços praticados são estáveis e favoráveis aos agricultores familiares que comparecem às feiras. Entretanto, os participantes esclareceram que a “criação do costume e a regularidade em estar na feira, ajudam a criar uma relação de confiança entre os agricultores e os consumidores”.

Já os que comercializam na comunidade, destacaram os esforços feitos para diversificar sua produção. Rosélia conta que os agricultores relataram exemplos de diminuição na aquisição de produtos alimentícios provenientes de outras regiões, na maioria processados ou industrializados, e que são substituídos por alimentos produzidos localmente e que antes não eram tão valorizados ou reconhecidos como importantes pelas próprias famílias agricultoras.

Depoimentos sobre a importância da existência da Coopeípe e de como esta experiência de cooperativismo pode fortalecer a agricultura familiar na região também surgiram. “Dificuldades como o imediatismo dos que apenas analisam os preços alcançados quando vendem seus produtos e que ainda não conseguem perceber que os processos de associação e de cooperação são os únicos capazes de permitir aos agricultores familiares acessem novos mercados, também foram identificados”, comenta a educadora.

PNAE avança, mas continua longe do ideal

Plenária durante seminário em Presidente Tancredo Neves. Foto: FASE / BA

Outro aspecto destacado foi a necessidade de perseverança na construção de alternativas. “Isto ficou muito evidente no caso da comercialização nos mercados institucionais, pois foram necessários vários anos de luta e pressão para conquistar a realização de Chamadas Públicas do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), haja visto a enorme resistência e má vontade de prefeituras em cumprir a legislação, que é de 2009”, critica Deméter.

Sobre o PNAE, alguns gestores municipais relataram que para as prefeituras a operacionalização do programa tem sido uma novidade e que as repercussões e resultados alcançados são bons, mas que precisam melhorar. Entretanto, falta muito para que o conjunto de municípios do Baixo Sul e do Vale do Jiquiriçá alcance ou ultrapasse o limite mínimo de 30% de aquisições diretas da agricultura familiar para a merenda escolar.

“Buscar o profissionalismo e a participação coletiva na gestão da Coopeípe, empenho na implementação de iniciativas de diversificação e ampliação da produção e atenção a qualificação das associações comunitárias e dos grupos de mulheres, serão consideradas nos planejamentos e avaliações futuras da FASE”, conclui Demeter.

[1] Jornalista da FASE com apoio dos educadores do programa da FASE na Bahia.

[2] O conteúdo deste artigo é de responsabilidade exclusiva da FASE, não podendo, em caso algum, considerar que reflita a posição da União Europeia.

 

[3] O Grupo também coloca seus produtos à venda em barracas situadas na estrada BR-101, perto da comunidade Gervásio.