15/03/2017 15:07
Élida Galvão¹
“Nós voltamos somente com os isopores e as caixas. Tudo o que a gente levou, a gente conseguiu vender”, disse Lindalva Castro, moradora do município de Belterra, município do Oeste paraense. Assim com ela, outras agricultoras e agroextrativistas da região do Baixo Amazonas comemoraram o sucesso das vendas dos alimentos que produzem na Feira da Agricultura Familiar, que aconteceu no pátio da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) no último dia 9 de março.
Realizada semanalmente às quintas-feiras, a feira contou com programação especial por conta do Dia Internacional da Mulher. Depois de terem participado do ato que tomou conta das ruas do centro de Santarém no dia anterior, cerca de 30 mulheres vindas de Mojuí dos Campos, Belterra e da própria capital, integrantes da Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Santarém e da Associação de Mulheres do Município de Belterra (Amabela), compartilharam o resultado das suas produções. Hortaliças, verduras, frutas, galinha caipira, ovos, doces, biscoitos, bolos, artesanatos, plantas medicinais e ornamentais. Tudo isso foi adquirido pelo público que ali passava, em sua grande maioria da própria academia, e que ainda tinha a oportunidade de levar um avental e uma sacola de compras personalizados em apoio à agroecologia como brinde.
Além de incentivar e divulgar o protagonismo e a articulação das mulheres, a ação, promovida pela parceria entre a Ufopa e o programa da FASE na Amazônia, possibilitou um momento de reflexão sobre o papel da mulher do campo e da floresta na promoção da agroecologia e na garantia da segurança alimentar e nutricional. A ameaça aos seus territórios, a valorização dos bens comuns, de seus modos de vida, bem como o enfrentamento ao patriarcado e a todas as formas de violência, também foram assuntos pautados pelas mulheres.
Com depoimento espontâneos, algumas relataram as opressões sofridas dentro e fora de casa. “Uma colega nossa comentou que o marido dela dizia: ‘tu ficas assistindo palestra, mas isso não te sustenta. Quem te sustenta sou eu’. E pra ela sempre foi muito difícil participar das atividades porque o marido ficava implicando com ela”, disse Lindalva.
Tendo acompanhado o trabalho desenvolvido por estas mulheres, Sara Pereira, educadora da FASE na Amazônia, considera que “além de celebrar o Dia Internacional da Mulher, a ação foi uma oportunidade de mostrar o quanto o trabalho delas é importante para a economia local”. Para ela, a conquista da autonomia incentiva o empoderamento e a independência não somente financeira, mas também emocional e psicológica. “Hoje a mulher é vista somente como contribuinte da renda familiar, mas ela pode ter autonomia neste sentido”, pontua.
Troca de conhecimentos
Outro destaque da feira foi a participação de estudantes do curso de agronomia da Ufopa. Junto às mulheres, integrantes da academia mostraram como se faz o reaproveitamento de resíduos orgânicos enquanto alternativa nutricional e também de diminuição do impacto ambiental ocasionado pela grande produção de lixo. Entre tantas possibilidades de reinvenção, as mulheres trocaram experiências e aprenderam a fazer diversas receitas, como: semente abóbora torrada, chips da casca de abóbora, farofa com casca de abóbora torrada, pão e pudim de abóbora, doce da casca de abacaxi, pão caseiro da farinha de batata doce, farinha de manga, bolo de casca de banana e licores a partir do beneficiamento de frutas.
Selma Ferreira, uma das agricultoras ali presentes e integrante da Associação de Belterra – criada em 2015 por meio do apoio do Fundo Luzia Dorothy do Espírito Santo, ligado ao Fundo Dema – recitou um poema de própria autoria, arrancando aplausos de suas companheiras. Ela falou sobre a importância da atividade na conquista de autonomia. “No 8 de março, juntamos nossas forças e formos para a rua reivindicar nossos direitos e lutar contra a PEC da Reforma da Previdência, porque não é justo que nós trabalhadoras rurais, que colocamos alimentação nas mesas, tenhamos que nos aposentar com 65 anos, quando a gente já não consegue mais trabalhar”, desabafou a trabalhadora.
“Na sequência deste dia nós fomos para a feira, onde expusemos produtos de qualidade, saudáveis. Essa feira é muito importante pra gerar autonomia pra nós, para fazer as mulheres saírem de casa, mostrar que são capazes”, completou Selma.
Agricultura familiar na universidade pública
Resultado do Projeto de Extensão ‘Incubadora de Empreendimentos Solidários’, ligado à Pró-Reitoria da Cultura, Comunidade e Extensão (Procede), a Feira da Agricultura Familiar da Ufopa tem como objetivo destacar a participação das mulheres na produção agrícola e extrativista in natura e beneficiada da região metropolitana de Santarém, envolvendo os municípios de Belterra e Mojuí dos Campos.
“No início a feira acontecia sempre na primeira quinta-feira do mês, mas como ela foi bem aceita pela comunidade, agora acontece semanalmente”, explicou a professora Elen Pessôa, vice-coordenadora do projeto da incubadora. De acordo com ela, a atividade só tende a crescer, ainda mais agora que foi estabelecida uma parceria com outro projeto da área tecnológica. “Está sendo construído um aplicativo para a comercialização direta com as produtoras e que irá beneficiá-las ainda mais”, disse.
[1] Edição de texto da jornalista do Fundo Dema, do qual a FASE faz parte.